Relacionamento: por que tantas mulheres repetem o que criticavam nas mães?
A primeira experiência de afeto que vivenciamos, para o bem ou para o mal, é com a mãe. E é com ela, também, e a maneira com que se relaciona com o marido/pai que aprendemos nosso primeiro modelo de amor. A partir dessa observação é que toda mulher constrói, ainda na infância, os parâmetros que vão definir suas relações na vida adulta.
Nem sempre essa observação tem resultados positivos. No entanto, mesmo rejeitando certas atitudes e escolhas maternas, muitas mulheres acabam justamente reproduzindo-as em seus relacionamentos. O mecanismo por trás disso é complexo e, em diversos casos, ocorre de forma inconsciente. "A mãe é o primeiro modelo de mulher que temos, e nos ensina, pela experiência, como uma mulher deve ser tratada por um homem, como reagir nos relacionamentos, como se sentir na convivência a dois e consigo mesma. Assimilamos esses ensinamentos sem nos dar conta", diz Luiza Colmán, psicóloga especialista em temáticas ligadas ao amor e que atua em Goiânia (GO).
De acordo com Luiza, uma mãe machista pode ensinar à filha que a submissão faz parte do comportamento feminino. E, ainda, que é preciso agradar o marido para que ele não encontre outra mulher e que é normal os homens traírem ou serem mais agressivos. "Ela pode ensinar isso de maneira direta, falando isso para a filha, ou de modo indireto, a partir do exemplo. Quando adulta, se essa criança assimila esse comportamento como verdade, terá mais dificuldade em se posicionar diante de uma figura masculina", avisa.
Para Silvia Malamud, psicóloga clínica especializada em terapia de casais e família, de São Paulo (SP), muitas mães, principalmente as com tendência mais narcisistas, não suportam ver o tempo passar e têm enorme dificuldade de passar o bastão da continuidade feminina para as suas próprias filhas, dificultando bastante o desenvolvimento saudável dos relacionamentos afetivos delas. "E assim também podem influenciar bastante as escolhas amorosas delas, mesmo que de maneira inconsciente, quando cultivam o desejo de que elas se casem com os tais príncipes encantados que só existem no mundo da ficção", afirma.
Copiar a mãe não é regra
A baixa autoestima materna também pode ser uma espécie de "herança" ruim, levando as filhas a aceitarem qualquer coisa para não ficarem sozinhas --inclusive relacionamentos abusivos. Por outro lado, há aquelas que, inconformadas com a apatia da mãe, decidem seguir justamente o caminho contrário e investir no desenvolvimento da própria autoconfiança.
"É importante ressaltar que nem toda pessoa que tem uma mãe submissa, machista ou que vive em relacionamento abusivo repete necessariamente esse padrão. Isso é comum, mas não é uma regra. Algumas crianças, em vez de se identificarem com o padrão da mãe e reproduzi-lo, podem se identificar na oposição e assumir uma postura de vida complemente oposta. O problema da oposição é que, dependendo da sua intensidade, também provoca atritos nos relacionamentos. E aí essas mulheres muitas vezes ficam sozinhas por medo consciente ou inconsciente do amor", ressalta Luiza.
Dá para romper o padrão?
Dá, sim, mas não é um processo fácil. Segundo Luiza, saber da repetição, embora seja importante para a mudança, nem sempre é suficiente porque muitas vezes é uma consciência meramente racional. "Para que haja mudança é necessário muito investimento de energia emocional para conseguir sustentar um novo comportamento e um novo padrão. Portanto, é necessário uma mudança além do racional, de postura emocional, e isso dá muito mais trabalho de ser construído", diz.
Já Silvia reforça que quando as mulheres ficam mais conscientes e percebem que reproduzem --na vida a dois, com os filhos e em outras áreas de relacionamento-- as atitudes que criticavam nas mães e ainda assim não conseguem deixar de repeti-las, é porque estão altamente condicionadas nesses padrões. "Elas as perpetuam porque de um modo inconsciente mantêm uma espécie de lealdade emocional de vínculo histórico do feminino familiar", explica. Deixar de aplicar, no dia a dia, tudo o que a mãe "ensinou", mesmo que isso faça mal, configura uma espécie de traição.
É possível refazer esse padrão e reconstruir a forma de amar, de entender e de receber o amor. "No entanto, trata-se de um processo que costuma levar um tempo e quase sempre necessita do auxílio de um processo psicoterapêutico. Essa mudança envolve fortalecer a autoestima, quebrar crenças distorcidas a respeito do amor, do relacionamento e de si mesma e enfrentar o medo e as dores infantis", conta Luiza.
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