Beth Carvalho fez revolução no samba e festejou a voz da mulher no gênero
"Não era comum. Poucas mulheres tinham meu posicionamento. Eu era uma pessoa independente, que criou, desde cedo, o próprio caminho. E isso incomodava. Eu era ousada desde pequena", contou Beth Carvalho uma vez ao "UOL".
Nesta terça-feira (30), demos adeus à cantora, 72, após uma infecção generalizada no hospital em que estava internada, em Botafogo, no Rio de Janeiro, em que estava "cercada do amor de seus familiares e amigos", como comunicou Afonso Carvalho, empresário da artista.
Madrinha do Samba, como ficou nacionalmente conhecida, a cantora foi uma das primeiras vozes femininas a ganhar destaque na indústria musical do gênero -- que teve o caminho aberto por Dona Ivone Lara, em meados dos anos 50.
Junto com Clara Nunes e Alcione, Beth foi uma das primeiras mulheres a vender discos com a mesma proporção que homens faziam na época, rompendo com tabus da época.
"O Brasil é machista, né? Não é só a música, mas está melhorando muito. Dona Ivone Lara se tornou a primeira mulher a fazer samba-enredo numa escola. Antes não tinha nenhuma possibilidade de mulher fazer. E, mesmo assim, ela fez sem aparecer, só depois que o nome dela foi destacado. Da minha parte também houve uma revolução. Nos anos 70, eu, Clara [Nunes] e Alcione [Nazareth] fomos as primeiras mulheres a vender muitos discos. A gente quebrou um tabu que existia. Nós fizemos esse sucesso todo e lançamos novos compositores. Eu tinha moral na produtora, podia lançar os novos e resgatar os velhos", disse ela em entrevista ao jornal "El Pais", em 2016.
Os seus 50 anos de carreira e sucesso tornaram sua voz eterna. Ganhou eco quando gritou: "Vou Festejar", um dos maiores sucessos na sua voz, e confiou sua força a si mesma, assim como fez com as outras mulheres, em "O que é, O Que é?", originalmente composta e interpretada por Gonzaguinha.
"Eu só sei que confio na moça/E na moça eu ponho a força da fé/Somos nós que fazemos a vida/Como der ou puder ou quiser".
"O samba é, ao mesmo tempo, machista e matriarcal. A mulher tem um papel muito forte e não só na cozinha. Desde sempre, as pastoras tinham o papel de definir os sambas das escolas. A mulher é fundamental como ponto de equilíbrio e o melhor exemplo é o respeito que os homens têm pelas mães e avós. E tem o lado religioso: ninguém faz nada sem consultar a mãe de santo. E eu, ao longo da minha carreira, procurei me afirmar como mulher, conquistar meu espaço, mas sem deixar de lado o papel acolhedor. Não à toa, acabei virando madrinha de muita gente que surgiu neste meio", disse em entrevista ao "UOL".
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