"Falaram que eu teria câncer e HIV", diz jovem gay criado para ser pastor
Filho e neto de pastores da Assembleia de Deus, Jhonat Machado, de 21 anos, cresceu indo à igreja que a família frequentava em Guarulhos, na Grande São Paulo. Aos 18 anos, no entanto, resolveu se aceitar após anos tentando "se curar" por ser gay.
A rotina religiosa seguida por Jhonat era intensa: ele passou a adolescência pregando a palavra de Deus, se dedicava à igreja em seus dias de folga e estudava para seguir os passos da família e exercer o pastoreado. "Viajava para pregar a palavra de Deus. Ele me usava para curar as pessoas. Entrei em favelas para falar do amor de Cristo e vidas eram salvas e libertas. Porém, tinha dias em que eu me perguntava: 'onde estava Deus?'. Pois eu queria uma libertação de algo que não existia", conta.
"Em muitos prantos e rios de lágrimas, conversava com o Senhor pedindo uma cura, porque eu achava que por ser gay eu era doente. E eu não era. Sempre senti atração por homens, mas passei meses noivo de uma moça da igreja. Pensei que a religião ia me curar, mas cheguei a cogitar suicídio", diz a Universa.
"No momento mais difícil, de depressão e pensamentos suicidas, a ficha caiu. Olhei para a cruz e descobri o verdadeiro amor de Cristo", lembra. "Fiz estudos bíblicos mais profundos, entendi que da mesma forma que a Bíblia condena a homossexualidade, condena a mulher que corta o cabelo, por exemplo."
Em maio, ele publicou um relato no Facebook em que contou como decidiu viver sua vida. O post acumula 90 mil interações, entre curtidas, comentários e compartilhamentos. "Lembro como se fosse hoje: coloquei o travesseiro na boca e gritava muito. Era muito forte a opressão que eu vivia."
"Saí da igreja, mas não de Cristo"
Aos 17 anos, Jhonat montou um salão e começou a trabalhar como designer de sobrancelhas. No ano seguinte, saiu de casa. Pouco tempo depois, se assumiu gay e deixou a Assembleia. Na época, ouviu comentários pesados dos pastores e de seus colegas evangélicos. "Saí da igreja porque eu não aguentava mais as aflições. Recebi profecias dizendo que eu ia para inferno. Pessoas disseram que eu ia ter câncer, pegar Aids e que não duraria mais de três meses [fora da igreja]", lembra. "Mas eu estou firme, tenho muita saúde, nem gripe pego".
Apesar de já morar sozinho em outro endereço, ele conta que, quando deixou a igreja e contou ser gay, a família sofreu um baque. Hoje, no entanto, a relação dele com os parentes é boa. "Eles me aceitam e respeitam a vida que eu levo." Ele teve um relacionamento com outro homem durante um ano e oito meses, mas agora está solteiro.
Mesmo tendo enfrentado preconceito de outros cristãos logo que assumiu sua sexualidade, Jhonat não quis deixar sua fé de lado. Por indicação de uma amiga, ele encontrou apoio na Igreja Apostólica Novo Templo, criada por pastores gays e que acolhe a comunidade LGBTQ+, no bairro da Penha, zona leste de São Paulo.
"Saí da igreja, mas não de Cristo", diz. "A experiência lá é muito bacana: eu prego e canto com os outros fiéis. Mas só vou aos domingos, quando tenho folga no trabalho."
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