Designer vende sapatos por R$ 800: "Não associam marca a uma mulher negra"
Quase todo mundo relaciona a ideia de sapato formal, de festa, àqueles modelos de salto fino, quase garantia de dor nos pés no dia seguinte. Para a designer Izabella Suzart, no entanto, a ideia é outra. O modelo mais famoso criado por ela, o #Olívia, de sua marca A-Aurora, foi feito justamente pensando em aliar conforto e estilo.
"Pensei em um sapato para ser usado em um casamento, substituindo o salto fino sem perder a elegância. Ele é confortável porque, apesar de ser de madeira, é emborrachado por dentro na parte dos dedos, então fica mais leve e tranquilo para caminhar. É um calçado para ocasiões mais arrumadas ou 'chiques'", conta ela.
Izabella tem 25 anos, é negra e moradora do Méier, bairro da Zona Norte do Rio. Nascida em Madureira, no coração do subúrbio carioca, ela alia moda a posicionamentos políticos. Estudou moda na Pontifícia Universidade Católica, instituição tradicional da elite da cidade e relaciona moda à política.
"Há várias questões na faculdade, várias nuances. É um ambiente muito elitizado. Existe um lugar dentro do racismo estrutural brasileiro em que você pode transitar e ter acesso a determinadas informações e isso é muito poderoso, mas, ao mesmo tempo, é uma instituição que te coloca o tempo todo em outro lugar. Até geograficamente, o próprio lugar em que fica (na Gávea) tem o acesso péssimo de transporte público", diz ela. Apesar das ressalvas, foi na PUC que ela começou a se interessar, entre as tantas possibilidades dentro de design, por sapatos.
"Em 2014, eu fiz uma especialização no Instituto Europeo di Design, aqui no Rio, e daí em diante, realmente entendi que queria trabalhar com sapatos", conta. No mesmo ano, ela criou #Olívia.
"Por causa do modelo, fui convidada para participar da exposição o Design e a Madeira, no Museu de Arte Moderna do Rio, em 2016. Desenhei outros modelos de madeira para essa coleção. Em 2017, fui chamada para participar do Gallery Calender, um calendário que expõe um sapato diferente para cada dia do ano. Fui a única brasileira nele", conta ela.
'As pessoas não associam minha marca a mim'
O sucesso da marca, que cobra entre R$ 329 e R$ 814 pelos modelos desenhados por Izabella, passa por questões políticas e vem acompanhado de situações em que a proprietária identifica atitudes racistas.
"É tão assustador a dificuldade das pessoas de associar a minha imagem à marca. Ninguém espera que os sapatos sejam meus, que a dona da marca seja uma mulher negra", conta, dizendo que, em termos de negócios, ignora de forma estratégica olhares e atitudes de descrença.
"Esperam algo de uma mulher negra na moda. Que obedeça, por exemplo, alguns estereótipos que o Brasil entende como sendo da África. Entre eles, uma estética colorida, estampada. É preciso desconstruir a ideia de que a produção de moda negra tem que ser sempre assim. A gente precisa falar da estética contemporânea de pessoas pretas que estão produzindo a partir das nossas próprias referências", explica ela, que tem os anos 70 como grande fonte de inspiração para seu processo de criação.
No final de julho, Izabella abriu um ateliê em que pretende receber suas clientes, com hora marcada. "São mulheres de diferentes idades que gostam de arte, que apreciam o que eu tenho a dizer e gostam de arte e política", diz ela, sobre quem são as mulheres que usam a sua produção.
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