Gleisi chama Bolsonaro de bandido e insiste em Lula candidato do PT em 2022
Em pouco mais de dois anos, a deputada federal Gleisi Hoffmann (PT-PR) testemunhou o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT), a prisão do líder maior do seu partido e a derrota nas urnas que escancarou uma força antipetista no país.
Enquanto o PT enfrentava sua maior crise, Gleisi entrou para a lista de investigados da Operação Lava Jato, trocou o Senado pela Câmara, se tornou a primeira mulher a assumir a presidência do Partido dos Trabalhadores e se separou do ex-ministro Paulo Bernardo, com quem estava casada desde 1998 e com quem tem dois filhos, de 17 e 13 anos.
A advogada de 53 anos diz que pretende se manter no comando do maior partido de oposição do país. Questionada sobre um cenário para as eleições presidenciais de 2022, Gleisi usa o futuro do pretérito para afirmar que, se o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva tiver condições --ele cumpre desde 2018 pena de 8 anos de prisão e já foi condenado em primeira instância a outros 12 anos--, não haverá dúvidas sobre sua candidatura. "Não construímos lideranças de uma hora para outra", diz a presidente do partido, que cita Fernando Haddad com nome reserva.
Até lá, reforçará suas críticas incisivas ao presidente, a quem chama de "ser folclórico" e "bandido". Mas ameniza o tom quando instada a apontar uma proposta boa nesses sete meses de governo. "Talvez o 13º do Bolsa Família".
Na planilha de repasses irregulares da Odebrecht, ganhou o apelido de "amante" e tem seu nome rimado com a palavra louca na língua inglesa, dado o comportamento aguerrido. "A vida sexual dos homens nunca é discutida na esfera pública", reflete a petista de 1,60m, que só não se tornou freira porque o pai não deixou.
Em uma hora de conversa com Universa, no segundo andar da sede do partido no centro de São Paulo, a deputada comentou críticas ao seu modo de agir e voltou a dizer que partido é vítima de perseguição. Leia, a seguir, trechos da entrevista. A íntegra você pode assistir no Youtube ou ouvir no podcast.
UNIVERSA: Críticos se referem à senhora como uma mulher que fala loucuras, atribuindo-lhe o apelido de "Crazy Hoffmann" por atitudes como a ida à posse do ditador venezuelano Nicolás Maduro. Tem a ver com o fato de a senhora ser mulher?
GLEISI: Acredito que sim, porque quando os homens são mais enfáticos, são compreendidos. Ninguém os chama de loucos. Quando é uma mulher, e eles perdem a razão, aí vem argumentos como esses. Tudo que eu falei foi dentro de um contexto e que achava procedente, então utilizei forças de expressão para mostrar a gravidade dos fatos e a minha contundência em relação a eles. Sofri e sofro muitos ataques, mas adotei a prática de ajuizar ações contra essas agressões, e ganhei várias. Um colunista insinuou, por exemplo, que eu tinha relações sexuais com um dos delatores da Lava Jato. Geralmente buscam depreciar a mulher usando esses fatores.
Recentemente, a PGR (Procuradoria-Geral da República) pediu que o STF (Supremo Tribunal Federal) enviasse o processo em que a senhora e o ex-ministro Paulo Bernardo respondem por crimes contra administração pública para a 13ª Vara Federal de Curitiba. Como essas situações afetam seu casamento?
Nós nunca deixamos isso afetar a relação. Eu e Paulo estamos separados já há mais de um ano, mas não foi por conta da política e nem por conta dessas questões. Sempre tivemos muita clareza do que seria, tanto que ele é militante também, por muito tempo foi deputado e é filiado ao PT, ele conhece bem o que significa o mundo da política, a forma como se fazem as disputas e conhece bem também o machismo na sociedade. Então sempre teve muita compreensão do meu lado e do lado dele.
Sobre a eleição da presidência do PT, em novembro, o que o partido ganha mantendo a senhora no cargo?
Como sou a primeira presidenta, a referência para as outras mulheres petistas e também para as mulheres que fazem política é muito grande. É o maior partido de esquerda do Brasil e da América Latina, e assumir essa presidência mostra que o PT tem uma política de comprometimento com a participação das mulheres nos seus processos decisórios. Nós somos o primeiro partido a implantar cotas para as mulheres nas direções. Começamos com 30% e hoje nós temos 50%. Não tenho dúvidas de que sou consequência dessa política. Eu gostaria muito de continuar no cargo. Meu nome está à disposição.
Uma ala do PT gostaria que a senhora não disputasse a presidência novamente. Por que a senhora incomoda?
Faz parte da trajetória do PT e do nosso histórico. É muito difícil o PT ter uma unanimidade. Óbvio que tem pessoas que têm críticas à minha gestão, por eu ter sido mais afirmativa, mais combativa, mais aguerrida, mas achava que era o momento de ser assim. Nós tínhamos sido destroçados por um golpe que retirou Dilma da Presidência da República, depois prenderam o Lula, que é o maior líder político popular do Brasil. Precisava ter uma posição de mais enfrentamento.
Há setores do partido que acharam que tinha que ter um tom abaixo. Cada um colabora com a política e com o partido dentro do seu estilo. Acredito que se eu agisse diferente, não seria eu e não daria minha contribuição para política como eu acho que estou dando
O partido pensa em uma mulher para as próximas eleições presidenciais?
Não temos nenhuma discussão para 2022. Primeiro porque nós temos a figura do Lula, e apostamos muito que o Lula saia da prisão, porque é injusta e ilegal. O Lula é uma grande liderança do partido, e tendo condições de disputar, não teria dúvidas de que o PT disputaria com ele. Obviamente, se isso não acontecer, tem o nome forte no partido que é o do Fernando Haddad, que já foi nosso candidato a presidente. Não formamos candidatos e não construímos lideranças de uma hora para outra. Obviamente, ele é um dos nossos nomes para 2022, não tenho dúvidas disso. Mas está muito cedo para discutir a eleição de 2022.
Haddad criticou a senhora por ter dito que ele é um bom nome para a Prefeitura de São Paulo e também fez críticas quando a senhora foi à Venezuela apoiar Maduro. Como é a relação de vocês?
É muito boa. Acho que os ruídos são mais externos a nós do que entre nós. E tem um pouco de fofoca também. Óbvio que o Haddad tem todo direito de fazer as críticas e posicionamentos dele, assim como eu tenho, mas a gente se respeita muito. O Haddad é um grande nome do PT, é uma das figuras de grande representatividade.
A senhora acha que o partido, em algum momento, se vitimizou?
Não. Na realidade, o partido foi vítima de um processo armado de perseguição, de criminalização do PT e do próprio presidente Lula. Estamos vendo agora, com as revelações do Intercept, tudo aquilo que falávamos.
Nesses sete meses do governo Bolsonaro, qual a sua avaliação até aqui?
É um governo com projeto de destruição. O Bolsonaro é um ser folclórico. Esses dias fiz uma afirmação pesada, mas acho que é isso mesmo: é um bandido na Presidência da República, que flerta com milícias, com o ilícito, com o autoritarismo, capaz de se dizer cúmplice de um assassinato, de um desaparecimento político no Brasil. Durante esses 7 meses não teve uma proposta sequer para tirar o povo da crise. Nós não temos uma política de empregos no país, uma política de renda, de renegociação da dívida.
A senhora vê algo de positivo no governo do presidente Jair Bolsonaro?
Não vejo nada de bom no governo Bolsonaro.
Mesmo fazendo todo esforço, não vi uma ação sequer, uma ação que pudesse ser boa. Uma, talvez: o décimo terceiro do Bolsa Família que ele fez por proselitismo e depois retirou o reajuste da inflação do Bolsa Família.
Ou seja deu com uma mão e tirou com a outra, fez apenas uma compensação orçamentária.
A aprovação da reforma da Previdência foi uma derrota para a oposição?
Não totalmente. É uma derrota para o povo brasileiro, porque ela desmonta o sistema de Seguridade Social, mas nós conseguimos, por exemplo, não deixar privatizar a Previdência, a capitalização não passou, também não permitimos que mexessem com a aposentadoria dos [trabalhadores] rurais. Então, tivemos algumas vitórias importantes dentro da conjuntura difícil que nós estamos vivendo, mas obviamente o contexto geral da reforma é muito ruim para o Brasil e vai se mostrar logo na realidade vivida pelo povo brasileiro. Vamos continuar fazendo uma oposição sistemática e dura, com propostas para o Brasil, como um programa emergencial de emprego e renda. Se Bolsonaro quiser, pode implementá-lo.
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