Como Régis, de A Dona do Pedaço: por que a gente só dá valor quando perde?
Desde que entrou no ar, A Dona do Pedaço tem mostrado diversas situações que acontecem no cotidiano de muitas pessoas, ainda que de maneira exagerada, o que é típico de uma novela. Entre os casos, está toda a falcatrua que Régis (Reynaldo Gianecchini) cometeu contra Maria da Paz (Juliana Paes).
Ele se casou com a boleira, teve um romance tórrido com a filha dela e armou para que Maria perdesse a fortuna que construiu. Agora, depois de tudo que fez, descobriu que a personagem de Juliana é o grande amor de sua vida e quer reconquistá-la. É com diz o antigo ditado: 'A gente só dá valor a algo ou alguém, quando perde'. E por que, algumas vezes, precisa ser assim?
"Essa é uma questão difícil de ser respondida de maneira generalista. Eu acho que muitas pessoas passam a dar valor quando se afastam porque o distanciamento do outro faz com que a pessoa se torne mais atraente. Para alguns, existe charme em pessoas indisponíveis, quase impossíveis", conta Desirée Cassado, psicóloga, mestre em psicologia experimental pela USP e professora na The School of Life.
O ser humano é imperfeito, é muito errado, toma decisões impulsivas e depois olha para trás e se arrepende, porque percebe que a nova realidade não é tão legal, já que nada é tão bom e interessante quanto a fantasia criada
Trair e coçar...
Há pesquisas pelo mundo que apontam que a traição — em diversos níveis, ou seja, desde flertes até às vias de fato — são a realidade da maior parte dos casais. Em uma delas, o número apontado pelos pesquisadores sugerem que até 75% das pessoas já teriam sido infiéis.
Contudo, antes de cometer algo e se arrepender, vale entender e refletir algumas coisas, como pondera Desirée. "Muita gente que comete ato de traição não faz somente porque se encanta por outra pessoa. Elas, na verdade, estão em busca de sentimentos que não têm faz tempo. Ou seja, não é uma busca pela traição simplesmente, é uma busca por um pedaço de si, uma emoção que ela não encontra em mais nenhuma área da vida. Por isso, antes de trair, vale se perguntar que emoção está buscando sentir com uma outra relação? Todo mundo que está em dúvida sobre fazer ou não fazer, deveria considerar as consequências a médio e longo prazo, considerar se está machucando o outro ou não. E ponderar também o que espera de um relacionamento estável e de um fugaz".
Segundo a psicóloga, a traição, seja ela de qual espécie for, não é uma decisão que acontece em minutos, assim como a separação definitiva, é uma construção, que às vezes é feita sozinha na cabeça da pessoa sem avisar o parceiro. "Corajosos são os que saem da relação antes de magoar o outro, e assumem a decisão de corpo e alma. Mas esses são raros", pondera Cassado.
Dias que seguem
Na novela, ao que tudo indica, Maria da Paz não aceitará Reges de volta. Contudo, na vida real, não é incomum que isso aconteça. E Desirée aponta que toda crise conjugal, havendo ou não traição, é uma oportunidade para construir intimidade, de criar uma nova relação.
"A sociedade desvaloriza muito o casal que quer tentar de novo, por isso aconselho que se mantenham firmes na decisão. É difícil construir um relacionamento sólido, mas com amor e transparência é possível ter algo novo com uma antiga pessoa. Não vai ser fácil, é claro. Tanto o agente quanto a vítima vão sofrer muito, mas não existe ambiente seguro no amor. Ou você ama e corre riscos ou não ama ninguém para não se machucar. Quem foi traído, tem um longo caminho em relação ao perdão, a cuidar de si mesmo, da autoconfiança e da autoestima. Quem foi o agente da situação, precisa saber quer, em muitos momentos, vai ver o parceiro sofrer, chorar, que o assunto voltará à tona. E precisa estar aberto para acolher e tolerar o sofrimento do outro", conclui Desirée.
"Fiz uma tatuagem com ela, mas quis voltar para minha ex"
"Eu estava casado há cinco anos com a Joana*. Vivíamos juntos, frequentávamos os mesmos ambientes e compartilhamos nossas famílias — ela tinha os filhos dela de relacionamentos anteriores e eu os meus. Determinado dia, por meio de pessoas em comum, conheci a Sandra*, que também era casada. Sandra e eu começamos a nos aproximar lentamente e depois de uns meses, ficamos. Um mês depois que isso aconteceu, deixei minha esposa e saí de casa. E ela também terminou seu casamento. Nas primeiras semanas, não assumimos o relacionamento para ninguém. Aos poucos, ela foi introduzida para minha família e filhos, e vice-versa. Tentávamos não nos expor em redes sociais e não mudamos o status de relacionamento, embora as pessoas do nosso círculo e nossos ex-parceiros soubessem que estávamos namorando. Após quatro meses de relacionamento, fizemos uma tatuagem juntos para eternizar o amor que estávamos vivendo.
Mas apesar de gostar de Sandra, eu sentia falta de minha antiga esposa e do lar que havíamos construído e achei que devíamos tentar novamente, pois passamos muitos anos juntos. Um dia, fui a casa da Joana, levei flores, conversamos, pedi perdão, choramos e disse que queria voltar. Naquela noite, ficamos juntos e, alguns dias depois, terminei com a Sandra e contei o que estava acontecendo. Não foi fácil no início, nem para mim e nem para elas. Assumir meu antigo relacionamento para a família foi o mais difícil, principalmente porque a Sandra já tinha criado amizades com meus parentes e frequentava a casa deles.
Hoje, estou com a Joana e frequentemente encontramos Sandra, principalmente em eventos sociais, como aniversários que envolvem meus familiares, já que eles criaram um laço. É sempre constrangedor para mim e para Joana e, por vezes, deixamos de ir aos encontros para evitar o climão que fica. Estamos reconstruindo a relação pouco a pouco. A tatuagem que fiz nesse tempo com a Sandra ficará por aqui por enquanto até eu cobrir com outro desenho".
Marcelino Oliveira, Belo Horizonte
* O nome das envolvidas na situação foi trocado para protegê-las
"Decidi perdoar e não me arrependo"
"Diego e eu começamos a namorar quando eu tinha 15 anos e ele tinha 18. Com o passar tempo, continuamos juntos. Depois que me formei na faculdade, nós dois fomos morar juntos, noivamos, com direito a uma festa de celebração com familiares e amigos.
Ele morava no Sul do país e eu no Rio de Janeiro. Me mudei para viver com ele e, determinado dia, cerca de três semanas depois que estava lá, ele saiu para trabalhar e deixou o Facebook aberto. Daí foi um choque todas as mensagens que eu vi. Ele sempre foi excelente, não tem muito o que falar dele. Na hora, liguei para o celular do Diego e disse que ele havia esquecido a rede social logada. Escutei pelo telefone ele freando o carro desesperado. Ele voltou em seguida para casa. Eu tinha acabado de me mudar para viver com ele, de ficar noiva, de mostrar para todo mundo que meu relacionamento estava dando certo, que um dia casaria.
Eu nem tinha arrumado minhas coisas quando descobri isso e pensei em como agiria. Deveria ir embora? Eu senti muita vergonha, fazia pouco tempo que eu estava ali. Depois de muito choro, estresse, nós dois resolvemos tudo ali da porta para dentro e decidimos seguir juntos, até porque as mensagens eram de meses atrás — já estávamos namorando, mas não estávamos noivos e nem vivendo juntos ainda.
Ponderei que estávamos muito sérios na relação e não aconteceria mais nada a partir daquele momento. Moramos mais um ano e, por motivo de trabalho, ele foi transferido para o Rio de Janeiro e, nesse processo de transferência, ele decidiu que queria terminar. Nisso, descobri que ele continuou me traindo. Ele seguiu a vida dele e eu arrumei minhas coisas e também fui embora.
Durante uns meses, ele ficou atrás de mim e fomos conversando para ver como agiríamos. Eu resolvi então ficar com ele. A gente se casou, eu engravidei. Eu achei que valia mais a pena ficar com ele, porque eu o amo, é meu melhor amigo. Eu achei que não tinha tempo para levar adiante a situação. Claro que teve um processo de perdão, mas sofremos juntos. Eu tentei não espalhar a história para outras pessoas, porque a parte externa, família e amigos, atrapalham muito. Eu encontrei situações onde consegui o perdoar e conviver bem com isso. Eu não fico voltando nisso, mas quando surge um assunto similar, vejo que ele fica bem triste. Percebo que ele ter me machucado feriu mais a ele. Eu achei que valia a pena perdoar, porque eu queria ser feliz com ele. Eu não queria passar anos e olhar para trás e me arrepender de não ter vivido isso. Perdoei e tem valido muito a pena. E confio nele. Lógico que sou mais realista que as coisas podem acontecer e não somos imunes, mas não fico pensando nisso"
Gabriella Costa, São Paulo
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