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Tina ganha HQ e debate assédio: "Chance do homem ver como mulher se sente"

Em "Respeito", Tina sofre assédio no trabalho e discute outras pequenas situações perigosas que mulheres passam no dia a dia - Reprodução/Instagram
Em "Respeito", Tina sofre assédio no trabalho e discute outras pequenas situações perigosas que mulheres passam no dia a dia Imagem: Reprodução/Instagram

Natália Eiras

De Universa

24/09/2019 04h00Atualizada em 24/09/2019 10h31

Tina surgiu nas tirinhas de Maurício de Sousa em 1964. Inicialmente, a personagem tinha um visual hippie, a cara dos jovens de seu tempo. Com o passar dos anos, a amiga de Rolo e Pipa mudou o guarda-roupa, deixou o cabelo crescer, se tornou "namoradeira" e estava sempre ajudando a melhor amiga em suas dietas malucas. As características faziam com que a personagem talvez contribuísse para o estereótipo da jovem "desmiolada". Até o lançamento de "Respeito", nova graphic novel da Maurício de Sousa Produções que está disponível nas livrarias.

Na história cuja arte e roteiro são assinados por Fefê Torquato, a personagem, agora uma jornalista recém-formada, passa por situações que mostram as diversas formas de assédio que uma mulher sofre ao longo do dia. "A história que criamos é boa para o público feminino para validar a gravidade dessas situações que, muitas vezes, são mascaradas", fala a quadrinista em entrevista para Universa.

Tina - Divulgação - Divulgação
Imagem: Divulgação

A roteirista diz querer que os homens criem empatia. "Eles precisam ler o livro e se tornar a Tina por um momento para entenderem o que passamos diariamente", diz a quadrinista, que espera que os leitores tenham, durante a leitura, uma nova visão sobre como é ser mulher na sociedade atual.

Para a artista, um livro pode fazer com que, pelo menos durante o passar das folhas, o leitor viva uma outra perspectiva diferente da dele. "É uma chance de se colocar no lugar de uma mulher e ver como ela se sente."

O assédio de todos os dias

Nascida em Imbituba (SC), a quadrinista tem trabalhos autorais publicados como "Gata Garota" e "Estranhos", mas estava havia dois anos longe das histórias sequenciais. Em agosto do ano passado, ela foi abordada pela MSP, que já tinham a ideia de fazer uma graphic novel de Tina cuja temática seria o assédio no emprego.

Por trabalhar em casa, a quadrinista conta que nunca passou por um caso de assédio sexual no local de trabalho, mas ressalta que há várias formas de mulheres se sentirem em perigo ou coagidas.

"Generalizando, qualquer mulher já passou por um assédio. Seja andando na rua e ouvindo um 'fiu fiu' até o preconceito." Um acontecimento que marcou Fefê foram os relatos da hashtag "Meu Primeiro Assédio", que resgatou memórias que ela tinha esquecido. "Comecei a lembrar de situações em que passei, comentários que ouvi quando era criança ou adolescente, e que tinha apagado, porque essa foi uma forma de eu me resguardar, né? Porém, é importante entendermos que essas situações são graves e legítimas. Um assédio nunca é 'nada demais'."

Tanto que Fefê faz questão de ressaltar que, em um certo momento, Tina passa por uma situação séria, mesmo que isso possa passar despercebido. "Tivemos que contar de uma maneira muito discreta, por ser uma HQ voltada para o público jovem, mas é importante reforçar que o que ela sofreu foi um assédio sexual."

Por mostrar esse outro lado da violência, mais discreto e mascarado, é que Fefê acha importante que homens leiam "Respeito". "Para eles entenderem como temos que pensar em coisas como 'como voltarei para casa?' e 'não posso beber muito' quando saímos de casa."

Segundo a quadrinista, um drinque a mais pode representar uma situação de vulnerabilidade para a mulher, o que nem sempre homens conseguem entender. "Por causa da violência, [mulheres] gastam energia com coisas vistas como 'bobas'. Coisas que eles nem precisam pensar antes de ir para uma festa."

"Como respeito pode ser tão polêmico?"

Na Bienal do Livro do Rio de Janeiro, o prefeito Marcelo Crivella pediu a retirada de um volume da HQ "Vingadores" por causa de um beijo entre dois homens. De acordo com ele, "o livro estaria incitando a homossexualidade." Fefê, porém, percebe, no livro, na arte e no entretenimento em geral, uma grande capacidade de educação e de conscientização. "É a forma mais fácil de criar empatia", afirma.

"Respeito" foi lançado na Bienal. A roteirista diz que, até o momento, a recepção da graphic novel foi muito positiva. O mesmo não pode ser dito quando a capa e o título do livro foram divulgados, no começo do ano. "A maior parte das críticas foi porque o nome era 'Respeito', uma coisa tão óbvia. Como pedir para que alguém nos respeite pode ser polêmico?", afirma, rindo, a quadrinista. "Diziam que seria uma cartilha feminista, mas respeito é o mínimo que todos temos que ter em relação uns aos outros."