Hamuche: marca brasileira febre dos anos 80 vira ouro em brechós de SP
Em feiras de brechós e no Mercado Livre, tornou-se comum encontrar calças jeans, de flanela e até macacões coloridos com etiquetas da Hamuche. A marca brasileira foi criada em 1968 no bairro do Brás, polo têxtil da cidade de São Paulo, pela família de mesmo nome.
Em mais de 50 anos de história, a confecção já foi franqueada de grife francesa no Brasil, febre no guarda-roupa dos moderninhos dos anos 1980 e esteve envolvida até em caso de Justiça por pirataria. E, nos últimos meses, se tornou também uma mina de ouro para "brechozeiros", que vendem estoque vintage da marca para pessoas ávidas por mom jeans, jaquetas oversize e outras peças com modelagem dos anos 90.
As peças disponíveis nos brechós atualmente são do tempo em que Hamuche estava no auge. Em uma busca em lojas nas redes sociais ou em feiras especializadas, é comum ver as peças sendo apresentadas como "vintage não usado". Isso porque, apesar de serem realmente dos anos 80 ou 90, elas nunca foram usadas.
Quando Larissa Feba, dona do brechó online Luna.atic, viu uma caixa de calças jeans ainda com etiqueta em um bazar ela ficou muitíssimo curiosa. "Perguntei de onde aquilo tinha vindo, mas não quiseram me falar. Tirei uma foto da etiqueta e bati nos endereços disponíveis."
Foi assim que descobriu, há dois anos, um ponto de venda de peças da Hamuche, que hoje em dia compõe boa parte de seu inventário. "Os clientes procuravam roupas que se assemelham com os looks dos anos 90, por isso quando o estoque da Hamuche foi achado, as peças foram embora como água", diz Larissa. "São justamente o tipo de roupa que o público tem procurado nos brechós: calças de cintura alta, macacão jeans, calça de veludo, jaqueta oversized."
Para ter acesso aos produtos, Larissa precisa mandar uma mensagem para um número marcando horário e é obrigada a comprar 35 kg em roupas, o que sai por volta de R$ 750. Mas, na internet, há também itens sendo vendidos por lotes de até R$ 1.000 por meio informal ou no Mercado Livre. "A procura pela fonte de mais roupas da Hamuche é tanta que tem dono de brechó que cobra R$ 200 para passar o contato de quem pode vender novos lotes", diz a empreendedora.
Pode parecer loucura comprar 35 kg de calça jeans e jaquetas, mas o investimento pode valer a pena para a revenda. Uma calça da Hamuche costuma ser vendida, pela internet ou em feiras especializadas em roupas vintage, por valores que vão desde R$ 90 até R$ 120. "São peças de qualidade que já existem há mais de 20 anos e estão prontas para durarem ainda mais tempo", afirma Larissa.
O início e auge da Hamuche
A história da Hamuche começou com uma camisaria. O pai de Fauzi Hamuche, que está hoje à frente da empresa, chegou ao Brasil em 1929, vindo do Líbano. Aqui, o patriarca começou a trabalhar na indústria têxtil e logo abriu uma fábrica de tecidos. "Depois, começamos a produzir calças jeans", fala Fauzi.
O auge da Hamuche começou nos anos 1980, quando a empresa se tornou a base licenciada da grife francesa Givenchy. Naquela época, era comum, de acordo com a microempreendedora e dona de brechó Erika Guimarães, de São Paulo, que grifes internacionais "contratassem" confecções locais para fabricar os produtos que seriam vendidos no país.
"Era mais barato fazer a produção da peça aqui do que trazê-la pronta de fora. As marcas mandavam os jeans já cortados e grandes fábricas do bairro do Brás faziam o arremate", afirma. "A Diesel e a Yves Saint Laurent também tinham bases do tipo."
Tendo a qualidade do jeans reconhecida por uma grife como a Givenchy, a família Hamuche viu a oportunidade de vender o produto sob a sua própria etiqueta. "A gente vendia um produto de alta qualidade com um preço mais justo, mais acessível", afirma Fauzi. Nos tempos áureos, a empresa chegou a ter 25 lojas espalhadas por shopping centers e em ruas conhecidas da cidade. "Era uma marca até que bacana e bem popular", comenta Érika.
Todo mundo queria ter uma calça jeans da Hamuche. A popularidade não impediu, no entanto, que no fim dos anos 90 a marca diminuísse a sua atuação no varejo. De acordo com Fauzi, o mercado foi, "invadido por marcas internacionais" de roupa, o que fez com que as nacionais passassem por sufoco. "Foi por causa disso que a Zoomp fechou, por exemplo", fala o empresário. Nessa entoada, a Hamuche manteve a confecção aberta, mas encerrou as atividades das lojas para o consumidor final.
Fechamentos e pirataria
Atualmente, a família Hamuche coleciona, nas Varas Cíveis, uma série de processos relacionados às finanças das empresas do grupo. Uma delas, a Norsul Têxtil e Moda LTDA declarou falência, em 2010, deixando dívidas de mais de R$ 70 milhões.
O grupo também se envolveu em uma polêmica de pirataria. Em 1999, uma etiqueta da Hamuche se tornou motivo de uma briga judicial. Os donos da Forum, marca consolidada no mundo da moda, entenderam que o logotipo da confecção —na época, um H dentro de um retângulo— era muito parecido com o seu.
Há nove anos, a 3ª Vara Cível de São Paulo decidiu que a Hamuche pagasse, de acordo com a revista "Época", R$ 65 milhões de indenização para Forum por pirataria de marca. Para Universa, Fauzi disse que o caso "já acabou". "Não houve progressão, chegamos a um acordo amigável", afirma o empresário.
A confecção continua a todo vapor. Porém, Fauzi garante, para Universa, que a Hamuche não vende roupas para brechós. Por isso, o empresário diz não saber onde ou como os pequenos empreendedores tiveram acesso ao inventário antigo da marca. "Acredito que tenha tido sobras de grandes magazines e elas encontraram essa forma para desovar o estoque que estava parado", diz.
No atacado, os produtos da Hamuche são vendidos sob as etiquetas H-Star e Hamy. A mudança de nome foi, segundo Fauzi, uma decisão estratégica. "A gente passou a exportar e a ser mais competitivo." Eles mantém duas lojas das marcas, focadas no atacado, no bairro do Brás.
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