Juíza barra advogada em fórum por tamanho de saia: "Tira atenção de homens"
"A senhora precisa abaixar sua saia, é muito curta", disse o segurança do Fórum de Iguaba Grande (a 127km do Rio de Janeiro) à advogada Rafaela Jaworski, em setembro do ano passado, quando ela tentava entrar no local para participar de uma audiência. "Questionei sob qual fundamento ele dizia aquilo, já que minha vestimenta estava condizente com minha profissão", afirma Rafaela. O segurança apontou para um cartaz do tamanho de uma folha A4, com a foto de uma mulher, do pescoço para baixo, trajando um vestido preto, e o aviso de que o comprimento das saias deveria ser de, no máximo, cinco centímetros acima do joelho. Disse que eram "ordens da direção do fórum."
Pode isso?
Segundo a diretora de Mulheres da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) do Rio de Janeiro, Marisa Gaudio, não. "Não há uma regra de vestimenta consolidada, uma portaria para o estado todo, seguimos o bom senso. E, mesmo que houvesse, teria que vir do órgão de classe, que é a OAB. Não compete ao tribunal dispor sobre a roupa dos advogados", afirma Marisa. "Quando não se permite que uma advogada entre em um fórum, há uma violação do direito do próprio cidadão, que é cliente dessa advogada", diz Marisa.
A ordem veio da juíza do Fórum, Maira Valéria Veiga de Oliveira, com quem Marisa conversou pessoalmente sobre a situação. "Ela argumentou que as saias curtas demais tiram a atenção dos homens nas audiências", diz.
"Juíza disse que se vestem como periguete"
A advogada Rafaela se queixou à presidente da subseção da OAB na cidade, Margoth Cardoso. Outras advogadas que foram barradas também procuraram Margoth para relatar situações semelhantes. Como a de uma estagiária impedida de entrar no fórum que foi até o cartório próximo para costurar o casaco na saia. Uma outra advogada contou que foi levada para uma sala e o comprimento da sua saia foi medido com uma régua.
Em março deste ano, Margoth procurou a juíza, que afirmou que não iria mudar de posição. Diante do aumento das queixas, contatou a OAB Mulher do Rio. Há duas semanas, um grupo formado por Margoth e outras juristas foi ao Fórum de Iguaba Grande em uma ação chamada Blitz da Diretoria da Mulher. Uma das cinco integrantes, a advogada Rebeca Servaes, vice-presidente da Comissão OAB Mulher RJ, foi barrada. A ideia era, justamente, que uma situação como essa acontecesse para pedir uma reunião com a juíza. "Conversamos por quase duas horas, e a juíza insistindo que é uma vestimenta inadequada. Chegou a dizer que um vestido curto 'desfoca' os homens. Que eles não dão atenção aos processos porque ficam olhando para as pernas dela", disse Marisa.
"Falou que pareciam verdadeiras periguetes. Questionei o absurdo e tentei explicar que a mulher não é responsável pelo homem não ter atenção. Que o argumento seguia a lógica de que a roupa da mulher é que faz ela ser assediada, abusada. A juíza disse que nos daria uma resposta em uma semana, até quarta-feira (16), mas não disse nada e entramos com uma representação disciplinar na Corregedoria Geral de Justiça do Rio de Janeiro", explica Marisa. No documento, a OAB-RJ afirma que a juíza descumpre o Estatuto da Advocacia, que diz não haver hierarquia nem subordinação entre advogados, magistrados e membros do Ministério Público.
Margoth ainda salienta o caráter machista da determinação. "A gente vem lutando pelo direito da mulheres. Entendo que elas devem se vestir como querem, é um direito de escolha, ninguém pode determinar o que deve usar. E ninguém pode agredi-la por sua roupa e nem impedi-la de trabalhar."
Outro lado
Universa tentou falar, por telefone, com a juíza Maira Valéria Veiga no Fórum de Iguaba Grande e no fórum da cidade vizinha de Araruama, onde ela também dá expediente, nesta sexta-feira (25). No primeiro, a reportagem conversou com dois assessores de gabinete: um afirmou não ser autorizado a passar o contato da juíza e outro disse que ela estaria em Araruama o dia todo. No Fórum de Araruama, o secretário de gabinete afirmou que a juíza não estava no local. A magistrada também foi procurada por email, enviado para os dois fóruns, e por mensagem no Facebook, mas não enviou resposta até a conclusão desta reportagem.
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