Mulher denuncia racismo em loja de SP: "Para eles eu era ladra e ponto"
Resumo da notícia
- Charlete Viana Santos, de 43 anos, foi acusada de roubar uma peça que havia comprado em uma loja da C&A, no centro de São Paulo
- Em entrevista para Universa, ela alega que foi abordada com agressividade pela segurança e que foi constrangida diante de outras pessoas
- Testemunha afirma que a loja chamou a polícia antes de esclarecer os fatos
- Policiais teriam tentado levar Charlete para uma delegacia sozinha, dentro da viatura; ela teve que insistir para esperar a companhia de familiares
- A C&A alega que "a cliente foi convidada a retornar à loja para que o alarme de segurança fosse retirado do produto" e que está apurando os fatos
A cozinheira Charlete Viana Santos, de 43 anos, acredita que foi vítima de racismo em uma unidade da C&A, no centro de São Paulo, ao ser acusada pela segurança da loja de roubar uma peça que havia comprado. Em entrevista para Universa, Charlete contou que mesmo depois de apresentar a nota fiscal da compra, uma blusa de R$ 19,90, policiais foram acionados e pediram que ela entrasse em uma viatura da PM para ir até à delegacia, mas ela se recusou e disse que esperaria sua família chegar ao local.
Ela foi à C&A no sábado (2) fazer uma recarga para o celular da filha e disse que chegou a provar uma outra peça, um macaquinho, que ficou grande. Quando decidiu levar a blusa (que aparece na foto), foi até o caixa para pagar a peça e a recarga, mas a funcionária esqueceu de retirar o dispositivo que aciona o alarme na saída de local.
"Ela ia colocar a blusa dentro de uma sacolinha de papelão da loja, mas eu disse que não precisava e que levaria na mochila mesmo", conta. "Eu não ouvi o alarme apitar, se eu tivesse ouvido você acha que eu sairia caminhando tranquilamente?".
A cozinheira alega que a segurança a abordou com agressividade, já no meio da rua, alguns metros à frente da loja. "Ela estava convicta de que eu tinha roubado. Nessa hora todos os olhares estavam voltados para mim, para as pessoas [ao redor da C&A] eu era ladra e ponto final".
Charlete voltou à C&A, onde policiais a aguardavam para esclarecer os fatos — não sem alguma hostilidade de parte das agentes, segundo relatou.
Depois que os fatos foram esclarecidos, Charlete conta que os policiais queriam levá-la até a delegacia para prestar queixa, "mas não especificaram o tipo de B.O., se seria contra mim ou contra a loja", disse.
Ela precisou insistir para esperar a chegada dos familiares, contrariando os agentes, que queriam levá-la sozinha dentro da viatura.
Charlete recusou a "carona" no carro da PM e foi de Uber até o 2º DP, acompanhada por familiares, onde foi desencorajada pelo delegado de plantão a prestar queixa. "Ele disse que tinha quatro flagrantes e que se chegasse mais teria que passar na frente, que eu poderia passar dia e noite no banco esperando", conta.
Apesar de não ter registrado B.O., a cozinheira diz que está sendo orientada por uma advogada e que pretende levar o caso à Justiça.
"Pensaram que me levariam lá dentro [da loja], revistariam minha bolsa, diriam que foi engano e me mandariam para casa. Mas eu não sou boba. O que mais me machuca, do fundo do coração, é a falta de respeito, [agir] como se só preto roubasse", disse Charlete. "Eu não sou uma Taís Araújo, não sou uma Sheron Menezzes. Os seguranças não iriam atrás delas, mas vão atrás de um preto desconhecido que entra na loja de chinelo", disse.
Universa conversou também com a prima de Charlete, Tânia, que estava na região central quando foi acionada por familiares e se dirigiu à C&A para acompanhar a cozinheira.
Ela contou que pediu para falar com o gerente e ouviu de funcionários que ele já havia sido chamado e estava a caminho, mas momentos depois, quando voltou a pedir para falar com o responsável pela unidade, funcionários disseram que por ser feriado não havia gerente no local.
Tânia disse, ainda, que a segurança que abordou e acusou Charlete também saiu de cena com a chegada da polícia, que segundo ela teria sido acionada pela própria C&A.
"Mulher, negra, pobre, já viu né? Tenho certeza que se fosse uma mulher branca, do olho azul, loira, isso não teria acontecido", disse Tânia, em vídeo publicado pelos Jornalistas Livres.
Repercussão
O caso foi noticiado inicialmente pelos Jornalistas Livres e gerou revolta entre usuários do Twitter depois que o pesquisador da UFRJ Jonatas Dias contou a história de Charlete em seu perfil.
Outras pessoas contaram que já viveram ou testemunharam situações semelhantes em lojas da C&A, mas também em outras redes de fast fashion.
Outro lado
Procurada pela reportagem, a C&A disse, em nota, que "a cliente foi convidada a retornar à loja para que o alarme de segurança fosse retirado do produto" e que "não tolera qualquer tipo de discriminação e preconceito", por isso está apurando o caso.
Charlete contou à reportagem que a C&A entrou em contato com ela hoje, por telefone, para se desculpar pelo ocorrido. Apesar disso, ela pretende tomar providências contra e empresa e disse que não pretende mais comprar em lojas da rede.
Leia a nota na íntegra:
"A empresa não tolera qualquer tipo de discriminação e preconceito. Sentimos muito pelo ocorrido e estamos em contato com a cliente para entendermos sua perspectiva. Em paralelo estamos realizando uma apuração minuciosa para que possamos tomar as medidas necessárias. A empresa não se eximirá de sua responsabilidade. O respeito às pessoas e à diversidade faz parte dos nossos valores e, por isso, realizamos frequentemente treinamentos com nossos funcionários para um atendimento adequado a todos os clientes".
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