"Não venda minha escola": a luta de famílias contra lei da prefeitura de SP
"Eles vão colocar terrenos de escolas à venda. Disseram pra gente não se preocupar que nada vai acontecer, mas não temos garantia jurídica. Exigimos uma resposta", diz, com um megafone, a empregada doméstica Teresa Cristina dos Santos, 40, durante uma manifestação em frente à Secretaria Municipal de Educação em São Paulo na terça-feira (5).
Ao lado da filha, Alanna, 14 anos, e do filho da sua empregadora, ela protestou ao lado de outras mães, suas crianças, e educadores contra a sanção do projeto de lei 611/2018, de autoria da prefeitura, que autoriza a venda de 41 terrenos ociosos na cidade. O valor da venda é estimado pela Prefeitura de São Paulo em cerca de R$ 600 milhões.
Aprovado pela Câmara dos Vereadores em 16 de outubro, foi sancionada pelo prefeito Bruno Covas (PSDB) no dia 19. Dois dos terrenos tidos como ociosos abrigam escolas municipais de educação básica e ensino fundamental que atendem, juntas, cerca de 600 alunos.
Uma delas, a Professora Maria Antonieta D'Alkimin Basto, fica na Vila Olímpia, bairro da capital paulista com o título de segundo metro quadrado mais caro da cidade segundo levantamento do grupo SP Imóvel. A outra é a Gabriel Prestes, também em uma área valorizada, na rua da Consolação.
Perto do metrô Higienópolis, inaugurado em janeiro de 2018, a escola Gabriel Prestes fica ao lado de um complexo educacional da Universidade Presbiteriana Mackenzie, entidade privada sem fins lucrativos. "A escola é abraçada pelo Mackenzie. Os abacateiros e as jaqueiras no fundo estão até entortando em busca de sol por causa de um prédio alto que tapa a luz", diz a professora de italiano Juliana Torres Moreti, 41, mãe de Leonardo, 5.
O campus da universidade tem um histórico de expansão: se estabeleceu primeiro em uma chácara na rua Maria Antônia, que corta a rua da Consolação, em 1879, e foi crescendo a ponto de tomar quase todo o quarteirão. Em 1997, a escola chegou a ser fechada após sua área ter sido cedida à universidade pelo prefeito Celso Pitta (1997-2000). Em 2001, foi reaberta pelo governo de Marta Suplicy (2001-2004).
Mães, pais, professores e diretores das duas instituições criaram uma comissão para pressionar a prefeitura e a Câmara na tentativa de mudar a lei. "A secretaria [Municipal de Educação] declarou publicamente que não vão mexer nas escolas, que a gente não deveria ficar preocupado. Que bom que não vão mexer. Agora, que coloquem isso na lei", diz a atriz Andrea Zeppini Menezes da Silva, 46, mãe de Lara, 5.
Há cerca de uma semana, João Cury Neto, secretário de gabinete do prefeito, recebeu o grupo. "Ele disse que não sabia de nada e que o prefeito disse para ele que também não sabia que escolas estavam naquele pacote de terrenos [a serem vendidos]. Teria sido um erro", diz Juliana, que participou do encontro.
Procurada pela reportagem, a Secretaria Municipal de Educação respondeu, em nota, que "a Prefeitura de São Paulo afirma que as escolas não serão afetadas. Esclarece ainda que o PL é autorizativo, ou seja, todos os imóveis serão avaliados individualmente antes da alienação". Foi questionada, mais uma vez, sobre a garantia legal de que os locais não serão afetados, mas não respondeu até a publicação desta matéria.
Expectativa é que escolas saiam da lei nesta quarta
Durante a manifestação de terça-feira, o assessor parlamentar da secretaria de Educação Marcos Saraiva recebeu um grupo de dez pessoas, entre mães e educadores. Também esteve presente o vereador Celso Giannazi (PSOL), autor de um projeto de emenda a lei para que as duas escolas sejam retiradas do texto.
"Ele [Saraiva] disse que a secretaria não deve vender os terrenos. E pedimos uma posição oficial", explica Ana Cristina Rosa de Almeida, coordenadora pedagógica da escola Professora Maria Antonieta D'Alkimin Basto. Segundo a coordenadora pedagógica, Saraiva se comprometeu a falar com vereadores para que aprovem o projeto de emenda, que deve ser votado na Câmara nesta quarta-feira (6), às 15h.
Escolas não têm espaço ocioso
Caso as escolas não sejam retiradas da lei, a venda dos terrenos deve causar impacto direto sobre a vida de alunos, famílias e profissionais da educação. Mesmo que apenas parte do terreno seja vendida, as crianças perderão áreas de atividade e convivência. Se toda a área for vendida, elas serão realocadas.
"Mas, se tirá-las de lá, vão colocar onde? E, antes disso, vender esse espaço por que, se não há nada de ocioso? A questão é que não entendem nada de crianças, elas precisam de espaço para brincar", diz Andrea. "Essas escolas têm muita área verde, banco de areia, que elas usam o tempo todo."
Cabisbaixa e segurando um cartaz, a pequena Julia, 5, aluna da Gabriel Prestes, que aparece na foto no começo desta reportagem, abre um sorriso quando ouve a pergunta sobre seu lugar preferido na escola. "O parque das jaqueiras", responde —aquelas mesmas que, segundo algumas mães, estão entortando por causa do prédio alto que tampa o sol. "Só não pode cair na cabeça porque disseram que é pesada assim", diz, afastando as mãos para imitar o tamanho de uma jaca. "Eu não quero sair de lá."
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