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"Não consegui salvá-la", diz jovem que viu mãe esfaqueada pelo ex-padrasto

Genésia Maria de Souza e a filha Rafaela  - Reprodução Facebook
Genésia Maria de Souza e a filha Rafaela Imagem: Reprodução Facebook

Bruna Alves

Colaboração para Universa

12/11/2019 04h00

Era 6 de novembro quando Genésia Maria de Souza, 42, procurou a Delegacia de Defesa da Mulher de Mogi Mirim (SP) para tentar prestar queixa contra o ex-marido pela terceira e última vez. Nesse mesmo dia à noite, ela foi atacada pelo homem com um facão dentro de casa. Chegou a ser socorrida, mas morreu no dia seguinte, na Santa Casa da cidade.

Na tentativa de salvar a mãe, Rafaela Maria de Souza, 24, teve a mão decepada pelo ex-padrasto. Inicialmente, ela foi internada na UTI da Santa Casa. No domingo (10), pôde ir para o quarto do hospital. O seu estado de saúde é estável, mas ainda não há previsão de alta.

Apesar de os ferimentos estarem cicatrizando, a filha que viu a mãe morrer esfaqueada, não consegue voltar ao normal. "Não salvei a vida da minha mãe, mas na tentativa de salvar eu fiquei. E fui esfaqueada", diz Rafaela, filha da vítima, em breve conversa com Universa.

"Estou traumatizada, lesionada, sequelada. Ele vai ficar na minha memória como um monstro. Um monstro que destruiu a minha família, que matou a minha mãe. Palavra nenhuma pode aliviar a minha dor."

O ex-marido de Genésia, Juarez Ferreira, 44, foi preso um dia depois de cometer o crime. Ele havia fugido do local após esfaquear mãe e filha, mas foi encontrado pela polícia na casa de familiares, em Jacutinga (MG). Segundo a Polícia Civil, ele confessou o crime. O caso foi registrado como tentativa e feminicídio consumado.

Genésia foi casada com Ferreira durante oito anos. No começo, o relacionamento ia bem, mas, com o passar do tempo, as coisas mudaram. Mãe de quatro filhos —uma jovem de 24 anos, um rapaz de 20, uma menina de 15 e um bebê que irá completar dois anos no mês que vem—, a mulher não escondia o amor que tinha por eles. Mas o marido, pai somente do filho mais novo, não aceitava a relação da mulher com os filhos mais velhos.

"Ele sempre foi um cara seco e muito ignorante. Tinha muito ciúme dos filhos dela e falava que ela só trabalhava para sustentar os filhos. Ele não gostava deles, mas ela sempre defendia os filhos. Sempre cuidou deles e não deixava faltar nada", diz a nora da vítima, Thaís de Fátima Patrício, casada com Lucas, filho de Genésia.

Calma e persistente, Genésia economizava o máximo que podia e era querida na região onde morava. Trabalhou como manicure, doméstica, cozinheira e teve uma barraca de lanches. Dessa forma, ajudou a construir três casas, uma para cada um de seus filhos mais velhos.

Recentemente, vendia pão de porta em porta. "Ela vendia o pão de dia para comer o dela à noite. No final de ano, ela ia para a praia vender água e refrigerante. Ela nunca parou. Era muito honesta e sempre trabalhou", diz Thaís.

Casamento marcado por ciúmes

Os últimos anos de casamento foram marcados por brigas e desavenças. Segundo a nora da vítima, os três filhos sempre pediam à mãe que se separasse do marido.

"Nenhum gostava do Juarez por causa do jeito que ele a tratava. Eu lembro até hoje que, quando ela estava grávida, ele começou a humilhá-la falando que mulher grávida era muito feio, que não prestava para nada", diz Thaís.

Apesar das brigas constantes, a nora conta que ninguém suspeitou que ele pudesse chegar ao ponto de matar a mulher. "Eles brigavam muito e discutiam feio, mas ele nunca chegou a ficar agressivo dessa forma."

O cenário mudou no mês passado. Juarez, dono de um bar na cidade, teve uma briga com a mulher no comércio.

"Ele agrediu Genésia na frente das pessoas. Ela ficou muito envergonhada com a situação e não quis mais. Foi aí que ela separou dele", explica Thaís.

Desde então, o homem começou a mandar mensagens por áudio no celular, ameaçando a mulher caso ela não reatasse o relacionamento.

"A raiva dele é que ela não quis mais voltar e preferiu ficar na casa dos filhos. Ele achava que ela amava mais os filhos do que ele", diz a nora.

Por três vezes, polícia negou pedido de medida protetiva

Genésia decidiu procurar a Delegacia de Defesa da Mulher para pedir uma medida protetiva contra o ex-marido, mas por três vezes teve o pedido negado. Segundo a família, a delegacia sequer registrou um boletim de ocorrência.

"A primeira vez em que ela foi à delegacia, pediram que levasse mais documentos. A segunda vez, que ela gravasse um CD com os áudios dele a ameaçando. E a terceira, quando ela levou tudo, que foi no dia do acontecido, eles pediram que ela escrevesse em um papel", detalha Thaís.

Questionada sobre as tentativas da mulher em registrar queixa contra o ex-marido, a Secretaria de Segurança Pública (SSP) confirmou que Genésia esteve na delegacia na última quarta-feira (6), dia em que foi atacada.

"A vítima compareceu à unidade e foi orientada sobre procedimentos legais que poderiam ser adotados. A corregedoria da Polícia Civil está à disposição da família para registrar denúncia sobre o serviço prestado."

Mas o órgão não explicou por que a mulher não conseguiu fazer a denúncia e disse que haverá uma investigação interna para apurar o que aconteceu.

O crime

Recém-saída da UTI, a filha da vítima, que também foi atacada pelo homem e teve a mão decepada, lembra claramente do que aconteceu naquele dia.

"Ele parou o carro na frente da minha casa, e eu fui tentar conversar com ele para controlá-lo. Mas, nisso, ele já me deu vários golpes de facão. E o facão estava muito, muito amolado", diz Rafaela.

A jovem afirmou a Universa que não correu quando viu Juarez com o facão na mão porque sabia o que ele iria fazer com sua mãe. "Eu não podia correr, a minha mãe estaria lá. Não salvei a vida da minha mãe, mas na tentativa de salvar eu fiquei. Eu corri depois que ele me esfaqueou e já estava muito ensanguentada", conta a filha. Mesmo com a mão decepada, a jovem conseguiu correr e pedir ajuda de um vizinho.

O suspeito teve a prisão temporária concedida pela Justiça e vai responder por tentativa de feminicídio e feminicídio.

"Esperamos que a justiça seja feita com esse monstro, já que não quiseram fazer antes para defender uma mulher guerreira. Quando a Rafaela sair do hospital, vamos fazer cartazes e sair na rua gritando: 'Justiça! Diga não ao feminicídio! Somos todos Genésia", diz Thaís.