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"Era ele quem me dava autoestima", diz mãe de jovem morto por R$ 10 na BA

Arquivo Pessoal
Imagem: Arquivo Pessoal

Carlos Madeiro

Colaboração para Universa

14/11/2019 04h00Atualizada em 18/11/2019 16h02

Na madrugada do último dia 1º, Rodrigo Santos, 23, bebia cerveja com um amigo num bar na periferia de Salvador quando um homem o atacou com uma faca. Segundo relatos, o agressor era conhecido no bairro por ser homofóbico. O caso ocorreu pouco tempo depois de o suspeito tomar uma cerveja paga pela vítima e ter ouvido um "não" após pedir R$ 10.

Rodrigo era gay e muito querido na comunidade onde vivia. O suspeito, um integrante de uma facção local chamada "Tudo 5". Uma semana antes de matar Rodrigo, ele agrediu a pedradas outro gay da comunidade. Moradores contam que ele buscava reforçar a masculinidade com ataques contra homossexuais.

Logo após o crime, o suspeito fugiu da comunidade e apagou suas redes sociais. Em seu antigo Facebook, ele exibia uma personalidade violenta. Numa das fotos, faz gesto de arma com a mão. Em outra, aparece soltando fumaça no rosto da mãe.

Rodrigo foi socorrido com vida e ficou internado no Hospital do Subúrbio, em Salvador, por seis dias. "Ele levou uma facada só, mas foi no pescoço e cortou a veia que bombeia o sangue do coração para o cérebro. Ele não resistiu", conta a mãe de Rodrigo, a costureira Giovani Maria Abreu dos Santos, 39.

O crime, que ocorreu em um bar no bairro Fazenda Coutos, conhecido como Iraque, causou grande repercussão. No dia do enterro, houve protesto capitaneado por amigos e pessoas próximas.

Procurada, a Polícia Civil da Bahia informou que não poderia dar detalhes sobre o caso para não atrapalhar as investigações. Por causa disso, Universa optou por não revelar a identidade do suspeito —mas as autoridades já têm nome, endereço e fotos dele.

O caso está sendo acompanhado pelo Grupo Gay da Bahia, que cobra justiça. "Nos unimos de coração destroçado a essa família nesse momento de dor insuportável, quando se perde um ente querido por ato fútil e brutal como este", disse Marcelo Cerqueira, presidente do grupo, em texto em homenagem a Rodrigo.

Dinheiro negado

No momento do crime, Rodrigo estava com o amigo, o ajudante de cozinha Eric David, 21. Ele contou que estavam voltando para casa quando decidiram tomar uma cerveja. "Era só uma, mas acabamos tomando nove", lembra.

"Quando a gente abriu a segunda garrafa, veio esse elemento e pediu um litrão. Prontamente, por educação — porque não tínhamos obrigação — demos o litrão. Depois, quando a gente foi ao banheiro, ele me pediu R$ 10. Falei que não tinha, e Rodrigo disse que a gente não ia dar porque não tinha obrigação. Foi quando ele falou: 'É o quê? Não estou falando com você, seu viadinho'", conta.

Após trocarem ofensas, Eric diz ter pedido para o suspeito sair do bar. A facada ocorreu no momento em que iam deixar o local, diz. "Quando a gente foi pagar a conta, tinha uma vizinha no balcão. Quando falei a ela que íamos embora, ela encheu o meu copo e o de Rodrigo. Após pagar a conta e tirar o cartão da maquininha, Rodrigo foi colocar o cartão dentro da minha bolsa, atrás de mim. Foi quando uma menina que estava de frente gritou: 'meu Deus!'", diz.

Eric ainda lembra do pedido de socorro do amigo. "Quando olhei, Rodrigo disse 'me ajuda!' Aí o desgraçado correu com a faca na mão. Eu quebrei duas garrafas e corri atrás dele. Um amigo dele me puxou pela camisa e outro me segurou com uma barra de ferro enquanto ele fugia", conta.

Após a morte de Rodrigo, Eric prestou depoimento ao DHPP (Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa), e apontou quem seria o assassino. "Estava sendo coagido, sou a testemunha-chave, um arquivo vivo, querem minha cabeça. Como não tenho polícia nem dinheiro para pagar segurança, estou corrido", afirma.

"Ele era tudo", diz mãe

A mãe de Rodrigo morava com ele e com os outros dois filhos, de 4 e 21 anos. Para ajudar no sustento da casa, ele fazia unha, mas tinha curso de gastronomia e administração.

"Eu estou arrasada porque meu filho era tudo: ele me ajudava, e eu o ajudava. Era ele quem me dava autoestima. Foi uma coisa que nunca imaginei, perder meu filho de uma forma dessa, um menino novo. É muito doloroso", conta Giovani Maria.

Ela diz que Rodrigo nunca teve desentendimentos. "Era ele [o suspeito] que sempre implicava com os homossexuais. Ele que tinha implicância com meu filho, isso vinha de muito tempo", conta.

O amigo Eric confirma a versão da mãe de Rodrigo e diz que ele havia acostumado a sofrer com o preconceito. "Ele era a única pessoa que me dava suporte, que me chamava pra sair", lembra.