O colo do meu útero no espelho: como é a consulta com ginecologista natural
"Olha ali o colo do seu útero! Está vendo?", me pergunta a doutora enquanto eu, sentada na maca, me curvava para a frente e segurava, com a mão direita, um espelhinho entre as minhas pernas que refletia minha vulva e meu canal vaginal aberto por um espéculo.
"Er... Na verdade, não", respondo. "Então se curva um pouco mais pra frente e ajeita a lanterna", orienta a ginecologista natural Débora Rosa.
Pego na mão da médica para que a lanterna jogue luz suficiente na cavidade. "Ah!", grito, emocionada, assim que vejo o orifício do colo do meu útero. Conhecer o próprio corpo, para mim, é realmente emocionante.
Nos exames preventivos que fiz até hoje, como costuma acontecer com a maioria das mulheres que conheço, eu ficava deitada com as pernas abertas, vestindo um avental hospitalar, sem conseguir ver o que estava acontecendo durante o exame, já que o avental tapava a minha visão. Não via nada, mas sentia o desconforto da pressão do espéculo nas paredes vaginais.
A consulta com uma ginecologista natural parte de outro princípio: quem está no comando não é o médico, mas a paciente. No exame preventivo com Débora, eu mesma coloco o espéculo de plástico transparente e rígido, abro, viro uma espécie de parafuso na lateral da engenhoca e, com o espelhinho na mão, observo tudo o que acontece. Ela usa uma escovinha e uma espátula para retirar a secreção, passa numa placa de vidro específica para a análise do material e coloca numa caixinha de papel. A caixa quem tem que levar ao laboratório também sou eu.
Débora é médica ginecologista, formada há 11 anos pela UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), fitoterapeuta, especialista em parto ecológico e ginecologia natural com 22 cursos na área no currículo. Também é ginecologista da UFF (Universidade Federal Fluminense) e cirurgiã ginecológica no Hospital Hugo Braga, no Rio. Em São Paulo, onde foi a consulta, começou a entender esporadicamente desde novembro. Ela também dá dicas sobre o assunto no perfil @ginecologistanatural, no Instagram, que hoje tem 22 mil seguidores.
"A ginecologia natural associa conhecimentos riquíssimos aos estudos científicos", afirma Débora. "Brinco que é a ancestralidade contemporânea. Ela existiu quando as mulheres tinham conexão com a natureza. Teve um período de desconexão grande com a pílula anticoncepcional nos anos 1960. Se manteve viva com parteiras e curandeiras e, há poucos anos, surgiu como um resgate da forma natural de se cuidar."
A ideia é que a profissional possa passar as informações para a mulher de maneira ampla, falando sobre questões comportamentais e mentais, não apenas sobre doenças pontuais. Assim, cada uma, munida de conhecimento, conhece e lida com seu corpo da maneira que achar mais conveniente, incluindo a decisão de não fazer os exames preventivos anualmente: segundo uma publicação do Ministério da Saúde que a médica me mostrou durante a consulta, a orientação oficial é fazê-los a cada três anos, após dois seguidos com resultado normal.
Há outra diferença crucial entre uma consulta como essa em relação à consulta ginecológica tradicional: em vez de receitar remédios —ou, o que é mais comum, pílula anticoncepcional— para curar alguma condição ou doença, a ginecologista natural recomenda chás, ervas, plantas e óleos essenciais. Mas vamos começar falando de menstruação.
Vamos falar de sangue
Antes de colher o material para o exame papanicolau, converso com a médica durante 40 minutos. Ela me pergunta como é meu ciclo, se tenho algum problema para relatar, alguma dor ou doença para tratar. Como não tenho nenhuma queixa, me atenho às dúvidas básicas: TPM —fico extremamente irritada nessa época—-, menstruação, higiene e métodos anticoncepcionais.
O que entendemos como tensão pré-menstrual, para Débora, tem outro significado: TPM é "tempo para mim". "É um momento de introspecção e autoanálise, em que sentimentos e coisas que já temos em nós afloram", diz. "Então, quando uma mulher diz que vira outra pessoa nesse período, na verdade está mostrando seu verdadeiro eu."
Segundo ela, a tensão pré-menstrual nos deixa mais introspectivas e, antigamente, esse era o momento em que mulheres se reuniam e se isolavam por alguns dias. Faz sentido: é comum ouvir mulheres dizendo —e eu mesma costumo dizer— que não têm vontade de sair de casa nessa época.
Ao falar de sangramento, Débora me mostra algumas alternativas ao tradicional absorvente de algodão. Eu, que já uso a calcinha menstrual, aprendo sobre o uso do coletor e dos absorventes de pano. Os descartáveis, que a gente compra no mercado, não são só pouco saudáveis, diz a médica —podem causar alergias e alterar o pH vaginal—, mas seriam também um aviso constante de que mulheres são sujas e fedidas.
"O absorvente tradicional é alvejado para ficar bem branco e com a aparência de limpo. O que está dizendo? Que é o sangue que suja, pois mulheres são sujas. E quando neutraliza odores? Que o sangue fede. Não faz o menor sentido: esse sangue iria alimentar uma criança numa possível gravidez", diz Débora.
Segundo a ginecologista, a menstruação ainda tem outra utilidade: regar as plantas. No meu caso, sugeriu encharcar a calcinha menstrual de água depois de usá-la e aproveitar o sangue diluído na rega. "Doutora, não sei se acredito nessas coisas", respondo, cética e sincera. "Tenta. As plantas realmente ficam mais vivas."
Passada a menstruação, seguindo a teoria da ginecologia natural, vem a fase solar, com a pré-ovulação e a ovulação. "Esse é o momento do ciclo em que ficamos mais produtivas", diz a médica. "Então, a ideia é que, na fase lunar do ciclo menstrual, a gente pense e reflita. E, na solar, execute."
Pílula jamais: tratamentos são com chás, plantas e óleos essenciais
Débora me explica que não receita pílula como método anticoncepcional. "Hormônios aumentam as chances de doenças graves como câncer de mama, trombose, derrame, infarto e depressão. Além disso, a mulher fica com a mesma taxa hormonal todos os dias, diferentemente da fisiologia natural, que muda. Isso a impede de conhecer e sentir as mudanças ao longo do ciclo", me explica.
Conversamos sobre métodos contraceptivos alternativos. Digo que opto pela camisinha masculina, mais fácil, prática e barata. Ela fala da camisinha feminina e me mostra uma espécie de canal vaginal de pelúcia com uma dessas dentro. Pede para eu colocar o dedo. Acho estranho: é como se ficasse meio solta e fosse friccionar as paredes vaginais. Não há vantagens nem desvantagens: é só mais uma opção.
Depois da consulta, converso com uma amiga que tem ovários policísticos e toma pílula para tratar o problema: "De que outra maneira poderia ser?", ela pergunta. Com a dúvida na cabeça, procuro novamente a médica. "Para ovários policísticos, se tiver irregularidade menstrual, receito uma planta emenagoga", diz a médica, referindo-se a plantas que, segundo ela, estimulam o fluxo sanguíneo na região pélvica, como artemísia, angélica e vitex. "Associo com uma planta anti-inflamatória [como dente-de-leão e tansagem]. Para endometriose entro com plantas anti-inflamatórias e analgésicas", explica.
Podem ser usadas, por exemplo, como chás e em vaporizações. Óleos essenciais, que podem ser passados na pelve, são mais uma possibilidade.
"A ginecologia convencional trata tudo com pílula. Se tem doença, usa pílula. Se não tem doença, também usa, para evitar filho. O leque de tratamentos é bem menor. Quando se abre para os naturais, as opções se ampliam."
Sai o papel higiênico, entra a toalhinha
Outra orientação da médica é que as mulheres não usem papel higiênico para evitar que fiquem resquícios na área. O indicado por ela é lavar a região com água e secar com uma toalha pequena, que depois deve ser pendurada no varal. Ok, mas no trabalho essa seria uma prática quase impossível de realizar. Então, tente, pelo menos, fazer isso em casa. Mas, se for usar papel higiênico, não limpe de trás para a frente, para não trazer microorganismos.
Para se limpar após o número dois, a indicação é usar sabonete feito com uma planta medicinal chamada barbatimão. No banho, na região genital, usar apenas água. Para limpar os pelos, use a espuma que o sabonete faz ao lavar o corpo. Outra indicação: evitar a calcinha sempre que for possível, para que a região possa respirar. Quando usada, a calcinha deve ser 100% de algodão, lavada no banho, com água quente e sabão de coco, e as peças devem substituídas a cada dois ou três anos. Dou risada. Faço praticamente tudo errado.
Vou aderir à ginecologia natural?
Provavelmente. O que percebi é que a ginecologista natural entende que é preciso conhecer a paciente como um todo: não é só chegar, fazer um preventivo e tchau. Falamos de humor, sentimentos, tristezas, planos, sexualidade, alimentação. O que todos os médicos poderiam fazer, mas, antes da doutora Débora, apenas uma profissional havia se importado tanto com a minha vida em 34 anos de visitas médicas.
Mas, para mim, ainda é fácil dar essa resposta: por enquanto, não vou precisar começar um tratamento. O resultado do meu exame papanicolau só ficará pronto na sexta-feira (6). Talvez tenha que voltar a respondê-la depois de ter, de fato, algo para tratar abrindo mão dos remédios convencionais.
Questionei a doutora Débora sobre outro ponto: o valor da consulta, R$ 620. Ela me explica que, no Rio de Janeiro, onde atua como ginecologista, a consulta custa R$ 440. Para vir a São Paulo, onde a encontrei, há gastos extras que ela embute no preço. "O valor das consultas médicas é elevado, como ao contratar um advogado ou fazer um projeto de arquitetura", me explica. "A consulta não dura uma hora. Para ela acontecer como acontece, ela dura 17 anos, que é o tempo total que já estudei para oferecer o melhor."
Ao final da consulta, a médica me dá o espéculo de plástico, para que eu possa me autoexaminar com um espelhinho em casa da mesma maneira como fizemos no consultório. Sugere que use óleo de coco no procedimento para que o espéculo deslize. E me orienta a fazer vaporização uterina com barbatimão. Ainda sou um pouco cética em relação à medicina natural, mas fiquei extremamente curiosa.
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