Piada com gay, mulher sobrecarregada e outras coisas pra evitar nas festas
Casa decorada com capricho especialmente para a ocasião, mesa posta com os melhores talheres e louças, comida e bebida fartas, uma pilha de presentes sob a árvore enfeitada, pessoas se abraçando vestindo roupas novas e bonitas, crianças fazendo bagunça pelos corredores... Típico cartão natalino, não é mesmo? Pena que é comum que certos parentes e amigos aproveitem o momento familiar de fim de ano para xeretar a vida alheia, alfinetar o outro ou simplesmente encher o saco por puro prazer. E aí o que era para ser uma noite festiva pode acabar em ressentimento, troca de farpas e até briga.
Por promoverem o reencontro entre pessoas que não costumam se ver regularmente, essas ocasiões funcionam como uma espécie de catarse que traz à tona questões mal resolvidas como invejas, disputas, competições e até mágoas e desavenças antigas. E mais: como a época de fim de ano é propícia para um balanço de metas, quem não conseguiu o que pretendia tende a projetar as próprias frustrações nos demais. Daí surgem as perguntas indiscretas que, na maior parte das vezes, sequer dizem respeito a quem as escuta, mas ao ponto fraco do próprio interlocutor.
A atitude de extravasar recalques nem sempre é consciente, mas não é por conta disso que deve ser tolerada. Da mesma maneira, o incômodo com comentários absurdos, desnecessários, pejorativos ou preconceituosos precisa ser pontuado. O ideal é que cada um dos presentes entenda o real sentido das festas - a confraternização - e deixem de lado picuinhas e situações embaraçosas, como as listadas a seguir:
Perguntas indiscretas e intrometidas
Um exemplo é a clássica "e os namoradinhos?". Variações: "E o casório, sai ou não sai?" ou "Vai engravidar quando?". Lembre-se que o "ciclo da vida" - casamentos, nascimentos, mortes - é algo que ajuda a organizar a história das famílias. Portanto, é comum que as pessoas mais velhas tenham curiosidade a respeito desses assuntos. É claro, porém, que há quem faça questão dessas perguntas apenas para atiçar vulnerabilidades. Demonstrar irritação pode encorajar o bullying, então talvez seja o caso de apelar para ironias do tipo "Engravidar? Ah, a gente está treinando muuuuito!!!", que não revela suas reais intenções, mas pode provocar desde risadas até um leve constrangimento.
Comentários sobre a forma física e/ou a idade das pessoas
Pessoas engordam, emagrecem, envelhecem - e ninguém tem nada a ver com isso. Se for para proferir um comentário que não acrescenta nada, melhor manter a boca fechada. Ninguém precisa ouvir: "Nossa, como você está abatida/cansada/gorda/seca". As pessoas sabem quem são e como estão, quem não conhece as lutas e dores delas são os outros. Diante de alguma observação desnecessária e sem propósito, uma maneira de desarmar quem diz é retrucar "Obrigada por reparar" e mudar o rumo da conversa.
Mulheres se matando para fazer a ceia e montar a decoração, homens enchendo a cara e jogando conversa fora
Estamos às portas de 2020, em pleno século XXI, e há quem ainda espere que as mulheres encarnem a função de "rainha do lar" e passem a véspera de Natal e Ano Novo diante do fogão, preparando a ceia, enquanto os homens da família aguardam a refeição tomando cerveja e papeando. Alguns ainda têm a pachorra de reclamar que a comida está demorando para ficar pronta. Nenhum lava a louça depois. Esse tipo de cena lhe parece familiar? Pois já passou a hora de mudar isso. Ser colaborativo deve ser um posicionamento na vida de todos nós, tem a ver com caráter. Se ninguém se dispõem a colaborar, vale a pena cogitar uma divisão de tarefas justa e equilibrada ANTES de os preparativos começarem.
Piadinhas e ironias sobre gays, negros e outras minorias
Piadas de fundo preconceituoso são de extremo mau gosto e, num mundo em que, apesar da onda conservadora, valoriza cada vez mais o respeito à diversidade e à diferença, ouvir sem rebater é praticamente impossível. O único modo de acabar com tal comportamento é cortando esse tipo de comentário, deixando bem claro que a atitude não deve ser mais tolerada - em nenhuma época do ano, aliás.
Tratamento diferente para os meninos e as meninas da família
A diferença, em muitas famílias, já começa no "figurino": as meninas, em geral, são produzidas de forma muito mais pomposa do que os meninos. A mensagem é clara: enquanto a camiseta e a bermuda deles permite brincar com liberdade, os vestidos engomados e os laços das garotas restringem os movimentos. Afinal, espera-se que elas saibam se comportar como "mocinhas". Outro ponto a lembrar é que, em muitos lares, as meninas são convocadas a ajudar em certas tarefas da ceia, como colocar pratos e talheres na mesa, enquanto os garotos têm liberdade para brincar e correr pela casa o quanto quiserem. Definitivamente, esse tipo de coisa precisa acabar.
Críticas sobre a maneira de alguém criar/educar os filhos
Parentes e amigos chegados da família mais velhos costumam se escandalizar com a maneira mais informal com que pais e filhos interagem hoje em dia. Daí para olhar feio e soltar resmungos como "no meu tempo, criança não respondia assim, não!" é um passo. O choque de gerações sempre fica mais evidente quando se trata da criação de filhos. Não são poucas as pessoas mais velhas que ainda acham que o seu jeito de educar e interagir é que era o correto, o sensato. Como a probabilidade de você agir da mesma forma daqui a alguns anos é grande, respire fundo e devolva: "De que ano, mesmo, você está falando? Ah, tá, quatro décadas atrás! É, realmente naquela época as crianças não eram tão espertas!". Fim.
Ressuscitação de histórias constrangedoras que ninguém tolera mais ouvir
"Lembra daquela vez em que você..." é a típica frase que sempre é dita naquele momento mágico pós-ceia em que todo mundo já se fartou, o efeito etílico está a mil e ninguém tem coragem sequer de levantar da mesa. Começa, então, o momento flashback da família. Quando alguém olha para você e inicia essa frase, prepare-se: lá vem uma história ridícula ou constrangedora a seu respeito. Parentes, em geral, amam esse tipo de bullying coletivo, principalmente se o alvo da chacota estiver acompanhado. O melhor a fazer o feitiço virar contra o feiticeiro. Lance "Ah, não lembro direito, não... Mas nunca me esqueço quando você..." e jogue a história escabrosa no ventilador.
Farpas disfarçadas de perguntas ou comentários a respeito da vida profissional e financeira de alguém
"Em que você trabalha, mesmo?" é uma pergunta ardilosa, conforme quem a faz. Pode ser curiosidade genuína ou puro esquecimento, claro, pois vivemos uma época em que funções e carreiras se reinventam ou surgem a todo instante. Entretanto, dependendo do tom, também trata-se de uma maneira venenosa de desqualificar o outro. Seja qual for o caso, respire fundo e responda. Em detalhes. Você pode ouvir, de volta, algo como "E isso dá dinheiro?". "O suficiente" é a resposta ideal. E quem perguntou que conclua o que quiser. Não se irrite.
Zoação com a masculinidade de algum homem só porque ele divide tarefas com a mulher
Numa sociedade patriarcal ainda permeada por machismo e preconceitos como a nossa, é comum encontrar - ainda mais entre os parentes mais velhos - gente que acha que o papel do homem é prover e o da mulher consiste em cuidar das tarefas domésticas e dos filhos. Por isso, um sujeito que troca uma fralda, dá uma mamadeira ou coloca uma criança para dormir é visto como um verdadeiro extraterrestre que, justamente por ser "diferente", vira a mira de risos, gozações e apelidos pejorativos, como "pau mandado". Talvez seja uma boa oportunidade para pontuar sobre o fato de que quem costuma se incomodar com a masculinidade alheia é porque provavelmente se sente mal resolvido com a própria...
Fiscalização do prato de comida alheia
As pessoas têm o direito de adotarem o estilo de alimentação que desejarem e de serem respeitadas por isso. Não há nada mais grosseiro do que ficar dando pitaco enquanto alguém se serve ou se meter em um assunto que não muda em nada a vida do intrometido. Pior ainda são aqueles parentes que ficam soltando piadinhas sobre a quantidade de comida que você vai comer, com questionamentos do tipo "Nossa, você vai mesmo colocar tudo isso no prato".
Resposta curta e grossa: "Vou, mas pode ficar tranquilo que ainda vai sobrar muito pra você." Sorrindo, sempre.
Fontes: Ellen Moraes Senra, psicóloga especialista em terapia cognitivo-comportamental, do Rio de
Janeiro (RJ); Mônica Bayeh, psicóloga clínica e psicoterapeuta do Rio de Janeiro (RJ); Rejane Sbrissa, psicóloga clínica, de São Paulo (SP), e Suely Buriasco, mediadora de conflitos e coach, de São Paulo (SP)
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