Criada em favela, jovem lidera ONG com apoio da Unesco e Carolina Herrera
"Qual é o seu maior sonho?". Essa é a primeira pergunta que a empreendedora social Amanda Oliveira, de 30 anos, faz quando uma menina ou menino chega ao Instituto As Valquírias, projeto premiado que comanda há pouco mais de uma década e que atende crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade social em São José do Rio Preto, no interior de São Paulo.
Filha de uma cozinheira e de um jardineiro, a jovem que nasceu na favela Vila União, na capital paulista, não tinha perspectivas de um futuro diferente daquele que encontrava nas vielas do lugar onde nasceu e morou durante a infância. Presenciar cenas do tráfico de drogas e de prostituição era comum naquele ambiente.
Aos três meses, ela teve o rosto queimado em um acidente doméstico. As cicatrizes que carrega desde então foram razão para bullying nas escolas por onde passou e onde sempre era alvo de piadas e apelidos colocados pelos colegas.
"Eles me chamavam de bruxa e falavam que eu era a menina mais feia da escola. Durante anos fiquei sem sair para o intervalo para não ter que enfrentar esses apelidos. Até na sala de aula eu não podia fazer perguntas para a professora porque era alvo de risadas", lembra Amanda.
E as dificuldades não paravam aí. Sem condições financeiras para garantir uma alimentação adequada para a família, a mãe de Amanda muitas vezes fazia apenas uma refeição diária para que ela e suas duas irmãs mais velhas pudessem comer duas vezes no mesmo dia.
"Sempre que chovia, a água levava nosso barraco e as poucas coisas que tínhamos. Perdemos tudo várias vezes. A imagem que tenho da minha infância na favela é a de eu e minhas irmãs brincando naquela água que passava entre os barracos que, na verdade, era um lixão a céu aberto."
A vida da jovem começou a mudar já adolescente quando a família se mudou para São José do Rio Preto. A mãe dela acreditava que no interior as coisas seriam melhores —e foram.
Nessa época Amanda entrou para um projeto social que atendia meninos e meninas no contraturno escolar. Lá todos aprendiam a tocar instrumentos musicais. Logo a jovem se tornou líder do grupo e passou a comandar a iniciativa.
"A professora que coordenava os trabalhos se mudou para outro país, então pediram para eu conduzir o projeto. Como ele mudou a minha vida, eu sabia que precisava continuar para ajudar a mudar a vida de outras pessoas também", diz.
Atualmente, o Instituto As Valquírias atende 1.139 pessoas, entre crianças a partir de três anos, adolescentes e adultos sem limite de idade. Instalado na periferia da cidade, o projeto oferece aulas de cultura, empatia, empreendedorismo e conscientização social e cursos profissionalizantes, além de acompanhamento social e de saúde. O objetivo é orientar e dar oportunidades a crianças e seus familiares que vivem em situação de vulnerabilidade social.
Em 2013, o projeto ganhou apoio da Unesco. Com a verba, foi possível comprar novos equipamentos musicais para a banda do projeto, formada só por meninas. Amanda recebeu o prêmio Mulheres pela Paz alusivo à ONU e foi nomeada pela revista Forbes, em 2018, como uma das jovens brasileiras que se destacam com menos de 30 anos.
No ano passado, o Instituto As Valquírias foi escolhido para receber aporte financeiro da marca Carolina Herrera por trabalhar o empoderamento feminino desde a infância em meninas em situação de vulnerabilidade social.
"Um dia, quando eu tinha 12 anos, eu estava chateada por causa da minha cicatriz no rosto e minha mãe me disse que eu era diferente, que eu havia nascido para não ser iguais aos demais. Quando eu entendi isso, passei a fazer a diferença na minha vida e também na de outras pessoas."
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