Terapia de casal: será que meu parceiro e eu precisamos fazer?
Nenhum relacionamento amoroso é igual ao outro. Por isso, na hora de buscar o apoio de uma terapia para resolver dilemas e acertar diferenças, os envolvidos podem ter problemas, expectativas e resultados distintos. Porém, de modo geral, há uma série de fatores que podem servir como motivação para qualquer casal se dispor a compartilhar seus conflitos com um especialista.
"A terapia sempre valerá a pena quando o par começar a experimentar a sensação de insatisfação na convivência a dois", diz o psicólogo Yuri Busin, diretor do CASME (Centro de Atenção à Saúde Mental Equilíbrio), em São Paulo (SP). "As relações precisam de manutenção e construção eterna. Casar não significa que tudo ficará bem para sempre e que as pessoas devem se acomodar", completa.
De acordo com a psicoterapeuta Carmen Cerqueira Cesar, homens e mulheres podem decidir por uma terapia de casal quando existe um mal-estar entre os dois ou se percebem que, por algum motivo, o vínculo se tornou tenso ou desconfortável, gerando sentimentos de tristeza, distanciamento e até agressividade.
"Geralmente está presente uma sensação de perda de algo que existia e era bom e que, aparentemente, não existe mais", comenta.
Ainda conforme Carmen, que atende casais há mais de 30 anos em seu consultório na capital paulista, muitos chegam à terapia exaustos pelas discussões intermináveis e sem resultados, enquanto outros ainda se amam, mas não conseguem ficar juntos e viver bem.
"O diálogo se tornou impossível, um não escuta mais o outro. As conversas são carregadas de críticas e acusações. A irritabilidade, a raiva e a falta de paciência permeiam a relação. O casal se afasta, a cumplicidade se perde e a sensação de solidão é imensa. Com o passar do tempo, sentem-se exaustos e impotentes. Muitos pensam em jogar a toalha", conta.
Não é preciso chegar a esse nível tóxico para buscar ajuda, pois a terapia de casal é um recurso que pode - aliás, deve - ser usado antes de a relação começar a se deteriorar e culminar numa separação desgastante.
"O quanto antes as sessões começarem, melhor. O fato de o terapeuta mediar o diálogo facilita a identificação e o entendimento de questões a trabalhar, da origem dos conflitos e de comportamentos que devem ser modelados", justifica Triana Portal, psicóloga clínica e terapeuta de casal, de São Paulo (SP).
É válido ressaltar que os resultados não são imediatos: trata-se de um processo muitas vezes complexo, doloroso e que pode levar tempo.
"Se o casal só busca ajuda quando a situação está grave, é mais difícil reverter os danos. A possibilidade de adesão ao tratamento em meio ao desgaste e à animosidade excessiva é menor e a energia e a disposição para cuidar da relação podem ter se esvaído", observa Triana.
A terapia de casal trabalha o tipo e a qualidade do vínculo entre os parceiros e a história da relação com a proposta de evidenciar a dinâmica emocional que os une, revelando as expectativas e os ideais (realistas ou ilusórios) de cada um bem como suas frustrações. "Por esse motivo, também pode ser utilizada preventivamente para aqueles que têm vontade de melhorar a relação e evitar problemas futuros", pontua Carmen.
Quebra da lealdade é questão mais comum
Entre as principais demandas que os casais costumam levar ao consultório do terapeuta, a mais recorrente é a quebra da lealdade/fidelidade (amorosa ou financeira), que produz um desmantelamento do ideal amoroso.
"Há uma decepção com o outro. Muitos casais querem saber como fazer para resgatar a confiança perdida e descobrir se é possível perdoar e seguir em frente. São questões que costumam vir acompanhadas de fortes emoções de raiva, ressentimento, medo e insegurança. A traição, seja ela de que ordem for, costuma trazer consigo a sensação de perda da cumplicidade e dos objetivos em comum", explica Carmen.
Um problema constante é o descompasso na vida sexual, muitas vezes apresentando ausência de desejo sexual por parte de um dos parceiros. A dificuldade de um dos dois para lidar com dinheiro ou as maneiras distintas de administrarem a vida financeira também entram no rol de assuntos a resolver, assim como o uso abusivo de álcool e drogas.
Outra questão relevante, para Raquel Fernandes Marques, psicóloga da Clínica Anime, em São Paulo (SP), é que a história pessoal e familiar de cada indivíduo também traz aspectos que se misturam e interferem na vida a dois. "Existem momentos em que essas questões individuais podem estar interferindo na interação do casal. Por isso, um dos propósitos também é aprender a colocar limites na família", diz Raquel, que ressalta ainda que certas transições relativas a filhos, como a chegada de um bebê, passagem da infância para a adolescência e partida de casa são tópicos assíduos nos consultórios.
Ao longo das sessões ficam claras as emoções em jogo, como ciúme, agressividade, possessividade, dependência... E isso é ótimo, pois o casal tem a chance de aprender a lidar com elas. Além disso, a terapia pode revelar como as fantasias inconscientes determinam os papéis e revelam o lugar ocupado por cada um na relação.
É um tratamento completo de autoconhecimento do casal. "Os dois vão perceber que falar sobre os problemas para um profissional é completamente diferente de quando fazem isso sozinhos. Apesar de expor conflitos, mágoas e tirar a sujeira debaixo do tapete, a terapia conjunta proporciona um alívio enorme, pois organiza os sentimentos e mobiliza o casal para a ação.
O terapeuta é capaz de identificar a raiz do problema, pois em diversos casos as queixas não correspondem à realidade", conta Triana. Outro benefício é a oportunidade de detectar que, eventualmente, algum dos parceiros precisa se aprofundar em alguma questão específica sua e encaminhá-lo para algumas sessões "solo" ou uma terapia individual.
Psicólogo não toma partido nem conserta ninguém
Segundo Yuri, infelizmente as pessoas ainda são reféns de muitos tabus e preconceitos em relação ao tema. "Os principais são acreditar, erroneamente, que o psicólogo irá tomar partido de alguém ou que irá 'consertar' tudo aquilo que há de 'errado' no par. Muitos querem ir para a terapia buscando um aliado para validar suas queixas, mas o papel do profissional não é esse. Ele é neutro, um mediador. O terapeuta não decide nada, só auxilia na comunicação", afirma Triana.
Para Raquel, muitas pessoas têm resistência à terapia de casal porque ela, em geral, surge em função de conflitos. "Na terapia individual cada um apresenta só sua versão dos fatos. Na de casal, entretanto, essa visão pode ser contestada pelo outro, gerando confronto. E também é bem comum que um dos parceiros não esteja disposto a se expor ou investir na relação, enquanto o outro está", afirma. Se só um quer, não é possível encarar a experiência porque terapia não funciona se feita a contragosto.
Já Carmen percebe que muita gente ainda enxerga a terapia de casal sob o ponto de vista do fracasso - e não é bem assim. "Iniciar as sessões não significa que a relação já acabou. Pelo contrário, há esperança. Porém, quando se inicia uma terapia de casal, não se sabe exatamente, a priori, para qual direção ela seguirá. É claro que é preciso evitar separações prematuras. O que se sabe, com certeza, é que ela caminhará para que todos tenham uma vida mais feliz, não importando se juntos ou separados", relata.
Os bons resultados vêm também pelo desmantelamento do vínculo simbiótico e pelo resgate das identidades. "Por essa razão, é claro que em alguns casos a separação é a melhor solução, pois é ela que vai trazer alívio e felicidade para ambos. Às vezes, num determinado ponto da vida, o casal passa a seguir por caminhos diferentes. A vida é dinâmica e as coisas podem mudar. Então é melhor se desvincular de uma relação infeliz e que mina forças e disponibilizar energia para investir em outras coisas, interesses ou pessoas", explica Carmen.
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