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Carlos Bolsonaro postou foto antiga de Thammy: por que isso é ofensivo?

Thammy Miranda - Reprodução/Instagram
Thammy Miranda Imagem: Reprodução/Instagram

Nathália Geraldo

De Universa

22/01/2020 04h00

Thammy Miranda foi exposto nos Stories do Instagram do vereador Carlos Bolsonaro (PSC-RJ), nesta terça-feira (21).

Ele compartilhou com 1,9 milhão de seguidores uma foto antiga de Thammy, quando o artista ainda não tinha feito sua transição de gênero — experiência que pode ser vivida por pessoas transgêneras, ou seja, quem nasceu sendo identificado com um gênero e que, com o passar do tempo, passa a se reconhecer com outro.

A publicação rendeu resposta de Gretchen ao político. "É incrível, Carlos Bolsonaro, como você é apaixonado pelo meu filho. Tá doido pra entrar na nossa família. Mas meus filhos homens estão todos casados. Só lamento", ironizou no Twitter.

Invisibilidade à identidade é "violenta", diz psicanalista

Thammy Miranda - Thammy Miranda (Reprodução/Instagram) - Thammy Miranda (Reprodução/Instagram)
Pai de primeira viagem, Thammy virou assunto no Instagram do vereador Carlos Bolsonaro
Imagem: Thammy Miranda (Reprodução/Instagram)

Por mais que Carlos Bolsonaro tenha apenas divulgado a foto, sem a adição de nenhum comentário, a situação pode ser considerada "um ataque extremamente violento às pessoas trans".

A opinião é do psicanalista Hamilton Kida, fundador do coletivo Rainbow Psicologia, grupo de terapeutas que atua com enfoque no atendimento a pessoas LGBTs.

Para Hamilton, expor a foto de uma pessoa em que sua identidade é colocada em destaque— especialmente a que já não se associa mais a ela — gera invisibilidade a quem é trans.

"A partir do momento em que você considera o Thammy como 'a' Thammy, você está falando de uma identidade que não existe. As pessoas trans que eu atendo me dizem que o nome de registro e o gênero com que nasceram não existem. Não fazem parte dela", explica.

"Quando se traz uma foto antiga do Thammy ou faz qualquer associação à Thammy, é desconsiderar que 'ela' é uma pessoa que ele já matou dentro dele, psicologicamente. É um ataque", diz o psicanalista.

O preconceito contra as pessoas trans, segundo o especialista, podem levar à disforia de gênero, transtorno psicológico em que uma pessoa pode gerar aversão ao próprio corpo, e até gerar depressão, síndrome do pânico e crises de ansiedade. "Tudo porque, além do conflito com o gênero e com o espelho, a pessoa trans pode não ser aceita socialmente".

"É como chamar Maria de João"

Mesma opinião tem a youtuber trans Thiessa Woinbackk, que fala sobre suas vivências como mulher trans, como a cirurgia de redesignação sexual, entre outros assuntos, de maneira aberta em seu canal do Youtube.

"A gente sabe que tem pessoas trans que se matam porque não aguentam mais ter uma vida vinculada a um passado. As outras acabam reforçando uma coisa que você não se identifica ou não é. Precisa ter 'muita cabeça' para lidar com isso".

Thiessa - Reprodução/Instagram - Reprodução/Instagram
Thiessa é mulher trans e fala sobre suas vivências no Youtube; para ela, pessoas precisam respeitar identidade de gênero
Imagem: Reprodução/Instagram

Ela conta que, por ter vivido em uma cidade pequena no interior de Goiás, sofreu com o preconceito de ser chamada pelo pronome "ele", com o qual não se identifica. "É horrível, parece que a pessoa está invalidando quem você é. É a mesma coisa que uma Maria, que nasceu Maria e se identifica como Maria, do nada, passar a ser chamada de João".

Thiessa pondera que fazer o tipo de publicação como a de Carlos Bolsonaro, usando uma figura pública como a de Thammy, é "colocar mais lenha na fogueira" apesar de, por outro lado, suscitar a representatividade de pessoas trans.

"A gente não pede para ninguém aceitar nada, porque, afinal, quem é alguém para aceitar algo que eu faço na minha vida. A questão é respeitar", opina. "De qualquer forma, é importante falar sobre pessoas trans, para todos entenderem que somos seres humanos e que não é nosso passado que vai ditar quem somos agora".

Pessoas trans: acolher e ser acolhido

O psicanalista Hamilton sugere que comentários e posturas transfóbicos, como chamar a pessoa pelo artigo ou pronome com o qual ela não se identifica, associá-la a fotos antigas, devem ser substituídos por uma atitude muito simples: perguntar como gostaria de ser chamada.

Já a quem precisa de apoio para lidar a identidade de gênero e seus dilemas, o especialista recomenda a busca por profissionais de saúde, não só terapeutas, que estejam preparados para abordar as questões de pessoas LGBTs, sem preconceitos.