'Adele magra' e outras: busca de fotos de famosas no Google é gordofobia
"Mariah Carey antes e depois", "Adele magra", "Alexandra Gurgel magra". A busca no Google por fotos de mulheres que passaram por ganho ou perda de peso tem em si um julgamento sobre os corpos delas que pouca gente percebe: o de associar a magreza a uma característica positiva.
A curiosidade de saber como a mulher era com quilos a menos (ou a mais) em outro momento de sua vida é bastante comum, mas problemática. Por essa razão, ao perceber que seu nome ligado à palavra "magra" era a primeira forma com que as pessoas buscavam suas referências no Google, a youtuber Alexandra Gurgel, do canal Alexandrismos, resolveu falar sobre o tema no Instagram.
Alexandra, que milita pela ideia de corpos livres e pelo combate à gordofobia, resgatou, de fato, fotos de quando era magra. Mas, como forma de alerta para quem acha que ela estava mais feliz quando tinha 30 quilos a menos.
"Minha imagem era mais aceitável e bonita para muita gente porque eu era magra, mas vivia infeliz. Só agora, 30 quilos depois, que me amo e me aceito", diz, em entrevista para Universa.
Fotos de famosas magras e a pesquisa no Google
Não é raro vermos matérias e publicações nas redes sociais em que mulheres que passaram por processos de emagrecimento— nem sempre saudáveis— registram com orgulho um "depois" mais magras. Quase sempre recebem parabéns por isso, o que esbarra na noção de autoestima feminina.
"As pessoas têm obsessão por ver fotos de mulheres e homens gordos de quando eram magros, porque rola uma curiosidade que, muitas vezes, pode vir com ódio. Porque o que se quer descobrir é se eles eram 'mais bonitos', se o corpo 'era mais interessante'", comenta Alexandra. "É uma necessidade constante de vigília do corpo alheio".
Por ter passado por transtornos alimentares, com rotina de dietas restritivas e exercícios físicos extenuantes, além de ter cultivado o sentimento de ódio ao próprio corpo por muito tempo, Alexandra conta que nos períodos em que estava magra, era infeliz.
Para ela, rever as fotos a fez pensar sobre a noção de felicidade e como deixava de lado sua saúde (física e mental) para tentar se enquadrar nos padrões estéticos.
"Na primeira vez que eu vi essas fotos, eu pensei: 'Nossa, eu me achava gorda, mas eu era magra'. Agora, eu considero tudo que vivi nessa época, em que eu ficava sem comer, tomava diurético e laxante, fazia dietas restritivas. Eu me machucava e me odiava", desabafa a youtuber, que há cinco anos se libertou desse pensamento e iniciou o processo de autoaceitação.
"Eu não tinha saúde mental nem autoestima naqueles períodos. Minha vida era só ter um corpo magro. Hoje, é muito mais do que isso".
Pressão estética e as celebridades
Estampando capas de revista e notícias na internet, famosas são o principal alvo da pressão estética. Adele, por exemplo, sofria críticas por ser gorda e, quando apareceu com quilos a menos, também foi criticada.
Mariah Carey ganhou peso em 2017— e seu corpo ficou diferente do que o que tinha no início de sua carreira— e, após ser duramente atacada nas redes sociais, fez uma cirurgia bariátrica para perder peso.
Para a nutricionista comportamental Paola Altheia, que trabalha questões como autoestima e imagem corporal, a vigilância aos corpos das mulheres e o decorrente julgamento quando elas engordam ou emagrecem podem partir de um sentimento de "traição" do público.
"As pessoas acham que as famosas não têm rugas, poros, são sempre magras. Pensam que são Barbies. Aí, quando a celebridade aparece gorda, grisalha, o público se sente traído", analisa.
Para a especialista, a pressão estética recai sempre mais para as mulheres. "Na sociedade, se espera que tenhamos as seguintes moedas de valor: a beleza, a magreza, a elegância, o bem-vestir, a atratividade; já para o homem, o que vale é que ele mantenha o dinheiro, o poder e a intelectualidade. Por isso, as pessoas se sentem à vontade, por exemplo, para criticar Mariah Carey. Nos anos 2000, ela tinha um corpo magro, com a barriga chapada à mostra em uma calça baixa e, depois, apareceu mais gorda. Se sentem no direito de dizer: 'não gostei'".
"Eu era tão bonita" e as mudanças do corpo
Por vezes, a comparação de "antes e depois" dos corpos também se aplica à vida de mulheres anônimas. É quando uma pessoa quer "ter o corpo que tinha aos 19 anos" ou, simplesmente, insiste que precisa permanecer vestindo a mesma numeração de roupas, mesmo envelhecendo e sem levar em conta as experiências de cada período da vida, questões de saúde, hormonais e outros fatores externos.
Brigar com a flutuação de peso ao longo da vida, explica a nutricionista, é uma cilada. "Uma vez uma paciente de 52 anos me mostrou uma foto dela com 19 anos e disse: 'Eu quero esse corpo'. Brinquei que com viagem no tempo ainda não trabalhava. O que quero dizer é que é preciso considerar as transformações do corpo, é natural que o manequim aumente. O que não é natural é uma mulher querer passar a vida inteira com o corpo de adolescente, especialmente se, para isso, ela vive uma rotina alimentar muito restrita".
Alexandra pondera que é preciso reavaliar se, ao nos compararmos com o que fomos, estamos sendo justas com o que vivemos. "É se perguntar: você estava feliz naquela época? Se sim, se estava saudável, beleza. Agora, se não estava, por que tentar ter um corpo que não é seu biotipo?
A gente vai envelhecer e nosso corpo sempre vai mudar".
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