Mães podem exigir home office para cuidar dos filhos sem aulas? Entenda
O surto de Covid-19 causado pelo novo coronavírus tem feito diversos estabelecimentos fecharem suas portas para conter a disseminação da doença — entre eles, as escolas.
Mas nem todas as empresas liberaram seus funcionários para trabalharem em casa. E aí vem o problema: quem fica com as crianças no período sem aulas? É possível exigir o home office nessa situação?
Segundo a advogada trabalhista Fabiana Fittipaldi, mestre em direito do trabalho com tese sobre mulheres e mercado de trabalho, não há nenhum artigo na legislação trabalhista que fale sobre home office em uma situação de exceção como a que estamos vivendo.
"Num contexto como o atual, o home office é algo oferecido pelo empregador, não um direito do funcionário", explica. Por isso, não é possível exigir, por lei, que a empresa libere um funcionário para ficar em casa.
A lei fala em "teletrabalho", como explica a advogada Raphaella Reis de Oliveira, especialista em relações de trabalho, família e consumo, que é o trabalho à distância, mas diz respeito aos casos em que essa modalidade já está prescrita no contrato trabalhista.
"É previsto como um acordo comum, entre empregador e empregado, nas circunstâncias normais, mediante o cumprimento de algumas formalidades, como a comunicação sindical, o fornecimento de estrutura para o trabalho. Normalmente, as mães não podem exigir o teletrabalho para cuidado das crianças. Mas não estamos em circunstâncias normais", explica Raphaella.
Segundo a advogada, neste momento, pelas circunstâncias de força maior previstas no art. 501 da CLT, empregadores devem determinar o teletrabalho; caso estes não o façam, os empregados devem solicitá-lo. "As mães, especialmente — e com prioridade para aquelas que têm filhos em grupos de risco", explica.
Raphaella ainda lembra que a Lei 13.979/20 — recentemente promulgada pelo governo federal, que trata das medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública decorrente do coronavírus — determina que, em caso quarentena, isolamento, avaliações, tratamentos, vacinações e exames médicos compulsórios, a falta ao trabalho será justificada.
"Não podem ser descontadas as faltas no período, e também não incide hipótese de dispensa por justa causa derivada de abandono de emprego. Mas não posso afirmar como a norma será interpretada pelos tribunais, caso mães busquem essas iniciativas livremente. Nas cidades de São Paulo e Rio de Janeiro, onde o estado de emergência já foi decretado, entendo que elas têm mais bases e força para buscar um isolamento, ainda que voluntário", afirma a advogada.
Revezamento é uma alternativa na negociação
Fabiana sugere que se opte pela negociação com a empresa. Os pais — e isso inclui homens e mulheres —, devem conversar com os empregadores para que possam ficar em casa cuidando das crianças e, em casos extremos, sugerir um revezamento. "Se o marido conseguir ficar com os filhos de manhã, a mulher pode pedir para trabalhar em casa à tarde, por exemplo", afirma.
"Muitas empresas já estabeleceram esse revezamento e seguem as normas de segurança em saúde. Há menos gente no espaço, os funcionários ficam mais longe um do outro. Também liberam para que o turno seja cumprido fora do horário de pico."
Medida provisória ou decreto poderia resolver situação
Segundo Fabiana, o que pode acontecer — e ela acredita que vai, em algum momento dos próximos dias — é que o governo, municipal, estadual ou federal, publique decreto ou medida provisória exigindo exigindo a liberação do home office. "Aí as empresas serão obrigadas a cumprir a ordem", afirma.
"É tudo muito novo e as mudanças estão acontecendo rapidamente. Pode ser que daqui a pouco saia uma medida provisória dizendo que mulheres com filhos de até 3 anos devem ficar em casa, por exemplo", explica.
"Mas o melhor é que se estendesse aos pais, não só à mulher, porque pode haver um efeito colateral contra a força de trabalho feminina."
Liberar só mulheres traria mais estigma
Fabiana ressalta que, caso apenas as mulheres sejam liberadas para cuidar dos filhos, isso pode reforçar o estigma de que a maternidade causa prejuízo ao empregador.
"Vai passar a crise e o empregador vai lembrar que teve prejuízo com uma mãe. Quem vai ser discriminado lá na frente? Mulheres. Então é preciso pensar no pai também, mesmo porque essa é uma tarefa que precisa ser dividida em vez de deixada só nas costas da mulher."
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