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Priscila Fantin: "Na TV, fama era exacerbada. Depressão me obrigou a parar"

Priscila Fantin - Reprodução Instagram/Lucio Luna
Priscila Fantin Imagem: Reprodução Instagram/Lucio Luna

Ricky Hiraoka

Colaboração para Universa

20/03/2020 04h00

Afastada da TV aberta desde 2016, quando esteve no elenco do sucesso "Êta Mundo Bom!", Priscila Fantin ainda goza de popularidade para encher boa parte da plateia de um teatro num dia de semana. Ela está em cartaz no Teatro Folha, em São Paulo, com a peça "Precisamos Falar de Amor Sem Dizer Eu Te Amo", em que atua ao lado do marido, o ator Bruno Lopes.

Ele, diz a atriz, foi fundamental para que Priscila enfrentasse uma doença com a qual conviveu por muitos anos. "A depressão me obrigou a parar", afirma ela, sobre ter saído da televisão. "Quimicamente, estava destruída. A demanda de atender todas as pessoas com simpatia, sorrindo, fazer capa de revista, era uma carga muito grande. Minha vida não pertencia mais a mim. Foi uma grande dádiva conseguir dar um tempo e não emendar mais uma novela na outra."

Nesta entrevista, ela se diz mais confortável com a rotina com menos exposição que leva nos palcos e com o maior domínio sobre a carreira. Fala também sobre amor, o fardo da fama e a jornada de autoconhecimento que enfrentou.

Na peça, os personagens falam muito sobre experiencias amorosas. O que você aprendeu sobre o amor com Bruno Lopes, com quem namora há dois anos e divide o palco?

Priscila Fantin e Bruno Lopes - Reprodução Instagram - Reprodução Instagram
Imagem: Reprodução Instagram

Eu aprendo muito sobre o amor com o Bruno. Até conhecê-lo, o que eu achava que era amor, não era. O parâmetro que tenho hoje é muito alto e intenso do que qualquer forma de amor, inclusive o familiar. Ele me ensinou que o amor faz você ter uma dedicação sem limites pela outra pessoa. Abrirmos mão de coisas para estarmos juntos. Fui diagnosticada com depressão em 2008, mas só fui curada mesmo quando Bruno entrou na minha vida. Ele foi muito amoroso e teve muita paciência para me fazer ver que eu precisava mudar hábitos para me curar de vez. Bruno é superimpaciente, mas passou por cima do jeito de ser dele para ver meu brilho cada vez maior.

Foi difícil para você aceitar a depressão?
Ainda tem muito preconceito em torno desse assunto. Quando comentava com alguém, o que eu ouvia era: "Depressão? Imagina! Você tem tudo, trabalho, família...". Tinha tudo, mas não tinha a mim mesma. Senti vergonha de ter depressão. Demorei muito para falar sobre isso e compartilhar esse momento da minha vida me fez muito bem. Recebo muitas mensagens de pessoas que passam por isso. Tem muita gente que ainda não entende que isso é uma doença. Todo mundo sempre acha que é fraqueza ou frescura. Falar sobre depressão é uma forma de criar uma rede de apoio para quem sofre disso.

Do fim de 1999, quando você protagonizou a primeira temporada de "Malhação Múltipla Escolha", até 2010, quando foi exibida a novela "Tempos Modernos", você esteve em papéis de destaque na TV quase todo ano. Sente saudade de fazer novela?

Priscila Fantin - Reprodução Instagram - Reprodução Instagram
Imagem: Reprodução Instagram

Para ser sincera, não sinto falta das novelas. Eu adorava conviver com a equipe técnica, mas tenho zero saudade do ritmo superintenso de gravação, por exemplo. Não quero parecer ingrata dizendo isso. Tenho que reconhecer que foi maravilhoso viver tudo que vivi. Amo as novelas e os personagens que fiz. Mas eu precisava ter mais propriedade sobre minha vida. Na TV, tinha um rótulo de mocinha, que já não fazia mais sentido para mim. Faltavam personagens que me desafiassem. No teatro, embora trabalhe 24 horas por dia, fazendo produção, contabilidade, me preocupando em fazer contato o tempo todo para emplacar novos trabalhos, sinto que sou mais dona da minha arte.

Você se sentia culpada por estar numa posição tão almejada e não se sentir feliz e realizada?
Eu comecei na TV vivendo uma crise. Aos 16 anos, quando me chamaram para ser a Tati, de "Malhação", só aceitei porque pensei que não seria justo cair no meu colo algo que todo mundo quer e eu recusar. Pensei que atuar na televisão era uma missão, que ia me ensinar algo e que eu não poderia negar. E eu fui mantendo esse pensamento durante muitos anos. Os convites para ser protagonistas de novela vinham e eu aceitava. Sentia que era uma obrigação. Me sentia mal só de pensar em jogar oportunidade que os outros se matariam para ter. Sofria calada.

O que fez você ter coragem e dar um basta nisso?
A depressão me obrigou a parar. Quimicamente, estava destruída. Não tinha força para levantar da cama. Chegou uma hora que não conseguia mais dar conta de nada. Minha vida era a TV. A demanda de atender todas as pessoas com simpatia, sorrindo, fazer capa de revista, fazer publicidade, era uma carga muito grande. Minha vida não pertencia mais a mim. Foi uma grande dádiva conseguir dar um tempo e não emendar mais uma novela na outra. Só assim consegui me enxergar e ver que a história que escreveram para mim não é a que eu escreveria. Demorei para discernir quem era a figura que tinham criado para mim e quem eu era na essência.

TV, portanto, nunca mais?
Eu quero realizar trabalhos curtos. Agora o ideal, para mim, é viver personagens sem grande destaque na trama para eu ter domínio sobre minha vida. O coadjuvante exige menos tempo no estúdio. Busco também personagens e histórias que tenham um propósito com a humanidade. Quero sentir que estou contribuindo de alguma forma para a sociedade. Nesse tempo longe da TV, recebi alguns convites, mas fiquei me questionando se aqueles papéis iam acrescentar algo à vida dos espectadores. Nenhum deles tinha nada a dizer.

A fama a incomodava?

Priscila Fantin 2 - Reprodução Instagram - Reprodução Instagram
Imagem: Reprodução Instagram

Através da fama conquistei muita coisa, mas ainda não tinha me construído a ponto de ser forte e inabalável para lidar com tudo que estar exposta na maior emissora do país acarreta. Foi uma fama exacerbada. Tudo acontecia em proporções gigantescas. Me sentia mal de ser colocada num pedestal que não queria estar. Nunca me senti melhor que os outros, nem queria ser melhor que ninguém. Vivi um paradoxo. Ao mesmo tempo que a fama me permitiu realizar muitos sonhos, aquilo tudo não me fazia bem.

As pessoas mudaram muito com você quando você decidiu se afastar da TV?
Os espectadores não mudam. São carinhosos da mesma forma. Isso até me surpreende. Estou há dez anos sem destaque televisivo e as pessoas falam comigo com o mesmo nervosismo de quando era protagonista de novela, me tratam com o mesmo prestígio. O que mudou foi que algumas pessoas próximas acharam que eu tomei decisões erradas e acreditam que o lugar que eu escolhi estar não tem o mesmo mérito de antes. Me sinto completa da mesma forma. A minha credibilidade não foi abalada. As empresas que me contratavam antes para fazer trabalhos, continuam me chamando.

Embora você tenha 1 milhão de seguidores no Instagram, não parece muito adepta das redes sociais.
Vi redes sociais nascerem na época dos blogs. Lá, expunha minha opinião sobre várias coisas através de textões. Era gostoso colocar minha visão sobre as coisas. Com o tempo, isso gerou muita repercussão. Muita gente opinava e julgava o modo que eu enxergava o mundo. No Twitter, falava uma coisa ou outra, mas desativei meu perfil. Acho difícil levantar bandeira. Todo mundo tem o direito de pensar e agir como sua experiência ensina. Certo e errado é relativo. Se levanto uma bandeira, tenho que ser coerente com o que prego, e as coisas são tão subjetivas, nunca existe uma verdade só. A única rede social que uso mais é o Instagram, que julgo ser mais benéfico. Na minha época, os paparazzi e os sites de fofoca faziam uma versão da sua vida, eles escreviam o que achavam que era verdade e aquilo virava sua história. Você tinha uma vida escrita por outros. Com o Instagram, sou autora da minha vida.

O que você aprendeu sobre si nessa revolução pessoal?
Quanto mais a gente se ama e sabe sobre si mesmo, quanto mais a gente se aceita e enfrenta medos e bate de frente com defeitos, mais completos estamos para ser felizes. Mudar vale a pena, embora seja um processo dolorido e demorado, que demanda tempo de reflexão. Qualquer mudança é muito difícil de fazer nessa vida rápida onde todo mundo posta tudo nos Stories. Sei que a vida é networking, que precisamos estar conectados com outros, mas não podemos ser dominados por isso, porque não é saudável.