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Em curso pra futuros policiais, ex-PM exalta a violência: "porrada em puta"

Professor, Evandro Guedes (foto) já foi da polícia militar fluminense, onde diz já ter cometido atos de crueldade ao bater em todo mundo - Reprodução
Professor, Evandro Guedes (foto) já foi da polícia militar fluminense, onde diz já ter cometido atos de crueldade ao bater em todo mundo Imagem: Reprodução

De Universa

14/04/2020 16h45

Um professor de curso preparatório para a polícia deu declarações de estímulo à violência ao dizer que agredia "homens, mulheres, velhos, crianças e adolescentes", além de torcedores de futebol "favelados", a qual se refere como "crioulada", quando ainda era policial militar no Rio de Janeiro.

O vídeo protagonizado por Evandro Bittencourt Guedes, fundador da plataforma online de cursos preparatórios Alfacon, foi transmitido ao vivo na última quinta-feira (9) e publicado por grupos de direitos humanos e de igualdade racial, que repudiaram os comentários nas redes sociais. No trecho, ele responde a dúvidas sobre o ingresso na Polícia Rodoviária Federal (PRF).

"Me perguntam: 'Já bateu em muita gente?' Já, inclusive nas putas. Entrava e todo mundo tomava borracha. Você era violento na Polícia Militar? Muito violento. Evandro, você já pegou dinheiro? Dinheiro, não. Sou honesto para caramba, mas porrada sobrou. Homens, mulheres, velhos, crianças e adolescentes", diz. Veja:

Para especialista, curso estimula violência entre policiais

Em entrevista ao Universa, Major Denice Santiago, policial militar da Bahia e criadora da Ronda Maria da Penha, repudiou o ensinamento oferecido pelo curso. "Não há no currículo de curso de formação nada que ensine a nenhum policial, militar, civil, federal, penitenciário ou rodoviário a bater. Não há", pontua.

Segundo ela, o curso estimula um "currículo oculto", no qual a violência é praticada à revelia dos direitos humanos e é estimulada por preconceito. Assim, a conduta violenta pode ser naturalizada pelos futuros policiais. "[A citação dada em relação à violência contra a mulher] pode tanto estimular a prática como minimizar na atuação profissional", explica Denice.

"Há um dos ditados populares que eu sempre questiono que diz: 'a palavra convence, o exemplo arrasta'. Neste caso, ambos (a palavra e o exemplo) estão direcionando o aluno a um aprendizado violento e não técnico, na contramão dos direitos humanos".

A major também questiona as falas consideradas racistas no curso. "Quando ouvimos a palavra 'favelado' que imagem nos veio a mente? Uma representação social que faz com que analisemos e acreditemos que as pessoas que moram naqueles locais são feias, sujas, marginais, pouco instruídas... uma série de adjetivos genéricos e perigosos", pontua.

PM é fundador de curso preparatório

Guedes é fundador da Alfacon e professor de Direito administrativo, penal e se descreve como especialista em cursos preparatórios. De acordo com a plataforma, atuou na Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro (PMERJ) e atuou no Departamento Penitenciário Federal (Depen) em Cascavel, Paraná.

A plataforma Alfacon é a mesma onde o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) defendeu que para fechar o Supremo Tribunal Federal (STF) basta "um soldado e um cabo", em 2018. Outros professores da plataforma também já defenderam a tortura de suspeitos.

Nas novas imagens, Guedes diz que agrediu "um favelado" que teria lançado uma lata com urina contra ele durante uma partida de futebol entre Flamengo e Fluminense, quando ainda o professor ainda era PM. Em troca, teria agredido toda a ala de torcedores presentes no estádio.

"Porra, mijo de favelado. Aquela crioulada, todo mundo rindo", diz. Um capitão teria dado a ordem para bater. "Foi o primeiro ato de execução de maldade e crueldade que eu fiz", disse. "Ali eu descobri que gosto de bater nas pessoas".

Nas mesmas imagens, Guedes também conta que já agrediu prostitutas e que o distintivo garante aos recrutadas "dar carteirada" em prostíbulos, além de despertar o desejo de mulheres.

Vídeos do curso apresentam dicas de violência para PMs

Em uma compilação feita pela Ponte Jornalismo, Guedes também já fez comentários transfóbicos. Durante uma aula, o professor ensina que o assassinato hipotético de uma mulher trans não é feminicídio.

"Eu estou metendo no rabão dele, bonitinho, dei um tiro na cara do traveco. Tem peru, tem? Não é feminicídio, não. Travesti sem pinto? Feminicídio", diz Guedes. A Justiça e o Ministério Público, porém, já consideram como crime de feminicídio o assassinato de pessoas trans e travestis.

Outros professores da plataforma também já defenderam a tortura de suspeitos usando métodos como utilizar o fio de um ventilador para provocar choques elétricos. À época da reportagem publicada pelo site, a plataforma tirou os vídeos do ar e emitiu um pedido de desculpas aos alunos.

Outro lado

Universa fez contato com a assessoria de imprensa da Alfacon para receber posicionamento sobre as falas de Evandro Guedes. A reportagem será atualizada assim, ou se, recebermos um posicionamento do curso.

Em nota, a assessoria da Secretaria de Estado da Polícia Militar do Rio de Janeiro informou que o palestrante serviu na corporação de 1998 a 2007 e afirma que: "A mensagem do vídeo, de cunho comercial, não condiz com as diretrizes adotadas pela instituição".