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Influencer Tati Sincera: "Machucava meu rosto pra não sofrer outro abuso"

Influenciadora Tati Sincera conta experiência pessoal para ajudar as pessoas nas redes - Jamir Fotografias/Divulgação
Influenciadora Tati Sincera conta experiência pessoal para ajudar as pessoas nas redes Imagem: Jamir Fotografias/Divulgação

Luiza Souto

De Universa

20/04/2020 04h00

"A demanda das pessoas em quarentena está grande. Impacta na saúde emocional, né?", observa a influenciadora Tati Sawaski, ou Tati Sincera, como é conhecida entre os 101 mil seguidores do Instagram. Especializada — entre outras coisas — em terapia sistêmica, focada no comportamento, em programação neurolinguística e thetahealing, ela usa a experiência pessoal de abuso sexual, alcoolismo do pai e deficiência física da mãe para ajudar seu público a vencer medos e anseios.

A seguir, Tati, de 31 anos, relata como deu a volta por cima após chegar a se automutilar e desenvolver síndrome do pânico.

"Passei por abuso quando criança. Meu pai era alcoólatra e minha mãe teve poliomielite na infância, então sua perna esquerda não desenvolveu.

Uma vez, ela caiu na rua e ninguém nos ajudou a levantá-la. Eu tinha 5 anos. Parecia que as pessoas tinham medo de tocá-la. Foi a primeira vez que me conectei com uma coisa assim, com o preconceito.

Minha mãe nem poderia ter filhos. Digo que eu e meu irmão, cinco anos mais novo que eu, fomos um milagre, porque parte do ovário dela, do sistema reprodutor, era atrofiada. Aos 13, ela teve que retirar vários cistos. Ainda tirou uma trompa e o ovário do lado esquerdo.

Com 5 anos de idade, pedi para minha mãe para eu começar a ir à escola sozinha. Ela perguntou por quê. Respondi: 'Porque quem traz papai da escola sou eu'.

Ele vivia bêbado, mas era muito carinhoso com a gente. Há dez anos, ele fez tratamento e está sóbrio. Virou consultor terapeuta para quem passa por essa experiência.

Sempre tive que me virar. Com 9 anos fazia a unha das minhas vizinhas. Minha mãe que era mantenedora do lar, porque, por causa do alcoolismo, meu pai não parava em emprego nenhum. Ela trabalhava como assistente administrativa numa usina hidrelétrica em Florianópolis, onde morei até os 8, e depois foi para outra, em Laranjeiras do Sul, no Paraná. Era uma empresa com 144 homens e apenas três mulheres. Pense numa mulher que escolheu sorrir.

Minha mãe que me inspirou a ver o lado positivo e leve da vida.

Fui abusada na infância. Aos 7 anos, estava no prédio onde uma tia morava. Ao entrar no elevador, sozinha, um homem entrou e começou a se esfregar em mim. Contei para meu primo, que no dia brincava comigo, e ele acionou a família. Meu pai denunciou a pessoa.

Só sentei com a minha mãe para conversar abertamente sobre isso quando eu tinha 14 anos, e na presença de um terapeuta. Ela entrou em negação na época, não queria acreditar. Não faz nem três meses que falamos novamente sobre isso e ela falou o quanto se sentia culpada pelo que aconteceu comigo. Mas eu jamais a culparia.

Dificuldade para se relacionar

Na adolescência, tinha dificuldade de me relacionar. Virei aquela pessoa que acha que dá conta de tudo — isso até adoecer. Eu chegava a arrancar os cabelos. E me machucava no rosto e no corpo para ficar feia e ninguém mais abusar de mim. Também usei roupa de homem, para não ser atraente. Minha primeira relação saudável foi com meu marido, com quem casei em 2017.

Aos 19, fui trabalhar como técnica administrativa num banco em Guarapuava, a uns 110 quilômetros de Laranjeiras do Sul. E desenvolvi pânico de tudo, até achar que minha comida era envenenada. Não dirigia mais ou ia ao mercado. Cheguei a bater o carro quatro vezes em seis meses. E roubaram a casa onde eu morava.

Não contei para ninguém porque quando estamos doentes emocionalmente achamos que só a gente sente aquilo, ou que ninguém vai entender e vai achar que é muito louco. A gente esconde por vergonha.

Voltei para Laranjeiras. Por causa da ansiedade, perdi nove quilos em 20 dias e achava que estava com problema no coração, então procurei um cardiologista. Mas ele percebeu o que estava acontecendo de verdade e me ensinou que tomar remédio para a síndrome do pânico não significa depender dele a vida inteira, mas que eu precisava naquele momento. Tomei tarja preta por um ano e 8 meses.

Nesse meio tempo, ainda tive uma crise renal e cheguei a chamar os amigos para me despedir, porque achei que ia morrer. Como tinha vergonha do meu corpo magro e alto, tomava todos os suplementos que me indicavam na academia para crescerem os músculos, e tive problemas por causa disso.

Fiquei nove dias no hospital com a infecção renal. Como sobrevivi, prometi que iria descobrir de onde vinha aquela dor que eu guardava. E mergulhei no mundo do autoconhecimento. Fiz o curso de PNL (Programação Neurolinguística) entre outros. Três anos depois, em 2017, senti que estava preparada para falar tudo o que eu passei, mas também de como sobrevivi a tudo isso, da minha cura. Foi como o Tati Sincera nasceu.

Tati Sincera

O apelido "sincera" veio de amigas, porque eu não enfeito a situação. As pessoas têm um olhar de negação para muitas coisas, então trago elas para a realidade, minimizo o efeito drástico que elas dão. Muita gente apresenta uma queixa como se fosse a pior situação que vive. E não necessariamente é.

A maior queixa delas é com o relacionamento. Mas para mim, todos os problemas de relacionamento vêm da falta de autoconhecimento. O que me incomoda no outro é uma questão de falta de conhecimento de si, dos seus gostos.

As mulheres buscam mais ajuda, têm mais coragem de se expressar, mas não nicho o meu público. Relacionamento pessoal é para todo mundo. Se eu nicho só para as mulheres, talvez limite a capacidade de trazer mais pessoas para a realidade. E muitos homens são superengajados, se abrem muito.

Hoje auxilio as pessoas a escolher o melhor caminho. Eu as direciono. Por isso, falo que sou influenciadora de desenvolvimento pessoal.

Sempre recebi bastante mensagem, mas meio que dava conta. Antes, respondia os directs no Instagram em um dia. Agora é tanto direct que não consigo mais fazer isso.

As pessoas têm falado muito de crises emocionais, de relacionamento, ansiedade e falta de sentido na vida, principalmente agora com o isolamento social. Mas não falo de coronavírus. Tanto que meu perfil você lê: 'Não vou falar de corona, mas do ser humano e suas crises!'".