BBB20: Por que a vitória de Thelma é tão importante para mulheres negras?
Com 44,1% dos votos na noite de segunda-feira (27), a médica anestesista Thelma de Assis foi a campeã do BBB20, em uma final feminina que parou o Brasil, especialmente focado no reality show em tempos de isolamento social.
O BlackTwitter — espécie de comunidade informal de pessoas negras na rede social — só faltou estourar champanhe. Famosos, como Lázaro Ramos, Taís Araújo, Preta Gil e Ícaro Silva celebraram o R$ 1,5 milhão entregue à participante. A campeã da edição 18, Gleici Dasmaceno, também compartilhou nas redes sociais uma ilustração em que aparece "passando a coroa" para Thelma.
Por que, afinal, importa tanto para pessoas negras que Thelma tenha conquistado o BBB20?
"Preta milionária coroada no BBB", diz Tia Má
Um dos trunfos de Thelma é o fato de ela representar tantas mulheres negras que não se veem em posições de conquista e, por vezes, incomodam quando são vistas ali. "Ao longo da história, a gente se viu tão pouco, fomos tão invisíveis que quando a gente tem uma representação, a gente comemora demais; porque isso faz bem pra autoestima. Dá um calorzinho no coração", comenta a publicitária.
"É a primeira vez que a gente tem uma mulher preta, retinta, daquelas que não tem dúvida da negritude sendo coroada milionária em um programa de entretenimento", pontua a jornalista e criadora de conteúdo Maíra Azevedo, conhecida como Tia Má. Para ela, a conquista de Thelma cria uma "sensação de possibilidade" para mulheres negras, além de fazer com que elas se sintam representadas e traga indícios de que o Brasil está se conscientizando sobre pautas raciais.
"Ela ter ganhado diz muito sobre avanços no nosso país, que é racista e reacionário, mas que discutiu algumas pautas, como o racismo estrutural, através do BBB". O tema, aliás, tem sido insuflado por outros casos midiáticos — como o que o jornalista Rodrigo Bocardi "confundiu" um tenista negro com um gandula do esporte.
Racismo estrutural é um dos braços de um sistema de opressão social em que pessoas negras são lidas como inferiorizadas e subalternizadas (em contrapartida à manutenção de privilégios de pessoas brancas) — lugar em que Thelma se negou a ficar em toda sua participação no programa, inclusive, falando mais sobre sua "história de superação" ao público.
Para a publicitária Deh Bastos, uma das criadoras do perfil no Instagram "Criando Crianças Pretas", é possível enxergar a chegada de uma "preta no topo" por duas perspectivas: a individual, da batalha que a médica anestesista enfrentou para chegar onde está, e a coletiva, em que ela ocupa uma posição inspiradora — tanto como pela trajetória profissional, quanto dentro do BBB— no imaginário da sociedade, especialmente de crianças e jovens negros.
"Ela é uma referência para as crianças, principalmente relacionada aos estudos, porque houve uma luta para passar em Medicina; no entanto, enquanto sociedade, a gente não pode romantizar essa narrativa, porque ela só mostra a desigualdade gigante que temos no país", analisa. "A história individual de Thelma é incrível, é claro. Mas deveríamos estar falando também sobre as possibilidades que precisam ser criadas para que todas as pessoas pretas que sonhassem ser médicas pudessem realizar isso".
Representatividade...e representação
A lição de casa que devemos fazer sobre a escalada de Thelma até o título de campeã do BBB, analisa a publicitária, tem pelo menos um exercício básico: entender o que é representação negra e representatividade negra.
"Nós temos pouca representação. Quando pessoas pretas estiverem como roteiristas, diretores e forem as que constroem as narrativas que precisam ser contadas, ou seja, quando tivermos representatividade, aí é que teremos mais representação, com mais gente preta na TV, na Ciência, na Medicina...E isso só não se dá na proporção da população brasileira [em que mais de 56% se declaram negra ou parda], porque há um grupo 'padrão' que gerencia toda a estrutura e tem o poder".
Mulheres reconhecem avanços e convidam a aprendizados
Para Tia Má e Deh, ser parte da grande torcida que comemorou o primeiro lugar de Thelma, no entanto, é um convite para um comportamento antirracista no dia a dia e para que se repense as estruturas e relações em que a mulher negra permanece na base da pirâmide social, em serviços de base e longe de posições de poder.
"Pelo BBB, muita gente conseguiu adquirir conhecimento sobre a pauta", diz a jornalista. "O programa colocou luz sobre o racismo estrutural, sobre Thelma ser chamada de esnobe, sobre os julgamentos que fizeram com Babu. Agora, o que a gente vai fazer a partir disso é que vai ser o aprendizado sobre as questões do racismo", pondera a publicitária.
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