Mulheres contam por que decidiram encarar a transição capilar na quarentena
"Eu nem me lembro quando foi a primeira vez que alisei o cabelo", conta a jornalista e apresentadora Joyce Ribeiro, aos risos. "Deve ter sido por volta dos meus 12 anos, nos anos 90. Nessa época, eu achava que sinônimo de cabelo arrumado era cabelo alisado, muita gente pensava assim."
Depois de 22 anos fazendo diversos processos químicos no cabelo, Joyce decidiu passar pela transição capilar e assumir os cachos durante a quarentena. Em 2018, ela foi a primeira jornalista negra em 65 anos de televisão e 30 de democracia a mediar um debate eleitoral a Presidência. No mesmo ano, também se tornou a primeira negra a assumir sozinha a bancada de um jornal televisivo diário no horário nobre na programação aberta brasileira.
"Na adolescência, as meninas com as minhas características simplesmente não existiam na grande mídia, não havia representatividade", aponta Joyce. "Alisar o cabelo era um padrão a ser seguido. Isso mudou."
Joyce já pensava em passar pela transição capilar. A decisão veio dias antes de sua estreia no Jornal da Tarde, da TV Cultura, no dia 27 de abril. "Eu não queria mais o visual liso, queria me aproximar das minhas origens. Acho importante ser um exemplo para minhas filhas e elas adoraram me ver crespa."
Para transicionar, Joyce está usando o entrelaçamento fio a fio, técnica de alongamento capilar que mescla o cabelo natural com os fios aplicados.
"O meu cabelo é super crespo, é do tipo 4C. Eu decidi cortar boa parte do cabelo que estava com química. Conforme ele for crescendo, vou cortando até tirar todas as pontas lisas. Ele ainda está mesclado com o entrelaçamento, bem na transição", diz, complementando que pretende, no futuro, "usar ele completamente natural".
Métodos e prazo para encarar a transição
Além do entrelaçamento usado por Joyce, existem outras formas de disfarçar as duas texturas do cabelo. Entre elas, estão tranças, apliques e a fitagem, procedimento que separa os fios em mechas e é bastante usado para definir os cachos.
Para a cabeleireira Célia Santos, especialista em transição capilar e responsável por ajudar Joyce neste processo, a hidratação é essencial. "Aconselho passar o leave-in todos os dias e usar máscaras de hidratação pelo menos uma vez por semana. Cremes a base de óleos também são uma boa dica para esse período", diz Célia. Ela diz que é possível misturar óleo de coco ou de rícino e misturar no creme para aumentar a hidratação.
O cabeleireiro Carlos Tavares, que também é especialista em transição capilar, indica o long bob como corte ideal para este momento. "O corte em camadas vai ajudar na ondulação do cabelo. Estes cortes desconstruídos ajudam a disfarçar as duas texturas. Sempre indico cremes de ativação de cachos e muito óleo de coco, que ajuda na fibra dos fios e ajuda a estrutura do cabelo a voltar ao natural."
O tempo da transição também depende da forma como o alisamento foi feito.
O formol permite que a estrutura seja reconstituída muito mais rápido, mas se o procedimento utilizou hidróxido de sódio ou guanidina, o processo tende a demorar mais, segundo Tavares. "O processo completo leva cerca de um ano, mas isso pode variar conforme o ritmo de crescimento de cada cabelo", diz.
Elas escolheram radicalizar
Quem tem pouca paciência para enfrentar o longo período de transição capilar, opta pelo big chop, ou "grande corte", que retira toda a parte lisa do cabelo de uma vez só.
Depois de mais de 15 anos alisando o cabelo, este foi o método adotado pela estilista Bruna Fernandes, 33, nesta quarentena.
"Com o isolamento social, a raiz do meu cabelo foi aparecendo e tive contato novamente com meus cachos. Percebi que o período era um ótimo momento para fazer a transição. Já que não tenho paciência para lidar com as duas texturas, decidi cortar toda a parte lisa de uma vez. Pensei que se eu não me adaptasse com o cabelo curto, pouca gente iria me ver e ele cresceria um pouco até o final da quarentena."
Ela decidiu alisar o cabelo na adolescência. "O menino que eu era a fim disse que me achava bonita, mas que ficaria melhor com o cabelo liso. Isso foi bem marcante para mim. Pouco tempo depois, comecei a fazer os alisamentos", lembra Bruna. "Demorou muito, mas entendi que a opinião dos outros não é tão importante."
A estudante de direito, Sabrina Henne, 19, tem a mesma opinião. Depois de 7 anos alisando os cachos, decidiu no ano passado que era hora de parar com a progressiva. "Eu senti que meu cabelo já não estava mais aguentando tanta química, estava fraco e tinha parado de crescer."
Em outubro ela fez tranças para disfarçar as duas texturas, mas há poucas semanas, aos desfazer o procedimento, percebeu que já era o momento de assumir os cachos. "Peguei a tesoura, me tranquei no banheiro e fui cortando todas as pontas lisas aos poucos, até sair tudo. A quarentena foi muito importante para eu tomar essa decisão, nunca teria coragem se minha rotina continuasse a mesma."
Sabrina conta que o processo todo teve um efeito transformador, não só nos fios. "A transição capilar foi um grande passo para que eu começasse a me enxergar como uma mulher negra. Meu cabelo é minha identidade", afirma.
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