"Hoje não tem tutorial": influencers de São Gonçalo homenageiam João Pedro
"Hoje não tem foto produzida, não tem vídeo de desafio, não tem vídeo de maquiagem, nem organização de feed. Mais uma criança, mais um sonho interrompido." A modelo e influenciadora Emillie Galdino mora em São Gonçalo, no Rio de Janeiro —região em que o adolescente João Pedro, 14, foi assassinado.
Segundo relatos de familiares e amigos, ele brincava no quintal da casa de um tio quando policiais invadiram o local e o atingiram com um tiro na barriga. Ontem, Emillie só conseguia pensar na gravidade do que tinha acabado de acontecer.
Em entrevista a Universa, ela conta que é moradora de São Gonçalo há 20 anos e que escutou os helicópteros passando no dia do crime. "Tenho um irmão quase da mesma idade do João, com as mesmas características físicas. Poderia ter sido ele. Não somos exceção, somos regra. Trata-se de um genocídio com a população preta."
Assim como ela, outras produtoras de conteúdo que vivem na região usaram as redes sociais para se manifestar sobre o crime. "Quem em sã consciência autorizaria operação policial em favela no meio de uma pandemia? O plano de extermínio da população preta e favelada não pode parar", ironizou a trancista e estudante de história Flávia Trindade no Instagram.
"No dia em que aconteceu estava ajudando meu pai a consertar um carro na garagem da minha casa, em Mutondo. Passamos a tarde escutando o barulho dos helicópteros e fiquei apreensiva, pois a chave (ferramenta do carro) poderia ser confundida com uma arma. Estou cansada de lidar com notícias assim. Sempre penso que poderia ter sido meu irmão, meu namorado. Não dá pra fingir que não tem nada acontecendo. O racismo nos faz alvos. Quem garante que, se não tivéssemos feito pressão na internet, o corpo de João apareceria?", diz.
"Não estamos seguros nem nas nossas casas"
Thayná Freire mora em Colubandê, em São Gonçalo, é designer de moda e tem mais de 60 mil seguidores. Pelos stories, ela pediu desculpas pela ausência no dia de ontem, e contou que estava triste com o que aconteceu.
A Universa, explica: "Tenho orgulho de mostrar de onde venho e a minha realidade. Inclusive minhas seguidoras começaram a se identificar comigo quando eu passei a mostrar minhas dificuldades também. A maioria delas acompanhou minha saga de faculdade: acordava 4h30 da manhã para ir à Barra da Tijuca, era bolsista do ProUni e graças a Deus consegui me formar".
Ela diz que soube da notícia pelo Twitter, quando o João ainda estava desaparecido. "Quando escutei o helicóptero já sabia que não era coisa boa. Fiquei aflita demais, torcendo para que tudo acabasse bem." Ela diz ter sofrido quando o corpo foi encontrado no IML.
"Ele se tornou mais uma estatística. Não estamos seguros nem em nossas casas. O que me toca é saber que somos alvos. No meio de uma pandemia, quando os hospitais estão lotados, temos que lidar com tiros e operações. Como funciona o #FicaEmCasa para quem não está seguro dentro da sua própria residência?", diz ela.
"Tenho dois filhos; senti a dor da mãe"
Isa Freitas, formada em visual merchandising, fala nas redes sobre maternidade e estilo de vida. É moradora de São Gonçalo desde que nasceu e costumava, na infância, frequentar a região onde o crime aconteceu para ir a uma igreja evangélica. Ela soube na notícia pelo Instagram.
"Meu povo cansado se juntou para saber onde estaria o João Pedro. Tenho dois filhos, senti a dor da mãe e do pai dele quando a notícia chegou. Nossos corpos são considerados descartáveis, agora com o coronavírus, mais ainda. Isso fere", diz.
Ela também usou a rede social para prestar uma homenagem ao garoto:
Na legenda, resumiu: "Juro que queria ser mais lúdica e sonhadora hoje, mas a nossa realidade não nos deixa sonhar. Vidas negras importam. Parem de nos matar", disse.
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