Gordos podem fazer yoga? Mulheres combatem o preconceito e provam que sim
Mulher gorda e ativista do Movimento Corpo Livre, a maquiadora Bianca Barroca fez um post mostrando diversas posições feitas pelo seu corpo na Yoga. Até aí, nada fora do comum do que vemos todo dia no Instagram. A diferença é que Bianca é gorda e, nas imagens, ela se compara com uma mulher magra, comprovando que também pode fazer toda e qualquer posição, mesmo sendo julgada por muitos por ter um corpo pesado.
Historicamente, os iogues indianos mais famosos são todos muito magrinhos. Isso dá uma certa leveza para eles, principalmente para fazer posições invertidas. Porém, para o conhecimento da Yoga, a forma do corpo não tem nenhuma relação com a prática. A gordofobia, que tanto incomoda Bianca, assombra muitas outras mulheres que pensam em iniciar a prática. A maioria delas, por não estarem acostumadas a encontrar referências, se pergunta: gordos podem fazer Yoga?
"Por isso, a forma do corpo não impede em nada a prática. As capacidades do corpo podem ser treinadas e melhoradas, sendo assim, algumas pessoas serão naturalmente mais fortes, outras mais flexíveis, mas o importante é saber que quando nos estimulamos o corpo responde e melhora, isso independe da forma corporal. Tenho alunas gordas e magras, jovens e idosas que são mais flexíveis, coordenadas e fortes do que eu, ou seja, o movimento é para todos", afirma a professora Ingrid Sayuri, criadora do projeto 'Yogues'.
'Quase desisti da Yoga por não encontrar referências gordas praticando'
Alcançando hoje as mais elaboradas posturas, nem sempre Bianca se sentiu capaz de praticar a Yoga. Ela relata que chegou a pensar em desistir quando passou a consumir conteúdos de exercícios nas redes sociais. "As fotos que apareciam para mim no Instagram eram de pessoas magras fazendo posturas que eu ainda não conseguia. E, por ver aquelas pessoas com um corpo tão diferente do meu, comecei a achar que jamais seria uma praticante de Yoga exemplar. Isso me desestimulou muito", conta ela.
Bianca ainda se sente muito constrangida ao perceber, em um local público, que é observada por ser gorda quando está praticando exercícios físicos. Ela fala do trauma que a gordofobia pode causar e aconselha quem quer iniciar uma atividade: "A prática do exercício físico para uma pessoa gorda é muitas vezes traumatizante. Me sinto constrangida e desconfortável com todo mundo me olhando. Procuro encontrar um lugar que me sinto à vontade e recomendo isso. Para todo gordo que tem vontade de praticar algum exercício, ou até mesmo Yoga, eu tenho algo a dizer: entendo o medo que você se sente. É um medo por julgarem que não somos bons o suficiente. Mas quero que essas pessoas entendam que com o auxílio de um professor que tenha empatia com a sua vivência, é possível".
A maquiadora comemora que suas fotos na Yoga tenham viralizado, já que foi justamente a falta de representatividade que quase a afastou da prática. "Vi pessoas marcando outras nos comentários e incentivando. Fiquei muito feliz. Além disso, descobri algumas hashtags que mostram pessoas com todos os corpos praticando a Yoga, como a #FatYoga. Comecei a ver corpos parecidos com o meu. Ter representatividade me estimula."
'Precisamos formar professores que olhem para corpos diferentes'
Professora de Yoga desde 2015, Vanessa Joda é referência no combate à gordofobia na prática de exercícios. Ela é criadora do projeto 'Yoga para todos' e incentiva não só mulheres gordas, mas também que a Yoga chegue em comunidades e que conquiste todas as classes. Vanessa conta que, mesmo sendo especialista na prática, também já sofreu preconceito por ser gorda: "Já entrei num espaço para dar aula e ficaram perguntando: ué, cadê a professora?"
Vanessa desmistifica a ideia de que uma pessoa gorda não pode praticar Yoga: "A única coisa que difere um gordo de um magro é que a Yoga trabalha com o peso do corpo. Então, obviamente uma pessoa mais pesada vai trabalhar com mais peso. Isso não é empecilho algum . Yoga traz conexão com o corpo e conhecimento. Outra coisa que é importante ressaltar: problemas de saúde não acontecem só com gordos. Quem tem problemas na lombar, joelho, pressão alta, cervical, eu dou alertas e alternativas de posturas."
A professora incentiva que mulheres gordas 'se joguem' no 'namastê'. "Nós temos uma tendência a odiar nosso corpo e a Yoga traz de volta esse amor e conexão, mostrando que corpo e mente são uma coisa só. É difícil encontrar professores gordos, eu sei, mas se inspire nos poucos que existem. Foi a Yoga que me fez me aceitar como pessoa gorda e saber que está tudo bem."
'Gorda e preta? Me sentia duas vezes inviabilizada'
Foi conhecendo a professora Vanessa Joda nas redes sociais que a influencer Ellen Valias, criadora do perfil 'Atleta de Peso' no Instagram, se sentiu confortável em iniciar a prática de Yoga no fim do ano passado. Mulher negra e gorda, ela conta que tinha em sua cabeça que as posturas não haviam sido feitas para ela. Atualmente ela é aluna de Vanessa e se vê apaixonada por seus avanços na Yoga
."Pessoas gordas têm medo de não serem acolhidas e eu tinha esse medo. Gorda e preta? Me sentia inviabilizada na Yoga duas vezes. Se você jogar no Google 'Yoga' vai encontrar apenas imagens de pessoas magras, padrões, brancas, saradas, fazendo aquela postura num tapete caro, numa paisagem com piscina. É muito elitista, além de tudo. Por isso eu precisei buscar qualquer representatividade para conseguir praticar. Foi aí que encontrei a Vanessa Joda e o Yoga para todos", conta Ellen.
"Se você jogar no Google 'Yoga' vai encontrar apenas imagens de pessoas magras, padrões, brancas, saradas, fazendo aquela postura num tapete caro, numa paisagem com piscina. É muito elitista, além de tudo", diz influencer Ellen Valias
Ellen tem também um canal no Youtube onde combate a gordofobia em qualquer esporte. A 'atleta de peso' aconselha: "Pessoas gordas que não fazem atividade física, tirem a culpa das costas. Acessibilidade ao esporte é negada aos gordos desde criança, desde a aula de educação física, quando somos ridicularizados. Busquei uma professora gorda para me sentir acolhida, porque não temos profissionais preparados para nos acolher. Representatividade salva vidas. E saiba que existem sim mulheres gordas na Yoga. Eu estou lá."
Popularização e acesso da Yoga para todos
Além do estímulo da representatividade que faz enxergar que é possível pessoas com diversos tipo de corpo praticar yoga, Vanessa aproveita para destacar outro movimemto importante para a democratização da prática: mais professores preparados para isso. "Precisamos entender que na Yoga é a prática que precisa nos adaptar a nós. Com o conhecimento corporal temos mais cuidado e consciência. Precisamos formar professores que olhem para corpos diferentes", diz.
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