Após ser exposta em site pornô, atriz cria projeto para ajudar mais vítimas
A atriz Pillar Costa, 28, tomou um susto quando, em novembro do ano passado, recebeu uma ligação desesperada do pai. Ele havia ouvido de um conhecido na cidade em que mora, Ubá, no interior de Minas Gerais, que a filha tinha se mudado para o Rio de Janeiro para virar prostituta.
Mais tarde, Pillar descobriu o que tinha acontecido: um trecho de uma participação dela em um vídeo de um canal de humor no YouTube, o Ixi, com 1,7 milhão de seguidores, foi cortado, editado e publicado, sem a autorização dela, no site de conteúdo adulto Xvideos.
A atriz, que é professora de teatro, já participou de "Malhação" e, antes da quarentena, estava gravando a novela "Gêneses", da Record, diz que, na época, chegou a pensar em tirar a própria vida, tamanha a culpa que sentia. "Comecei a receber mensagens dizendo que não deveria ter gravado esse tipo de vídeo. Como assim? Eu sou uma atriz. Fiquei muito mal porque parecia que a culpa era minha", diz.
Leia seu relato:
"Há mais de um ano, eu tinha gravado um vídeo para o Ixi, um canal de humor do YouTube, e minha atuação era como Pillar Costa mesmo, usando meu nome. Nesse vídeo, eu participava de uma competição de dança com outro personagem. Era engraçado, divertido. Teve quase 500 mil acessos.
Em novembro do ano passado, um conhecido parou meu pai na cidade em que ele mora, Ubá, em Minas Gerais. "Sua filha foi para o Rio para virar prostituta", disse o senhor. Eu ainda não fazia ideia que minha imagem e meu nome estavam no Xvideos [site com vídeos de conteúdo adulto].
Meu pai me ligou desesperado. Imagina, ele tem 71 anos, mora na roça. Ele estava muito bravo, muito nervoso. Minha mãe que conseguiu dizer o que ele tinha ouvido. Esse mesmo senhor falou que eu estava no Xvideos.
Na hora, pensei: 'Vazou alguma coisa minha'. Entrei no site e coloquei meu nome. Apareceu: 'Pillar Costa, a dançarina mais gostosa do Xvideos'. Aí eu entendi o que estava acontecendo.
Pegaram só as partes em que eu estava dançando e colocaram em câmera lenta, para ficar mais sensual. Parecia que eu tinha gravado para um canal adulto, não que era algo divertido, como foi a intenção original.
Na hora, eu só queria tirar aquele vídeo dali. No próprio Xvideos tem um botão para denunciar. Em menos de 24 horas tinha saído do ar. Mas o estrago já tinha sido feito.
Eu fiquei morrendo de medo e vergonha pelo meu pai. Fiquei achando que poderiam pará-lo de novo na rua, dizer que eu virei prostituta. Psicologicamente, aquilo me abalou muito. Meu pai passou meses sem falar comigo, ele não entendia quando eu tentava explicar, é de outra geração.
Junto com isso, comecei a receber mensagens de pessoas dizendo que eu não deveria ter gravado esse tipo de vídeo. Como assim? Eu sou uma atriz. Fiquei muito mal porque parecia que a culpa era minha. Tenho uma carreira, trabalho desde os seis anos e, hoje, além de atriz, sou professora de teatro.
O problema é quando nos julgam. Comecei a ter percepções que não existem sobre mim mesma. Cheguei a escrever uma carta pra minha família pedindo desculpa e pensei em me suicidar porque me sentia culpada.
Decidi gravar um vídeo, em janeiro, explicando toda a situação, mas não tive coragem de postar. Pensei: 'Será que trago isso à tona de novo?' Achei que a história poderia aumentar, que meu pai poderia ter um piripaque e desisti.
Projeto para encorajar outras vítimas de exposição virtual
Na quarentena, não sei por que, começaram a me escrever falando de novo sobre o tal vídeo. Foi quando tive um estalo: se comigo aconteceu isso, nem eram imagens íntimas, e eu já fiquei mal, imagina quantas mulheres devem passar pela mesma situação, sem ter coragem de falar?
No começo de junho, postei o vídeo em que explicava o que tinha acontecido nas minhas redes sociais e criei um projeto encorajando outras pessoas que passaram por situações parecidas a falar sobre seus casos. Criei um e-mail [bracosqueacolhem@gmail.com] para quem precisasse de ajuda poder me procurar e expor seus sentimentos. Recebi mais de 180 relatos. Veio de tudo: de exposição virtual a relacionamentos abusivos, inclusive casos em que a vítima era homem.
Com esses relatos, criei uma série documental chamada 'Por Um Fio', que publico uma vez por semana no meu canal no YouTube. Narro as histórias, mas também gravo com especialistas em direito e psicologia para falarem sobre essas situações.
Uma dos depoimentos que recebi foi o de uma mulher de 48 anos que, quando era jovem, teve fotos íntimas expostas na escola. Não tinha redes sociais na época. Uma pessoa imprimiu as imagens e colou nas paredes. Por causa disso, ela ficou três anos sem sair de casa, a mãe a prendeu, não deixava ela sair e ficava de vigia.
É horrível pensar que não evoluímos muito de lá para cá. Que as pessoas continuam julgando, apontando o dedo, criticando. Com esse projeto, meu foco é ajudar as pessoas que sofreram uma situação de constrangimento e foram julgadas, apontadas como culpadas. Quero mostrar à sociedade que temos que abrir os olhos. Minha vontade é gritar para todo mundo ouvir: 'Você não é culpada', assim como eu não fui."
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