A história de representatividade por trás da Vanity Fair com Viola Davis
Beleza negra, e, ao mesmo tempo, ineditismo e resistência. A capa de agosto da revista Vanity Fair com a atriz Viola Davis, que repercutiu nas redes sociais nesta terça-feira, reúne esses e outros valores que apontam como se dá, historicamente, a inserção de pessoas negras em publicações (e ambientes) da moda e da beleza. Desta vez, a presença de Viola foi duplamente celebrada, já que esta foi a primeira capa em que um negro esteve também por trás das lentes. O clique foi feito pelo fotógrafo Dario Calmese.
Em meio ao clima de celebração, Viola, Dario e a própria editora da revista, Radhika Jones, deram seus depoimentos sobre a escolha. Eles revelam como, por trás da imagem icônica da atriz, há um histórico de falta de representação que, apenas hoje, está sendo reparado.
Capa da Vanity Fair com Viola Davis
Na carta aos leitores da edição julho/agosto, Radhika adianta que, durante a entrevista, Viola sinalizou que a Vanity Fair teve "um problema no passado em colocar mulheres negras nas capas". A própria editora admite a questão e contabiliza o lapso de representação negra na publicação: em 35 anos (de 1983 a 2017), apenas 17 pessoas negras foram a imagem da revista nas bancas.
Ou seja, o que está por trás da capa de Viola — e do registro inédito de Calmese — é a invisibilidade de mulheres negras. Não à toa, em uma publicação no Instagram, o fotógrafo fez questão de dizer que sempre estiveram na linha de frente, mas nem sempre foram vistas; e dedicou seu trabalho a elas.
"Obrigado a todas as mulheres negras que se sentiram invisíveis, apesar de estarem na linha de frente de todas as lutas. Nós vemos você. Vocês são amadas, poderosas e são bonitas. Isto é para vocês".
De acordo com um perfil de Calmese publicado no The New York Times, até mesmo a pose proposta para Davis — em que ela aparece de costas, com a mão próxima ao quadril — é uma forma de reescrever a história de homens e mulheres negras nos Estados Unidos, marcada, assim como no Brasil, por um sistema cruel de escravização.
Davis, nesta posição, está fazendo referência à imagem "Costas açoitadas", de 1863, em que o escravizado Peter Gordon, em Mississipi, aparece com o corpo machucado. A imagem se tornou uma importante bandeira para os abolicionistas na época.
Para além da representação, na entrevista, Davis aborda ainda o fato de que a autoestima de mulheres com pele escura nem sempre é valorizada na sociedade. Por muito tempo, aliás, o mercado da beleza sequer tinha produtos para que as mulheres não ficassem com a pele acinzentada — como já denunciou a modelo Naomi Campbell, se referindo a quando foi capa da Vogue Itália, em 1988.
Pele negra, equipes brancas
Além de Calmese, a equipe contou com mais uma pessoa negra: a hairstylist Jamika Wilson. O espaço de representatividade, contudo, ainda denota falta de equidade racial: a Harper's Bazaar, por exemplo, só teve uma editora-chefe negra, Samira Nasr, neste ano, em 153 anos da publicação.
A Vogue deste mês, que traz a ginasta Simone Biles na capa, também foi alvo de críticas por uma questão: as fotos foram feitas por Annie Leibovitz, fotógrafa branca, que, para algumas pessoas nas redes sociais, deixou a pele de Biles mais opaca na edição de imagem — o que, para eles, não aconteceria se o fotógrafo tivesse o mesmo tom de pele da fotografada. Em setembro de 2018, a Vogue havia contratado pela primeira vez um fotógrafo negro, Tyler Mitchell, para registrar a capa de Beyoncé. O ineditismo rompeu uma hegemonia de 126 anos de profissionais brancos clicando para a publicação.
No Brasil, há outros movimentos de valorização de mulheres negras em revistas que são direcionadas ao público feminino. A última edição da Vogue, por exemplo, estampa a cantora Teresa Cristina. Além das fotos, há uma capa produzida pelo artista Samuel Saboia que, nas redes sociais, celebrou o fato de "ver corpos como o meu não ocupando mas fazendo parte, de forma orgânica e sincera esses outros espaços".
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