Peegasm: segurar o xixi para ter mais prazer pode afetar sua vida sexual
Uma mania feminina aparentemente inofensiva tem ganhado muitas adeptas: reter o xixi o maior período de tempo possível para, ao enfim urinar, sentir um prazer semelhante ao do orgasmo. Esse modismo, porém, oferece riscos à saúde que vão desde infecções urinárias de repetição até uma musculatura pélvica deficiente que pode afetar a sexualidade. Inconscientemente o corpo naturalmente pratica o "peegasm" - algo como "orgasmo do xixi", em inglês, quando, por necessidade (leia-se sem banheiros por perto) adiamos o "fazer xixi" o máximo possível. Quando finalmente urinamos, é possível que uma onda de prazer tome conta do corpo mas há uma grande diferença em torná-lo constante e consciente
Segundo Lilian Fiorelli, uroginecologista do Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo (SP), a anatomia feminina favorece a sensação prazeirosa ao fazer xixi após deixar a bexiga bem cheia. "O clitóris fica bem próximo da região da uretra. Temos a parte visível dele, a cabecinha, e logo depois, a abertura da uretra. Internamente, o clitóris se divide em dois bulbos. Todo esse primeiro terço da vagina é repleto de terminações nervosas bastante sensíveis a qualquer estímulo", conta. "A associação com algo gostoso, porém, está nossa cabeça", completa.
Para compreender melhor como funciona essa percepção, é preciso entender como a bexiga trabalha. Ela está conectada a um setor do sistema nervoso chamado SNA, o Sistema Nervoso Autônomo, que se divide em duas partes: SNA Simpático e SNA Parassimpático. De acordo com o médico sexologista José Carlos Riechelmann, presidente do Departamento de Medicina Psicossomática da APM (Associação Paulista de Medicina), essas duas divisões do SNA agem como um sistema de gangorra, executando funções contrárias um ao outro: quando um domina, o outro desliga, e vice-versa. "Quando os dois sistemas estão em equilíbrio, ou seja, a gangorra está no nível horizontal, sentimos uma sensação de 'nada'. É uma espécie de 'silêncio' do corpo ou 'estado de bem-estar'. O próprio processo de viver impede que esse 'estado de bem-estar' dure muito tempo, pois a queima dos alimentos dentro das células não para nunca e os resíduos são eliminados por fezes, urina, etc.", explica.
O sistema dos órgãos ocos como a bexiga é feito de espaços de armazenamento e de anéis musculares chamados esfíncteres que abrem e fecham a entrada e a saída desses depósitos. Enquanto o SNA Simpático fecha os esfíncteres e relaxa as paredes do depósito, permitindo que o espaço dentro do órgão fique cada vez mais cheio, o SNA Parassimpático faz o contrário: contrai as paredes do órgão e abre a "porta" fazendo o esvaziamento acontecer. "Esse movimento da gangorra Simpático-Parassimpático provoca um reflexo no sistema nervoso, envolvendo contração e relaxamento de vasos sanguíneos da pele e dos músculo que arrepiam os pelos, fazendo a pessoa sentir uma onda passageira, de curta duração, que percorre o corpo todo, com sensações de arrepio, calafrios, calor e/ou tremores leves e ligeiros em braços e pernas. O que foi apelidado de 'peegasm' ou 'orgasmo do xixi' nada mais é a do que a descrição médica da sensação de alívio", afirma Riechelmann.
Experiência sadomasoquista?
É importante perceber a diferença entre alívio e orgasmo. No primeiro, quanto maior o tempo de desconforto e sofrimento, maior o alívio do retorno ao equilíbrio. "O orgasmo não precisa de sofrimento prévio para acontecer. Pelo contrário, acontece depois de um período de excitação, que, por si só, já é uma experiência agradável. Não há nenhum incômodo nem é necessário sofrer antes do prazer. Nesse sentido, a prática do 'peegasm' poderia ser entendida como uma experiência sadomasoquista, onde o prazer é substituído pelo alívio depois do sofrimento", diz José Carlos Riechelmann,
Muitas mulheres, realmente, relatam achar mais gostoso transar com a bexiga cheia do que com ela vazia. Durante a excitação erótica acontece a ativação de alguns centros cerebrais que estavam desativados antes de o sexo começar e que modificam a percepção da experiência sensorial dos órgãos sexuais. "Num primeiro momento o toque no clitóris é percebido como um 'choque' incômodo, mas quando os centros cerebrais são ativados é percebido como 'tesão'. Essa mudança cerebral causada pela excitação erótica pode fazer uma bexiga cheia ser percebida como um reforço da sensação sexual, e não como incômodo", explica o especialista.
Apesar de prazeirosa, essa prática não é recomendada. "Para as mulheres que desejam uma sensação diferente na hora do sexo, o ideal é praticar exercícios de Kegel ou consultar uma fisioterapeuta pélvica. Além de exercitar a musculatura, elas aprenderão a contrair e retrair a vagina de um modo que propicie benefícios para o sexo, sem comprometimento à saúde", diz Débora.
Alívio forçado e muito arriscado
Todas as pessoas sentem esse "micro peegasm" quando urinam, mas muitas mulheres vêm forçando esse movimento de gangorra até extremos não fisiológicos para experimentar a sensação de grande alívio após um grande desconforto. "Na prática significa deixar passar o limite do esticamento da bexiga cheia para experimentar uma sensação mais forte de alívio, com mais arrepios, mais calafrios e mais ondas de calor ou frio. Se isso acontece muito raramente, quando por acidente estamos num lugar sem banheiro disponível e temos que aguentar a bexiga encher mais que o normal, tudo bem. No entanto, provocar isso com frequência é intensamente prejudicial", afirma sexologista.
Uma maior incidência de infecções urinárias, segundo o urologista Danilo Galante, de São Paulo (SP), é o primeiro risco. A urina costuma eliminar bactérias do sangue e outras que acabam atingindo, via uretra, a bexiga. Reter o xixi por longas horas permite que essas bactérias tenham tempo para se reproduzir aos milhares, provocando infecções. "Se isso torna-se um hábito, há ainda o risco de distender a bexiga. Com isso, ela nunca se esvazia por completo. Outro perigo é a pressão exercida pela bexiga cheia afetar o ureter e o rim, causando uma nefrite", alerta. E se isso acontecer repetidas vezes pode levar até o extremo de uma insuficiência renal e, consequente, necessidade de transplante de rins.
Outro perigo é uma distensão de musculatura de todo o assoalho pélvico, região do períneo, que vai do osso acima do clitóris até o final da coluna vertebral, logo acima do ânus. "Com isso, há a possibilidade de a sexualidade da mulher ser prejudicada, pois essa musculatura é responsável pelas contrações na hora do sexo", fala a fisioterapeuta pélvica e sexóloga Débora Padua, especializada no tratamento de vaginismo e dor na relação, de São Paulo (SP), Ou seja: melhor seguir com as formas mais tradicionais de chegar ao orgasmo: sexo e masturbação.
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