Como Mariana Rios: mulheres falam da dor de sofrer um aborto espontâneo
A atriz Mariana Rios emocionou seus fãs recentemente ao comunicar que havia sofrido um aborto espontâneo. Era a primeira gravidez da atriz e estava sendo muito festejada pela família. Rapidamente muitas mulheres se pronunciaram sendo solidárias, porque em algum momento da vida conheceram o sofrimento da perda de um bebê ainda durante a gestação. Esse luto nem sempre é legitimado pela sociedade, e para muitas mulheres e homens é um sentimento estranho que mistura tristeza com frustração.
A seguir, veja histórias de quem já passou por isso e o que fazer para acolher quem ainda está lutando para superar uma perda dessas.
"Sou mãe de quatro, mas as pessoas acham que sou apenas de uma"
"Decidi que queria ser mãe aos 30 anos e foi uma escolha consciente. Preparada e com todos os exames normais, demorei cinco anos para engravidar. A minha primeira perda foi com sete semanas de gestação e sem nenhuma dor, apenas um pequeno sangramento e o filho tão amado e esperado se foi, sem ao menos ter vindo. Depois de três meses engravidei novamente e tive a minha filha, que hoje tem quatro anos. Quando ela tinha dois, engravidei de novo e era uma gravidez normal, sem nenhuma queixa. Com 11 semanas, sem sangramento nem dor, recebo a notícia que o bebê parou de evoluir e que poderia fazer uma curetagem ou esperar o corpo agir. Decidi pela segunda opção. Foi uma espera dolorosa de três semanas até que o corpo decidisse expulsar. Depois mandamos pra análise pra saber se tinha algum problema, e mais uma vez nada foi detectado e nenhuma explicação pra o que ocorria. Além da dor do luto, o pior são ouvir comentários do tipo 'agradece a Deus, pois pode vir uma criança com problemas' ou 'logo vem outro aí e você nem vai lembrar' - como se fosse um brinquedo que se escolhe em uma loja. Um ano depois disso, sofri um aborto muito dolorido, que me deixou com marcas na alma. Hoje sou mãe de quatro, sendo três anjos, mas as pessoas acham que sou mãe de uma." Hilka Guida, 39 anos e sou assistente social
"Parecia que eu estava parindo"
"Eu descobri que estava grávida depois de terminar um relacionamento, tinha 37 anos. O meu ex quis voltar e eu aceitei, mas estava gastando muita energia para retomada daquela relação e isso acabou causando tensão. Esse retorno não deu certo e voltei para a minha casa. Aí sim, comecei a curtir a gravidez. Sou muito atenta com tudo e eu qualquer tipo de sintoma do meu corpo, percebo logo. Lembro como fosse hoje quando percebi um sangramento incomum. Estava para virar três meses de gestação. Fui para o hospital e na ultrasonografia foi constatado que o coração do bebê não apresentava batimentos. O meu ex estava comigo. Quando a pessoa que estava fazendo o exame falou isso, foi uma comoção, eu e ele começamos a chorar muito. A médica perguntou se eu queria fazer uma curetagem, mas preferi deixar a natureza agir, até porque o meu caso foi de aborto retido, ele estava morto dentro de mim. Quando finalmente aconteceu, foi uma dor de parto, parece que eu estava parindo, mas fui guerreira. Sofri a noite inteira com dor, mas no dia seguinte estava bem. Fiquei triste, mas interpretei de uma maneira que fez sentido para mim. Não era o pai que elegi para ser pai do meu filho e pensei que Deus colocaria no caminho o melhor pai. Hoje estou com um companheiro maravilhoso e na hora que o filho vier, biológico ou adotado, virá com muita alegria" Maria Lopes, 41 anos, funcionária pública
"Homens também sofrem muito essa perda"
"O meu primeiro aborto espontâneo aconteceu aos 31 anos, dois dias depois apóso ultrassom que apontava que estava tudo bem. Acordei com um sangramento e perdi. Foi muito triste, porque já tinha contado para minha família. Logo descobri que era normal perder na primeira gestação e me conformei. Depois de uns três meses, engravidei de novo e quando estava com dez semanas, não senti nada de incomum e descobri a perda durante um exame. Dessa vez foi mais cruel, porque já tinha escutado o coração do bebê. O médico pediu para eu deixar eliminar, mas não deu certo e precisei fazer uma curetagem. Depois disso, minha vida foi uma loucura. Fui a três médicos, fazia um monte de exames e não descobria nada. Chegaram até a falar que o problema era com meus óvulos. Perdi mais três bebês, bem no início da gestação. Mudei de médico até descobrir que meus hormônios estavam todos bagunçados e também tinha endometriose. Então, fiz tratamento e consegui engravidar da minha filha. Dois pontos que gostaria de falar: o primeiro foi que demorei a achar médicos que realmente se dispuseram a ver meu problema. Muitos foram frios e falavam só que aborto era normal. O segundo é lembrar que homens também sofrem muito essa perda. Todas as atenções ficam voltadas para a mulher, mas vi como meu marido sentia e sofreu comigo em todas as perdas." Lívia Aragão, 41 anos, assessora de Comunicação.
Dor e recomeço
A psicóloga Larissa Rocha Lupi, 36 anos, fundadora do projeto Do Luto a Luta - apoio à perda gestacional e neonatal - sabe falar com propriedade de todo esse processo. Ela perdeu um bebê no quinto mês de gestação, em decorrência de uma má formação. Um pouco antes sua irmã, Clarissa, também sofreu um aborto espontâneo. "Somos gêmeas, ambas estávamos em uma segunda gestação, ambas vivenciamos isso no mesmo hospital e com a mesma falta de preparo e de cuidado."
Ela lembra que foi vítima de vários equívocos, desde receber o kit de boas-vindas do bebê no hospital até ser colocada no mesmo ambiente das famílias felizes que acabavam de ter uma criança, com direito a escutar o choro do recém-nascido."Era muito constrangedor para todos, eu por manifestar meu pesar e os outros ao mostrar a alegria, percebiam que tinha algo estranho comigo, mas não ousavam perguntar", recorda.
No grupo de apoio que fundou, Larissa oferece algumas instruções para quem convive ou deseja acolher um casal que está em luto gestacional:
1. Não se pode presumir o que é melhor para mãe ou para o casal. O luto é um processo singular. É preciso perguntar o que eles querem e se abrir para o diálogo. Não se sabe a crença, os valores e como eles gostariam de se despedir desse bebê.
2. Não faça comparações do tipo: 'fulana perdeu com menos tempo, foi melhor assim'. Dor não se compara, não se mede, não se julga, só se acolhe.
3. Pergunte o que o casal deseja fazer com os pertences do bebê, se querem doar, dar para a família, ter algo como lembrança. A decisão é deles. Da mesma maneira, eles podem decidir ficar longe do quarto que seria do bebê alguns dias ou não.
4. Evitar frases como "Depois vem outro e você nem vai lembrar", "isso acontece com qualquer um", "foi melhor assim, poderia vir doente".
5. Não crie uma pressão para uma nova gestação. Cada um tem seu tempo. Não se vai viver em função de ter mais um filho. Cada um pode dar um novo significado para sua vida, até mesmo decidir não ter mais.
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