"Atacar e se desculpar não resolve", diz jornalista que processa Bolsonaro
No início da live de ontem, no canal do Youtube, Jair Bolsonaro (sem partido) leu uma nota com um pedido de desculpa à jornalista Bianca Santana, colunista de Ecoa, dizendo que ela não é a autora de uma matéria a que se referiu publicamente em 28 de maio e que, para ele, era parte de "fake news".
Pela menção ao seu nome, a jornalista escreveu um texto dias depois e entrou com ação judicial com pedido indenizatório por danos morais contra Bolsonaro. Ela diz que, na semana em que foi citada por ele, levantava a discussão, por meio de texto publicado e discussões públicas, sobre as vantagens que Bolsonaro poderia dar a mandantes do assassinato de Marielle Franco e Anderson Gomes caso as investigações fossem federalizadas (o que não aconteceu).
Mesmo com a retratação do presidente, ela afirmou que manterá o processo - e, para Universa, explica o porquê.
Entre outros efeitos, Bianca explica que dar seguimento à ação colabora para a proteção à liberdade de imprensa. "O presidente é o que mais ataca jornalistas no Brasil. E isso não se resolve com um pedido de desculpa em um caso. Uma possibilidade de ele ser condenado na Justiça pode inibir essa prática", resume.
A advogada e presidenta - como prefere ser chamada - da comissão de Igualdade Racial da OAB-PE Manoela Alves faz coro à fala. "Ainda que ele diga que está arrependido, a postura de ataque a jornalistas virou uma praxe do governo Bolsonaro. Penso que a desculpa não terá tanto peso no processo porque é uma conduta reiterada dele", analisa.
"E quando Bolsonaro falou o nome dela na live, que é o meio que escolheu como oficial, estava ali no papel do Estado. Espero que quem julgar o processo aja em consonância com o fato de que enquanto presidente da República, deveria pautar suas ações sabendo que têm um peso muito maior".
Bianca Santana processa Bolsonaro por danos morais
Bolsonaro reconheceu o erro ao atribuir reportagem sobre "PT tem propaganda barrada pelo TSE" à jornalista. Para ela, o posicionamento oficial teve uma "simbologia importante", que atravessa questão de identidade, liberdade de imprensa e de expressão e mobilização jurídica para garantia de direitos.
Acho simbólico que as desculpas tenham sido a mim, mulher negra, e espontaneamente.
"Em 2019, ele pediu à deputada Maria do Rosário, mas por ordem judicial", diz. "Também acho significativo que tenha sido nesse momento político, e para mostrar a força das mulheres negras, especialmente quando estão organizadas coletivamente".
Santana diz ainda que Bolsonaro ter desmentido a associação a seu nome suscita a possibilidade de sucesso quando entidades dos movimentos negros e de direitos humanos entram na justiça para garantia dos direitos.
"E, para jornalistas/quem produz conteúdo, é sobre o direito à liberdade de expressão. Não podemos receber acusações de que estamos noticiando algo falso, quando não estamos".
A ação
Duas das três medidas práticas solicitadas na ação judicial já foram cumpridas por Bolsonaro: a retratação pública e a retirada do vídeo em que ele cita Bianca Santana das plataformas.
A equipe de cinco advogados que representam a jornalista - que também está sendo assessorada pela Coalizão Negra por Direitos - ainda pede indenização de R$ 50.000. A quantia, caso ela ganhe o caso, será destinada inteiramente "ao Instituto Marielle Franco, para projetos dedicados à luta por verdade, justiça e pela memória de Marielle", diz o documento.
"Após avaliação do grupo jurídico da Coalizão, decidimos que a ação deveria ser individual por danos morais. O grupo estudou o caso por entendermos que tem a ver com o texto que eu havia publicado sobre a federalização do caso de Marielle".
Sheila de Carvalho é uma das advogadas que concebeu a peça do caso e acredita que, se houver êxito, será criado um parâmetro positivo para profissionais de comunicação que tiverem o mesmo direito violado. "Cria jurisprudência, porque os ataques que Bolsonaro faz a jornalistas nas lives são sistêmicos".
A indenização, ela diz, tem caráter educativo. "Ninguém quer lucrar com a ação, a ideia é que ela sirva como mecanismo para que isso não aconteça mais. A decisão de destinar à memória de Marielle, por sua vez, se dá porque ela também foi uma mulher negra, alvo do bolsonarismo, e porque o texto de Bianca era sobre a responsabilidade daqueles que estão perto do presidente da República no caso Marielle".
Caberá agora à Justiça o entendimento do processo e se o valor indenizatório será cumprido. "A retirada do material do ar e o pedido de desculpa não tiram o dano causado à imagem e à honra de Bianca, que é jornalista conhecida, que assume a postura de denunciar a relação da família Bolsonaro com a milícia. Esse dano é imensurável", avalia Alves.
Universa pediu ao Planalto posicionamento para esta matéria a respeito do caso. Até a publicação da reportagem, a Presidência não retornou o e-mail.
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.