Filhos na quarentena: idades muito diferentes pedem acordos e parceria
O isolamento social não está nada fácil. Para quem tem filhos confinados em casa, a situação é ainda mais complicada, já que a energia da garotada é inversamente proporcional à limitação do espaço.
Quando a idade da turma é bem diferente, o dia a dia só não é enlouquecedor se houver ajuda mútua e companheirismo entre os irmãos. Na maioria das vezes, os pais precisam adotar algumas regrinhas ou fazer ajustes na rotina para que o período seja menos cruel e mais funcional.
Na casa da estilista e blogueira Marina Breithaupt, que comanda o Petit Ninos, são três filhos: Bárbara, 18; Theodoro, 10; e Amelie, 4 anos. Se antes a rotina de cada um já era bem diferente, conviver 24 horas por dia exige esforço e adaptação de todo mundo. Enquanto a mais velha se prepara para o vestibular de medicina, a mais nova vive uma fase bastante lúdica.
"A nossa prioridade é organizar direito para que todos tenham seus horários de estudos garantidos e a gente possa trabalhar também", diz Marina, que atua em contraturno com o marido Bruno, tanto para revezarem na atenção aos filhos como darem conta da rotina profissional. A caçula costuma acompanhar a mãe nas atividades domésticas, entre uma brincadeira e outra, enquanto os mais velhos estudam e o pai, trabalha, por exemplo.
"Tentamos manter o máximo de rotina possível e de atenção com atividades para ela também, evitando que se sinta abandonada", argumenta. Além disso, os irmãos se organizaram por conta própria e se ajudam nos assuntos escolares - Babi auxilia nas tarefas de Theo e Theo nas tarefinhas de Mel.
Vida social limitada
Além de criar um fluxo para que atividades de escola e trabalho funcionem, Marina conta que eles buscam privilegiar a vida social, dentro das limitações do isolamento. "Babi, no auge dos 18 anos e sem poder sair de casa, precisa da privacidade dela para conversar com as amigas, já que é tão jovem e está há tanto tempo sem vida social", observa a mãe.
Por isso, a família respeita demais o cantinho da garota, o que ocorre também com outros moradores da casa. "O espaço dela é meio que sagrado aqui. Theodoro também tem os momentos virtuais com os amigos: jogam, se falam por videochamadas ou WhatsApp", conta Marina.
Individualidade respeitada
Nesses momentos, ela ou o marido fazem alguma atividade com a pequena, para que os irmãos tenham o momento deles. Os pais também se permitem ter um pouco de paz, inclusive individualmente, seguindo o esquema de rodízio. "Temos nos revezado para que sempre um tenha a possibilidade de ter seu tempo em casa, no silêncio, tanto para trabalho como para relaxar mesmo. A gente se ama muito, mas essa convivência extrema nos atropela e, uma hora ou outra, é normal ter desgaste e estresse, não é?".
Segundo a psicoterapeuta Pollyana Esteves, respeitar a individualidade de cada filho reflete na formação individual. "Quando os pais conseguem fazer isso, essa criança aprende seu lugar no mundo, fortalece sua autoestima, seu amor-próprio, habilidades fundamentais para ter sucesso na vida adulta", afirma. De acordo com a especialista, não existe uma idade que peça mais atenção, pois todas são cruciais e requerem um olhar mais zeloso dos pais.
Companheirismo é tudo!
Quando a diferença de idade é bem grande, os mais velhos também assumem parte da responsabilidade e ajudam a segurar as pontas. É que acontece na casa de Silvia Cristina Zequim de Assunção. Ela é atendente nos Correios e precisa sair para trabalhar à tarde. Enquanto ela e o marido estão fora, trabalhando, é o filho mais velho, João Henrique, 17 anos, quem se encarrega pelos cuidados com o caçula Francisco, 4. "A única regrinha que criamos foi o João fazer as aulas de manhã, enquanto eu estou em casa, para dar atenção ao Francisco à tarde", comenta.
Seguindo o isolamento, o adolescente não tem saído para os passeios que tanto ama, assim como acontece com o garotinho. "O Francisco pede todo dia para ir na escola, para brincar no parquinho. O João inventa muitas brincadeiras para distrai-lo, quando o Francisco não tem as tarefas da escola para fazer", diz a mãe. Aliás, o mais velho aprendeu a cozinhar nesta pandemia, e tem como assistente o irmão mais novo, que adora estar por perto, dando uma forcinha no preparo dos pratos. "Estão sempre juntos e dividem tudo", celebra Silvia.
Ivana Lúcia Hilgenberg Guimarães Vieira, psicóloga e professora da Estácio Curitiba, afirma que ficar 24 horas por dia no mesmo espaço pode estar sendo uma enorme oportunidade de crescimento relacional e espiritual das pessoas. "Isso ocorre justamente por estarmos numa fase da civilização em que os ditames do mercado se sobrepuseram a tudo", argumenta.
Melhorando a convivência
Com ajuda dos especialistas Ivana Lúcia Hilgenberg Guimarães Vieira, Pollyana Esteves e Tito Lívio Ferreira Vieira, listamos algumas dicas práticas do que podem ser adotadas para garantir a boa convivência em tempo (quase) integral dentro de casa:
- É importante ter momentos prazerosos em família, com brincadeiras em grupo, jogos, refeições especiais, filmes e séries com todo mundo reunido. Isso permite fugir um pouco do clima tenso que a pandemia institui.
- Reserve um momento para cada um dos filhos, dando atenção exclusiva em algo que a criança ou adolescente goste e queira, faz com que se sintam acolhidos.
- Entenda que se trata de um momento atípico e permita que as regras e rotina sejam flexibilizadas ajudam a manter o clima mais leve.
- Filhos devem ter consciência que precisam assumir as próprias responsabilidades, desde estudar até ajudar em casa, de acordo com a idade de cada um.
- Os pais, por sua vez, precisam investir na gestão das tensões e conflitos, algo próprio da vida humana, intensificado em tempos de pandemia. E tudo começa por uma escuta verdadeira e interessada no que os filhos têm a dizer.
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