"Estamos salvando vida de mulheres", diz enfermeira; hospital tem homenagem
Há três dias um hospital de Recife virou alvo de críticas vindas de todas as partes do país por aceitar cumprir o que manda a lei e permitir que uma criança vítima de estupros em série pudesse interromper uma gravidez fruto de violência extrema.
Desde domingo, após uma tentativa de invasão, houve reforço na segurança, depois que seus profissionais precisaram trabalhar ouvindo agressões verbais vindas da rua. Criado em 1996, o Cisam (Centro Integrado Amaury de Medeiros) é referência em Pernambuco no atendimento a mulheres vítimas de violência sexual. O local realiza, em média, três casos de aborto legal por mês, além de funcionar como maternidade e recebe gestantes pelo SUS (Sistema Único de Saúde).
"Estamos salvando a vida de meninas e de mulheres, que sofrem violência sexual. A partir do momento que fomos contatados sobre a assistência à menina [do Espírito Santo], nos colocamos prontamente à disposição", afirma a coordenadora de enfermagem do Cisam, Benita Spinelli, dizendo que não se preocupa com as críticas, mas com a saúde das mulheres que são atendidas no hospital.
Ela conta que o hospital ganhou projeção em 2009, quando uma menina de nove anos, grávida de gêmeos, que foi estuprada pelo padrasto e interrompeu a gravidez no Cisam. Na época, a Igreja Católica excomungou parte da equipe que realizou o procedimento.
"Salvamos a vida dessa criança de dez anos. Do ponto de vista ético, moral, humanista, estamos tranquilos e confortáveis, pois fizemos nosso papel de instituição que é atender vítimas de violência sexual", afirma a enfermeira. "Estamos confortáveis por termos dado cumprimento à decisão judicial.
Queríamos que nenhuma mulher precisasse utilizar dos nossos acolhimentos, pois as mulheres deveriam ser respeitadas, mas como vivemos numa sociedade machista e patriarcal, passamos por esse tipo de vexame
Criança recebe presentes: "Voltando a ser criança"
A enfermeira afirmou que a menina se sentiu acolhida e segura pela equipe e que está sendo assistida pela equipe multidisciplinar. "Agora, podemos dizer que ela está voltando a ser criança. Ela trouxe alguns brinquedos, dois de pelúcia, mas recebeu muitos outros aqui e está brincando com todos eles. Recebeu muitos presentes população externa, dos nossos alunos e da nossa equipe", destacou Spinelli.
A criança ganhou presentes variados, como flores, chocolates, roupas, calçados, e muitas homenagens na porta do Cisam. Balões e cartazes com mensagens de apoio para ela e para a equipe foram amarrados às grades ao lado da porta de entrada do hospital.
"Está havendo uma solidariedade expressiva. Ela ganhou de tudo, de roupa a brinquedos, livros, chocolate. A mala vai voltar cheia. Estamos recebendo todas as doações que chegam", diz Benita.
Nós também recebemos dezenas de cartas de apoio e congratulações de toda sociedade. Isso nos mostra que fizemos o certo e estamos cumprindo com a proposta do nosso hospital que é atender mulheres vítimas de violência sexual
Um dos grupos que prestaram solidariedade foi a UBM (União Brasileira de Mulheres) no Recife. Nesta manhã, o grupo colocou balões coloridos na grade da frente ao hospital, após entregar uma cesta com chocolates de presente para a menina. "A gente trouxe a mensagem que o Recife não é isso [intolerância religiosa], o Recife é amor. A gente está junto pelo direito das mulheres e pelo direito de uma menina", afirmou Laleska Santos, presidente da UBM no Recife.
Enfermeira critica "balbúrdia"
Spinelli criticou o não acolhimento da criança no estado do Espírito Santo e chamou os protestos na porta do Cisam de balbúrdia.
"Esses protestos aqui na porta foram uma balbúrdia. Como a sociedade se manifesta contra um hospital? Tentaram arrombar para invadir o espaço, houve muito barulho, aglomeração, ficamos assustados", relata. "Mas, a acolhemos de braços abertos e estamos dando o melhor de nós para que ela consiga sair restabelecida, com todo zelo."
O hospital informou que não vai divulgar quando a menina receberá alta por questão de segurança e ainda aguarda instruções do governo do Espírito Santo sobre a viagem de volta.
"Somos serviços de referência e não é o primeiro caso de atendimento a crianças que são assistidas vindas de outro estado e também daqui mesmo. Estamos desde 1996 e aqui é uma universidade, por ser um órgão formador, atendendo mulheres na área da violência sexual, o governo entrou em contato para acolhermos essa criança. Demos o nosso melhor", reforçou a coordenadora da enfermagem do Cisam.
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