Ela criou a 1ª assessoria de casamentos afro do país: "Faltava identidade"
Formada em Administração de empresas, Adriana da Costa Viana entrou no mercado de assessoria de casamentos em 2012, quando o serviço deslanchava no Brasil, como atendente da empresa de eventos sociais de duas amigas. Do posto, foi promovida à assessora chefe e, depois, sócia da iniciativa. Pessoalmente, e como mulher negra, se preocupava em contratar fornecedores que também fossem negros — afroempreendedores.
Por outro lado, testemunhava no cotidiano histórias de noivas negras que iam a salões de beleza que não tinham base da cor da pele delas. Notava também que, por mais que a área de casamentos se valesse da ideia de oferecer serviços exclusivos para o "momento único" dos casais, nem sempre os tratava com acolhimento e sequer era inclusiva — os noivos se sentiam como se fossem apenas mais um contrato com as empresas do ramo.
A lacuna no mercado de festas e cerimônias, que faturou R$ 17 bilhões em 2016, de acordo levantamento da Associação Brasileira de Eventos (Abrafesta), e a vontade de se dedicar à vida e à história de outras pessoas negras fez com que Viana criasse a "Afrowedding", a primeira assessoria de casamentos afrocentrados do Brasil. Há dois anos, ela conecta fornecedores pretos e noivos pretos em eventos de celebração do amor.
Assessoria de casamentos afrocentrados: 'Afrowedding'
Para Universa, Viana conta que a Afrowedding surgiu de uma insatisfação com o fato de organizar e atender, até 2018, eventos de todos os tipos de público. "Eu me questionei se estava fazendo sentido. Já priorizava serviços de pessoas pretas, mas percebi que não tinha muita gente dedicada a isso no mercado. Decidi, então, que meu trabalho seria para fortalecer e apoiar a história e a vida de casais e empreendedores pretos."
No primeiro ano, a empresa não teve clientes. Em 2019, foram cinco. E para 2020 eram nove programados — todos foram remarcados para o ano que vem por conta da pandemia de coronavírus. Entre seus serviços, estão indicar fornecedores, como bufê, boleira, designer de alianças, roupas dos noivos, marcar reuniões com eles, visitar locais para a cerimônia e organizar as prioridades para que o afro casal tenha, de fato, a festa do jeito de que gostam.
"São mais de 30 profissionais que tenho em rede em São Paulo, entre fotógrafos, estilistas, da área de beleza". A assessora também atende no Rio de Janeiro, Brasília e já fez evento em Salvador. A maioria dos fornecedores, diz, é negra. "Mas há ainda alguns serviços mais difíceis de achar, como proprietários de espaços de festa."
A psicóloga Daiana Nascimento Appiah e o assistente de manutenção Joshua Osei Appiah disseram "sim" em fevereiro de 2019, em uma chácara no interior de São Paulo, e contrataram o trabalho de Viana para ajudar nos últimos detalhes do evento.
A escolha pela assessora de casamentos, diz a psicóloga, ajudou muito na formatação de uma decoração com estampas de origem africana, já que Joshua é de Gana, país da África Ocidental, e os noivos queriam resgatar a identidade estética relacionada à origem dele para a celebração. "O casamento era meio DIY, e a decoração das mesas ficou por minha conta. A Adriana me ajudou nisso e também na recepção dos convidados no dia".
A psicóloga diz que assim que viu as fotos no Instagram da Afrowedding, quis contratá-la. "Eu ia tentar me virar com ajuda de amigas, família. Quando vi as fotos dela, pensei: 'Quero'. E, depois do meu casamento, mais duas amigas de uma rede de pessoas negras que eu tenho ao meu redor também a escolheram."
Detalhes, sentimento e responsabilidade
À frente de todas as tarefas da Afrowedding, a administradora de empresa explica que presta atenção a detalhes que, por vezes, não entram no radar de organizadores de eventos para pessoas não negras. "Quando os noivos pensam um casamento em uma fazenda, por exemplo, é preciso pesquisar. História de fazenda é complicada", pontua, em referência à associação histórica desse espaço a escravização de negros. No Instagram @afrowedding_, a assessora dá dicas sobre o tema, além de publicar inspirações para ensaios fotográficos, maquiagem, vestido e cabelo, e histórias de amor afrocentrado.
O serviço oferecido a negros e com essencialmente atendimento feito por negros, diz Viana, é para que o protagonismo dos casais não seja diminuído em nenhuma etapa da organização da festa. Isso significa, por vezes, evitar que eles sejam vítimas de atitudes racistas na hora de fechar contrato com as empresas e os profissionais que trabalharão na cerimônia.
"Eu já passei por várias cenas de racismo, como coordenadora do evento. As pessoas me olhavam. Se isso acontece comigo, também acontece com os noivos na hora de pedir orçamento, de experimentar a gastronomia da festa", pontua.
"E não é que eles não teriam dinheiro para pagar. É que esse tipo de serviço não quer atender nosso público. Então, queremos dizer que, sim, somos a maioria e nos casamos".
"Recebo muitos depoimentos de noivas que se casaram há cinco ou dez anos, dizendo que na época sentiram falta de identidade, acolhimento. Quando ela é negra, por exemplo, é preciso priorizar contratação de maquiadores negros; é preciso entender se ela tem um cabelo trançado, se é careca."
O homem negro também tem opções de cuidados. "Eles sempre ficaram em segundo plano. Então, sugiro estilistas, barbearias, pergunto como vai ser o cabelo, se vai usar dread", aponta Viana. "Na fotografia, é necessário um profissional que não vá embranquecer as pessoas na imagem, algo que pode afetar os noivos para a vida toda. E casamento tem que ser lembrado com amor, com satisfação".
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