Ela enfrentou o preconceito e se casou com um homem que nunca viu
Você se casaria com alguém que nunca viu pessoalmente? A ideia pode até parecer loucura, mas foi o jeito que a governanta executiva residencial Renata Willems, de 40 anos, moradora de Niterói, no Rio, encontrou para concretizar e viver, ainda que à distância, sua história de amor com o motorista belga Frans Willems, de 50.
Ambos se conheceram em agosto de 2019 por meio de um site de relacionamentos e a conexão foi imediata, com conversas e chamadas de vídeo diárias. No entanto, quando a pandemia do novo coronavírus chegou, atrapalhou os planos de um encontro real, já que muitos países ainda não permitem a entrada de estrangeiros e turistas. Casar-se, então, foi uma alternativa para que Renata tivesse o direito de, como esposa e em meio às incertezas de quando as fronteiras irão reabrir, poder viajar à Bélgica o quanto antes. "A distância é cruel, todos os dias são difíceis. No dia do casamento foi um misto de emoções. Como assim me casei e meu marido não está aqui? É estranho, ainda não processei, mas estou muito feliz", diz ela.
Após ter vivido relacionamentos antigos conturbados, com brigas, agressões físicas e um aborto espontâneo, ela entendeu que era hora de arriscar em prol da sua felicidade; teve e ainda tem um certo medo e ansiedade naturais pelo tipo de situação que está vivendo e ainda foi julgada por familiares e amigos. No entanto, contou com o apoio de quem mais importava: o filho Raphael Pimenta, de 16 anos, que criou sozinha, e a mãe, Selma Alves, de 69. O plano, claro, é levar ambos para morar com ela e Frans assim que possível e começar uma etapa nova e mais feliz em sua vida.
Abaixo, Renata conta sua história:
"Conheci meu marido por um site de relacionamentos em agosto do ano passado, e o plano era nos encontrarmos pessoalmente no começo deste ano. Mas aí, veio a pandemia e isso frustrou nossos planos. No início eu estava bem despretensiosa, conversava com um, com outro, e quando estava quase desistindo de conhecer alguém, Frans me mandou uma mensagem. O que chamou minha atenção é que ele foi bem direto: disse que era divorciado, tinha quatro filhos e estava em busca de um relacionamento sério. Ele também se preocupou logo em saber se eu não era um fake, então, já no primeiro dia trocamos telefones e nos falamos por chamada de vídeo.
Começamos a conversar todos os dias e ele foi me conquistando, sempre perguntando como eu estava, era interessado e se preocupava comigo. Embora a gente não se conheça pessoalmente, eu acho que o conheço muito mais do que imagino. A decisão do casamento era algo que já vínhamos falando, era um desejo, porque não estamos em um momento pra brincadeiras, queríamos algo sério.
Não tivemos esse primeiro encontro pra amadurecer a decisão, e como as fronteiras entre os países estão fechadas, decidimos oficializar também para que eu pudesse viajar para a Bélgica. No mês passado, o país autorizou a entrada, para visitas, de pessoas casadas, então ter o documento em mãos me faz ficar mais segura e não ter problemas quando chegar lá. Procurei um cartório pra saber como seria o procedimento: eu precisava ter uma procuração e alguém que representasse o Frans aqui no Brasil, além de duas testemunhas. Também recebi uma ficha corrida do consulado da Bélgica, em que constava tudo sobre a vida dele: onde estudou, onde trabalhou, o que já fez, nome dos filhos, etc. Se em algum momento eu tive dúvidas, com isso, sabia que estava tomando a decisão certa."
NOVA CHANCE DE SER FELIZ
"Claro que às vezes penso: 'e se o beijo não nos conectar?' Porque isso é muito importante. E a mesma coisa no sexo, 'como vai ser? Será que a gente vai se entender?'. Mas nesse um ano, com todo o contato, dá pra ter uma ideia de como a pessoa se comporta naquele momento, percebi um romantismo, dele querer entender as coisas que gosto. Eu nunca tive essa reciprocidade com um brasileiro. Parece piegas, mas ele é uma pessoa magnífica. Temos uma convivência intensa, é estranho sentir saudade de uma pessoa que você nunca abraçou ou beijou, e eu sinto a falta dele imensamente. A gente convive, porque fazemos tudo junto, nos falamos toda hora e em todos os momentos, escolhemos até a casa onde vamos morar juntos com nossos filhos. Nos reconhecemos pelo olhar e pelo tom de voz.
Sei que não é uma decisão fácil (o casamento), mas quando o conheci, fazia dois anos que estava me recuperando de um relacionamento abusivo. Vivi, por um ano, com um cara que me afastou dos meus amigos, não me deixava ter convívio com minha mãe e o meu filho, além de ter sofrido muito com brigas e agressões. Um mês após eu ter conseguido me separar, descobri uma gravidez tubária (quando a gestação acontece fora do útero) e quase morri, porque no meio daquele tumulto, nem percebi que estava grávida e o feto morreu. Estava há quase duas semanas na minha barriga sem eu saber. Fui parar no hospital com uma hemorragia interna, tive que tirar uma trompa e um ovário. Então, foi uma cicatriz que ficou não só na pele, mas também na alma. Outro relacionamento falido foi com o pai do meu filho. Ele desapareceu quando eu já estava grávida de seis meses, porque descobri que ele tinha outra. Criei meu filho sozinha até encontrar o pai dele novamente, quando o Raphael já tinha 8 anos, e ele reconhecer a paternidade. Nesse tempo, não me envolvi com ninguém, tive um bloqueio. Quando o Frans apareceu, depois de todas essas decepções, pensei: 'Meu Deus, por favor, eu preciso ser feliz'."
PRECONCEITO E JULGAMENTOS
O racismo tem várias nuances. Ah, 'é o gringo que quer a negra', 'o que um cara loiro de olho azul quer comigo?', 'a negra que não quer se envolver com brasileiro'. Acham que estar com um estrangeiro é status, as pessoas fazem uma série de interpretações e não entendem que é sério. Eu tive relacionamentos com brasileiros e não deu certo. Me casei com o Frans porque o amo, não porque quero morar na Europa. Eu fui bem seletiva na hora de falar realmente que tinha me casado com um estrangeiro, porque só ouvia crítica dos parentes, que falavam que eu era louca de pensar em casar com um cara que não conheço. Mas podemos estar com a pessoa todos os dias e ainda assim não conhecê-la. Só ainda não o toquei, mas sei que o conheço muito, porque meu marido viu a Renata de verdade, o que sou por dentro. Ele me ama, me vê por inteiro e eu também. Eu o admiro demais com pessoa, é um ótimo pai, superdedicado, trabalha, e a família é a prioridade dele. Ele e meu filho se dão superbem, conversam sempre, assistem futebol juntos, ele lá e o Raphael aqui. Minha mãe também sempre me apoiou em todas as minhas decisões. Agora, estou no processo de renovar meu passaporte já com a certidão de casamento, e a ideia é ir ainda em outubro. Depois disso, vamos fazer a solicitação de um visto de reunião familiar, para que meu filho possa viajar também e, futuramente, minha mãe. Sei que dei o passo mais importante da minha vida, e estou focada em construir um relacionamento que seja para sempre".
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