Grupo contra católicas feministas tentou barrar vídeo do Porta dos Fundos
Por uma decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ), a ONG Católicas pelo Direito de Decidir, feminista e que atua na defesa aos direitos reprodutivos das mulheres desde 1993, não poderá mais usar o termo "católicas" no nome sob pena de multa.
A determinação é do TJ e o pedido foi feito pela Associação Centro Dom Bosco de Fé e Cultura, entidade conservadora católica fundada em 2016. A associação é a mesma que tentou tirar do ar o especial de Natal do Porta dos Fundos, em 2019, da Netflix, que precisou recorrer ao STF para manter a atração no catálogo.
A Católicas pelo Direito de Decidir é uma organização religiosa a favor do aborto nos casos previstos na lei brasileira, ou seja, em condições de estupro, risco de vida para a mãe e anencefalia do feto. No site oficial, a entidade diz que também atua no fortalecimento de grupos sociais como jovens, LGBTs e pessoas negras, "para construir uma sociedade plena de direitos e livre de preconceito e violência".
Na decisão, de 20 de outubro, o relator, desembargador José Carlos Ferreira Alves, disse que a atuação e a finalidade da ONG revelam "pública e notória incompatibilidade com os valores adotados pela associação autora e pela Igreja Católica de modo geral".
Em outro trecho da decisão, Ferreira Alves declara que "a liberdade de expressão não estará minimamente prejudicada (não é disso que se está a tratar), podendo a associação requerida defender seus valores e ideias (inclusive o aborto) como bem entender, desde que utilize nome coerente, sem se apresentar à sociedade com nome de instituição outra que adota pública e notoriamente valores flagrantemente opostos".
Valores católicos e aborto
No texto, a Associação Centro Dom Bosco de Fé e Cultura (CDB) argumenta que a ONG segue uma "agenda progressista e anticatólica em meio aos católicos, promovendo a descriminalização e legalização do aborto".
Diz ainda que "o uso da expressão 'católicas' é ilícito e abusivo no caso concreto, constituindo verdadeira fraude, pois sob o pretexto de defender os 'direitos reprodutivos das mulheres', pratica-se autêntica promoção de conduta que nada mais é que o 'homicídio de bebês no útero materno".
O texto contém 37 vezes a palavra "valor". Em uma das partes, o CDB diz que o fato de a ONG se intitular como católica gera prejuízo do sentimento religioso, valores e interesses dos fiéis.
O desembargador Ferreira Alves escreveu na decisão que a ONG Católicas pelo Direito de Decidir deve ajustar seu estatuto social, retirando o termo "católicas". Ele estabelece um prazo de 15 dias para que isso aconteça, sob pena de multa diária de R$ 1.000. A Católicas pelo Direito de Decidir ainda não disse se vai recorrer da decisão.
Em nota, publicada nas redes sociais na manhã de terça-feira (27), o grupo disse que não havia sido notificado oficialmente pela decisão do TJ-SP até então e que após o recebimento da determinação judicial, tomaria "as medidas cabíveis".
Disse ainda que "reitera o seu compromisso com a democracia e os direitos humanos, em especial com os direitos sexuais e direitos reprodutivos das meninas e mulheres, tão ameaçados na atual conjuntura política brasileira".
A reportagem de Universa entrou em contato com a ONG para comentar o episódio, mas a entidade ainda não se posicionou sobre o caso.
O Papa Francisco já se pronunciou sobre o aborto, em 2018, comparando a interrupção da gravidez à contratação de um "matador de aluguel".
Em 2019, em um Encontro internacional com o tema "Sim à vida: cuidado com o precioso dom da vida na fragilidade", ele disse que "a vida humana é sagrada e inviolável e o uso da diagnose pré-natal, para propósitos seletivos, deve ser fortemente desencorajado. O aborto nunca é a resposta ideal que as mulheres e as famílias buscam".
Em entrevista para Ecoa, no mês passado, uma das fundadoras do Católicas pelo Direito de Decidir, Regina Jurkewicz, disse que não há consenso sobre o tema no ambiente religioso.
"Já vi padres dizendo que a condenação ao aborto é um dogma da Igreja Católica. Isso foi considerado a partir de 1860, quando o papa declara que a vida é desde o momento da concepção e que tirar a vida em qualquer época é um homicídio, um pecado muito grave. Algo muito condenável. Mas esse posicionamento nem sempre foi assim. Santo Agostinho falava que, entre 40 a 80 dias, é que existe o que ele chamava de hominização, que é o momento que aquele ser que está ali, embrião ou feto, recebe a alma."
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