"Casei com o policial que tentou me multar e hoje temos sete filhos"
Costumo brincar que minha vida daria um enredo de novela das 21h. Nasci em Colatina, interior do Espírito Santo, mas, no ano de 2005, me mudei para Columbus, em Ohio, nos Estados Unidos. Fiz isso porque conheci um americano pela internet. Ele veio para o Brasil, namoramos um ano, nos casamos e, aos 19 anos, aceitei mudar de país em nome do amor. Logo engravidei, porém nossa união não se estendeu por muito tempo. A separação foi muito conturbada.
Meu filho tinha menos de 2 anos quando me vi solteira, em um país estranho e sem dominar o idioma do lugar. Já estava arrependida das minhas decisões quando conheci James, um policial.
Nosso primeiro contato não foi romântico. Para sustentar a mim e ao meu filho, eu trabalhava como garçonete em um restaurante mexicano. Um dia, durante um feriado, o lugar ficou cheio e saí com quase uma hora de atraso, porque não queria perder as gorjetas. Entrei no carro morrendo de pressa e, desacostumada à cultura local, ultrapassei os limites de velocidade.
Estava dirigindo quase no dobro do que era permitido. Em pouco tempo, um carro de polícia apareceu atrás de mim e fui obrigada a parar.
Notei que o policial que me abordou era de origem latina. Mesmo assim tentei explicar, em inglês, meus motivos para correr tanto. Em pouco tempo, comecei a chorar, porque estava ficando cada vez mais atrasada e só queria ir embora dali. Acabou que, vendo a situação, ele desistiu de me aplicar a multa, mas deu um aviso de que, da próxima vez que infringisse as regras, teria que pagar. Fui embora nervosa e com raiva, sem imaginar que um dia nos veríamos novamente.
O destino sabe o que faz: nos esbarramos mais duas vezes, sem combinar
Nosso reencontro aconteceu poucos meses depois, em um pub da cidade. Era um sábado: meu filho estava na casa do pai e fui para lá direto do trabalho, na companhia de uma colega. Meu dia tinha sido péssimo por causa de uma briga na casa do meu ex-marido. Não estou acostumada a beber, por isso, bastaram alguns drinques para que eu começasse a chorar na mesa do bar. Ela, então, concluiu que era melhor me levar embora, e eu concordei. Assim que chegamos na porta do pub, me deparei com um policial.
Bêbada, comecei a pedir a ele que me prendesse, dizendo que queria ser deportada para o Brasil — algo impossível, já que minha situação lá era completamente legal.
Minha amiga intercedeu e pediu desculpas, explicando que eu havia bebido demais e que estava passando por uma situação difícil.
Até aquele momento, eu não estava fisicamente interessada no tal homem uniformizado. Muito menos lembrava que nós já nos conhecíamos. Mas foi como se eu tivesse sido atingida por uma intuição fortíssima. Escutei uma espécie de voz interior me dizendo que ele seria meu marido. Gosto de pensar que foi Deus me avisando sobre o que estava por vir. Só então comecei a enxergá-lo com outros olhos.
Mas, na hora, todos esses sentimentos me pareceram uma grande loucura, tanto que fui embora. O destino, no entanto, não permitiu que nos separássemos: mais uma vez, nos esbarramos sem combinar, neste mesmo pub. E bastou que conversássemos com calma para que nosso romance engatasse. Ele me achou divertida e espontânea. Nos beijamos, trocamos telefone, almoçamos juntos e, na semana seguinte, começamos a namorar.
Em 2008, fomos morar juntos. Em 2010, engravidei. Levamos uma vida tranquila até 2014, quando uma série de eventos fez com que nossa família se multiplicasse da noite para o dia, como se já estivéssemos predestinados a isso.
Em menos de dois anos, adotamos mais cinco crianças
No Brasil, minha família vivia um drama. Um dos meus irmãos era usuário de drogas e faleceu. Ele tinha dois filhos, mas minha mãe não os conhecia, pois eles viviam longe. À distância, fizemos um esforço e conseguimos localizar a mãe das crianças, uma mulher alcoólatra, que tinha ainda mais uma filha, de outro homem. Conseguimos convencê-la a visitar minha mãe. No dia do encontro, foram todos jantar e, no meio da refeição, a viúva do meu irmão começou a passar mal.
Para a nossa surpresa, precisou ser hospitalizada. Em questão de dias, por complicações de uma cirrose, morreu.
De repente, minha mãe, na época com 70 anos, se viu sozinha com as três crianças. Passamos a fazer um esforço enorme para ajudá-la financeiramente, até que senti que a situação estava chegando ao limite e eu e James decidimos entrar com um pedido oficial de adoção, a fim de trazê-las para morar conosco, nos Estados Unidos. Encaramos todas as burocracias, os gastos financeiros e o tempo de espera. Até que finalmente pudemos buscar nossos filhos e passar a cuidar deles no dia a dia.
Achei que aquilo era o final, que nossa família estava finalmente completa. Estava esgotada por todo o processo e jurei para mim mesma que nunca mais passaria por um desgaste tão intenso quanto o da adoção.
Porém, a vida não quis que nós descansássemos: quando me dei conta, nós estávamos nos tornando pais de mais dois bebês.
Sem saber que estava grávida de gêmeos, uma moça jovem da cidade havia tentado praticar um aborto tardiamente. Ela passou mal e, no hospital, deu à luz as duas crianças, vivas e saudáveis. Um milagre. Temporariamente, o menino e a menina ficaram sob os cuidados da avó, uma senhora que frequentava a mesma igreja que eu. No entanto, ela foi diagnosticada com mal de Alzheimer e, portanto, perderia a guarda de ambos. Vendo o seu desespero, acabei levando os bebês para dentro de casa. O que era para ser um acolhimento temporário se tornou um lar. Desde então, somos nove.
Abri mão de muitos sonhos em prol da minha família. Em muitos momentos, sinto o cansaço e o peso das responsabilidades. Mas me lembro das dificuldades do passado, de sentar no chão da sala e chorar, questionando Deus o porquê de estar sozinha naquele lugar, tão distante da minha família. Hoje, sei que eu nunca estou só".
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.