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Mulher negra é vítima de racismo por black power ao tirar foto 3x4 em MG

"Fui ao banheiro, comecei a chorar, me senti humilhada", contou Sara Policarpo, de 25 anos - Acervo pessoal
"Fui ao banheiro, comecei a chorar, me senti humilhada", contou Sara Policarpo, de 25 anos Imagem: Acervo pessoal

Bruna Barbosa Pereira

Colaboração para Universa, em Cuiabá

23/11/2020 15h27Atualizada em 23/11/2020 16h28

A operadora de linha Sara Policarpo, de 25 anos, registrou um boletim de ocorrência após sofrer racismo por conta de seu black power em um estúdio fotográfico de Divinópolis, cidade mineira a cerca de 130 km de Belo Horizonte.

Sara contou à Universa que foi até o estabelecimento para tirar uma foto 3x4 dela e da filha, de três anos. No entanto, acabou sendo humilhada pelo cabelo crespo. O fato aconteceu na última sexta-feira (20), Dia da Consciência Negra.

A reportagem procurou o estúdio fotográfico, mas não obteve retorno até a publicação. Ainda segundo Sara, assim que chegou ao local, encontrou uma menina com cabelos crespos sendo presos pela mãe, e foi informada por ela que o fotógrafo havia afirmado que o cabelo deveria ser escondido para a foto.

"Quando foi a vez da minha filha, que tem o tom de pele mais claro e cabelos cacheados, não falaram nada. Ela tirou a foto com o cabelo solto, ninguém pediu para prender ou esconder. Pensei que talvez era coisa da minha cabeça. Mas quando chegou minha vez, mal me deixaram sentar e já pediram para ir ao banheiro 'desmanchar' meu cabelo", relatou.

Sara contou que, após ser impedida de tirar a foto por conta do black power, decidiu mesmo assim prender o cabelo, pois precisava dos documentos. A operadora de linha tentou questionar a situação, mas acabou desistindo.

"Falei que não era certo, que ninguém avisou que eu teria que mexer no meu penteado. Ele (fotógrafo) pediu para colocar todo para trás e esconder, para que não aparecesse na foto. Fui ao banheiro, comecei a chorar, me senti humilhada."

No entanto, quando retornou ao local das fotos, o fotógrafo teria informado que "não teria jeito" e que precisaria usar o Photoshop para tirar o cabelo dela da imagem. Sara resolveu se negar a aceitar a fotografia manipulada digitalmente e não conseguiu dar entrada nos documentos.

A vítima chegou a levar uma foto e pediu para cortá-la no tamanho indicado, mas foi orientada a tirar uma nova, pois uma portaria do Instituto de Identificação determina que até 70% da imagem precisa ser ocupada pelo rosto da pessoa.

"Falou que o UAI [Unidade de Atendimento Integrado, onde são emitidos os documentos de identidade] não aceitaria a foto com meu cabelo aparecendo, que eu teria que voltar nele e ele não perderia tempo tirando outra foto minha. Foi quando ele usou o Photoshop", explicou ela.

Sara afirmou que achou errada a atitude do profissional e que nunca havia passado por situações semelhantes ao tirar fotos 3x4.

"Moro em Itaúna (MG) e nunca passei por isso. Falei que não ficaria com a foto, fiquei triste por não poder tirar mostrando meu cabelo. Chorei demais. Fiquei triste por mim e pela filha da outra mulher, que passou pela mesma situação. Ela tinha apenas cinco anos e já foi obrigada a passar por situações como essa."

Para Sara, o Brasil ainda é um país racista, e afirmações contrárias são feitas por pessoas brancas que não passam por situações como a que ela e a criança passaram. Ela procurou uma advogada e pretende entrar com uma ação contra o estúdio fotográfico.

"O racismo existe, mas querendo ou não, só quem é preto mesmo sabe e passa por isso. Quem fala que não existe é quem tem tom de pele claro. As pessoas que são brancas têm que ajudar a acabar com racismo, que é algo que não foi criado pela gente, vem de muito antes", declarou.

Secretaria se pronuncia

Por meio de nota enviada à Universa, a secretaria estadual de Planejamento e Gestão de Minas Gerais informou que a UAI Divinópolis não possui qualquer vínculo com o fotógrafo denunciado por Sara. O caso será investigado pela Delegacia Regional.

A Polícia Civil de Minas Gerais e a Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão, que coordenam a UAI, reforçaram que são contrários a qualquer conduta racista. A Polícia Civil, responsável pela emissão do documento, também informou que o cabelo ou penteado não interferem na confecção do mesmo.