"Calma que vou colocar uma camisa": testamos as chamadas de vídeo do Tinder
Recentemente o Tinder disponibilizou no Brasil um novo recurso para que os usuários pudessem interagir: as chamadas de vídeo. Segundo as informações divulgadas pela empresa, o intuito da novidade é "ajudar quem quer conhecer o match melhor, mas ainda não quer compartilhar informações pessoais, como o número de telefone, por exemplo".
Eu, que sou heterossexual e vivo reclamando de ter sempre as mesmas conversas nos aplicativos de paquera, fiquei animada ao ver o ícone azul de uma câmera do lado direito da tela. Pensei que poderia ser uma forma menos monótona e burocrática de conhecer pessoas durante a pandemia — já que a vida dos solteiros não anda das mais fáceis. Na prática, conseguir alguém que topasse abrir a câmera do celular também acabou sendo trabalhoso, mas valeu a pena.
Desculpas esfarrapadas e gifs
Achei que não teria problemas para encontrar pessoas que também estivessem a fim de bater um papo olho no olho, mas logo percebi que não. Estava sem usar o Tinder há alguns meses e bastaram os primeiros matches para que eu me lembrasse das razões pelas quais o aplicativo pode ficar tão entediante: as conversas parecem ser todas iguais — e muitas delas não chegam a lugar nenhum. Comecei respondendo às mensagens de "oi, tudo bem?" um pouco sem jeito para sugerir que ligássemos as câmeras e em menos de uma hora já estava cheia de notificações, quase todas falando sobre os mesmos assuntos.
Depois de alguns minutos tentando engatar as conversas, desenvolvi uma tática: perguntar sobre o dia da pessoa. Se ela dissesse que estava trabalhando, eu logo respondia: "Ah, que pena, se não ia sugerir uma conversa por vídeo".
Achei que era uma forma mais sutil abordar o assunto. Mesmo assim, alguns pararam de responder. Outros usaram desculpas que soaram esfarrapadas para recusar, como: "Não curto redes sociais", "Agora não dá, tô acabado" e, a minha favorita, "Instalei o Tinder tem 10 minutos", seguido de um gif.
Para facilitar a abordagem, também escrevi na descrição do perfil: "Bora fazer uma chamada de vídeo?". Mas a primeira mensagem que recebi foi "Chamada de vídeo? Em pé ou deitado?". Achei a piadinha de mau gosto e desfiz logo em seguida o match.
Entre uma e outra tentativa frustrada, fui compartilhando as experiências com uma amiga no Whastapp. Ela comentou: "Você parece aqueles caras que pedem 'foto de agora' quando começam a conversar". Eu ri, porque foi bem assim que me senti.
Primeiro date: nada de empolgação
Conforme o dia foi passado, minha sorte aumentou e encontrei a primeira pessoa que topou. "Ah, legal. Claro, liga aí", ele escreveu. Só nessa hora entendi como a ferramenta funciona. Primeiro, você precisa clicar no ícone da câmera e confirmar que tem interesse em conversar. A pessoa do outro lado deve fazer o mesmo. A partir de então, o chat é liberado e algumas regras aparecem na tela, entre elas a de manter o respeito e evitar situações de assédio.
Quando estava prestes a completar a ligação, me toquei sobre a importância de uma boa aparência nesse primeiro contato, tanto que dei uma corridinha até a frente do espelho para passar um corretivo antes de atender.
Assim que passamos a dividir a tela, vi que ele estava em uma cadeira de escritório, com o celular apoiado. Tentei registrar o momento, mas por questões de segurança o Tinder não permite que nenhuma das partes faça uma captura de tela.
Para quebrar o gelo, ele iniciou a conversa desabafando sobre as experiências anteriores que teve no aplicativo, contando que se irritava com quem parava de responder do nada. Também me disse que era a primeira vez que conversava por vídeo. "Quando você falou eu achei meio esquisito, mas agora estou gostando".
Nos minutos seguintes, eu mais ouvi do que falei. Ele me explicou como funcionava sua rotina de trabalho como assistente de câmera, e o papo ficou mais sério.
Não achei que a conversa estava com cara de encontro, daqueles em que a gente flerta ou dá risada. Em pouco tempo, recebi um alerta de que a bateria do meu celular estava fraca e desligamos.
Segundo date: achei a conversa legal, mas fui excluída
Minha segunda experiência foi mais animada. Começamos a conversar no final da tarde: meu match explicou que tinha acabado de chegar do trabalho e aproveitei a deixa para sugerir o chat por vídeo. "Calma aí que eu vou colocar uma camisa", recebi de resposta. Dessa vez, o papo foi bem mais informal: eu sentada no sofá da sala, ele encostado na cama e fumando. Demos risada quando ele me perguntou se eu estava no Tinder há muito tempo e eu respondi que infelizmente sim, muito mais do que gostaria. Depois, falamos brevemente sobre questões sociais e contamos como estamos lidando com a pandemia.
Minha ex também é jornalista", ele comentou quando começamos a falar sobre trabalho, mas preferi não entrar no assunto de relacionamentos passados.
De repente começaram a chegar algumas notificações no meu celular: me atrapalhei e encerrei a conversa sem querer. Pedi desculpas por escrito no chat, mas não recebi resposta e, depois de algumas horas, nosso match foi desfeito — prova de que nem a distância consegue blindar os encontros de darem errado.
Terceiro date: desabafos sobre a vida antes de dormir
Para a terceira tentativa, já estava mais relaxada. Combinamos por mensagem de texto que ele me ligaria assim que terminasse de preparar o jantar. Por volta das 21h começamos a conversar e, dos três chats, foi o mais longo. Como ambos moramos sozinhos, partimos daí. Em tom de brincadeira, trocamos dicas sobre limpeza e arrumação e descobrimos um sonho de consumo em comum: aquele robozinho redondo que fica pelo chão, aspirando o pó da casa.
Em determinado ponto da conversa, falamos sobre como os acontecimentos de 2020 mexeram com nossa saúde mental. "Eu me reuni com um pessoal do trabalho, mas não me senti seguro. No dia seguinte, acordei com a garganta pegando e uma falta de ar esquisita. Precisei fazer o teste de Covid. Mas deu negativo, foi tudo psicológico", ele contou.
Aos poucos descobri mais sobre sua personalidade: ele tocava guitarra, liderava uma equipe na área de tecnologia e, como eu, não via a hora de tirar férias. Gostei da conversa. Quarenta minutos depois, desligamos e recebi um "Legal falar contigo! Beijão e boa noite", seguido de um emoji feliz.
Conclusão: conversar por vídeo é fazer um teste drive de química
Assim que você termina o diálogo, o Tinder pergunta se estaria disposto a repetir a experiência com aquela pessoa. O aplicativo oferece também a alternativa de denunciar o usuário, caso você tenha se sentido desrespeitado ou assediado.
Apesar da trabalheira em encontrar pessoas dispostas a abrirem a câmera, achei o recurso útil, principalmente pensando na vida pós-pandemia, quando poderemos sair novamente em segurança.
Não foi o caso com nenhum dos três rapazes da matéria, mas já fui a muitos encontros nos quais acabei frustrada por achar a pessoa diferente do que parecia ser nas fotos. Também já aconteceu de não me sentir atraída pela personalidade ou tom de voz — e acredito que o mesmo já deva ter acontecido do outro lado. Tenho certeza de que uma chamada de vídeo, mesmo que fosse de apenas alguns minutos, poderia ter evitado esse tipo de situação.
Em tempos de isolamento, as conversas ajudam a driblar a solidão. Já pensando no futuro, elas são como um teste drive para saber se existe química entre as duas partes — e não custa nada tentar.
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