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Elas usam humor para contar como é viver com a bipolaridade e o borderline

A estudante de psicologia Alice Sayeg Burd e a publicitária Giuliana Cabral fazem conteúdo sobre saúde mental nas redes sociais de forma descontraída - Reprodução/Instagram
A estudante de psicologia Alice Sayeg Burd e a publicitária Giuliana Cabral fazem conteúdo sobre saúde mental nas redes sociais de forma descontraída Imagem: Reprodução/Instagram

Mariana Gonzalez

De Universa, em São Paulo

15/01/2021 04h00

Vídeos curtos, com danças divertidas e músicas virais — de TikTok e Reels — foi o caminho escolhido pela dupla Alice Sayeg Burd, de 22 anos, e Giuliana Cabral, de 24, para falar sobre saúde mental de forma leve e acessível.

Elas receberam diagnósticos de transtornos psicológicos há alguns anos — Alice tem borderline e Giuliana, bipolaridade — e, hoje, compartilham suas vivências e os conhecimentos que adquiriram desde então para ajudar outras mulheres na mesma situação.

"É muito mais fácil atingir as pessoas falando a língua delas. A gente procura músicas que estão bombando, dancinhas que estão bombando, e coloca conteúdo ali, para não ficar só na palhaçada", explica Alice, que é estudante do último semestre de Psicologia. "Vejo muitos perfis de psicólogos falando sobre transtornos, mas acabam sendo mais maçantes.".

Giuliana complementa: "Não adianta falar, tem que falar do jeito que as pessoas queiram ouvir, especialmente sobre um tema que ainda carrega tanto tabu".

Números provam que a fórmula tem dado certo: o último vídeo que elas gravaram juntas, no finalzinho de dezembro, falando sobre as diferenças em borderline e bipolaridade, foi visto por mais de 314 mil pessoas.

Em conteúdos que elas produzem sozinhas em seus perfis, elas falam de autoestima, contam como se sentem ou reagem a diferentes situações cotidianas, entre outros temas. Assista:

Identificação

Para a dupla, não faltam conteúdos sobre saúde mental e transtornos psicológicos nas redes sociais, mas falta conteúdo com o qual as pessoas se identifiquem de fato.

"Uma coisa é explicar o que é borderline, quais são os sintomas e tratamentos, outra coisa é dar a cara a tapa, contando sobre o seu tratamento, o seu dia a dia com o distúrbio. Falta um conteúdo mais humano, com o qual as pessoas se identifiquem", percebe Alice.

Giuliana completa: "Dá para entender, as pessoas têm muito medo de falar sobre isso, e não querem revelar por medo de serem julgadas. Quando recebi o diagnóstico e falei 'ok, sou bipolar, vou procurar conteúdo sobre isso', não encontrei um rosto ali, uma pessoa falando sobre a vivência dela. E pensei: 'Se ninguém faz, farei eu'".

Hoje, as duas acreditam estarem produzindo conteúdo em resposta às demandas que elas mesmas tinham há alguns anos, quando foram diagnosticadas.

"Quando você recebe um diagnóstico, se sente mal, muitas vezes nem sabem como viver com aquilo. Pensa: 'Sou uma pessoa horrível'. Foi assim comigo. As pessoas não acreditam que podem melhorar, que alguém com o diagnóstico pode estar bem, passar mais de um ano sem ter crises, ter um relacionamento estável. O que a gente tenta mostrar é que, com o tratamento correto, dá pra viver uma vida ótima", afirma Alice.

Estereótipos

Uma das publicações mais comentadas no perfil de Alice é um vídeo em que ela brinca com os estereótipos de uma pessoa com transtornos mentais, especialmente os reforçados pelo cinema, como em "O Iluminado" (1980) e "Garota, Interrompida" (2000).

"Quando eu recebi meu diagnóstico, em 2018, cometi o grande erro de pesquisar sobre ele na internet. Em nenhum lugar está escrito que pessoas com borderline costumam ter, também, características positivas. Não. Eu literalmente li que pessoas com borderline são monstros", lembra Alice. "É muito difícil ler isso quando você acabou de ser diagnosticada. Pensei que nunca ia conseguir ter um relacionamento estável, por exemplo. Hoje eu entendo que quem tem borderline é igual a qualquer outra pessoa, mas é mais vulnerável em relação a algumas questões".

E é justamente por conta dos estereótipos, completa Giuliana, que muita gente prefere não falar sobre o transtorno.

"No meu caso, por exemplo, as pessoas acham que ser bipolar é só mudar de ideia e de opinião a todo momento, e não é por aí. Mas você fica sem saco para explicar o tempo todo, muitas vezes pra gente que não quer entender, e fica refém da opinião alheia".

Busca por ajuda

"Recebo mensagens do tipo: 'Alice, quero me matar. O que eu faço?'". E a resposta é sempre a mesma: busque ajuda.

Quando começou a compartilhar detalhes de seu dia a dia com borderline, no entanto, a estudante de Psicologia não sabia lidar com os pedidos de ajuda dos seguidores e, de certa forma, se sentia responsável por eles. "Eu ficava muito mal, sentia que tinha obrigação de salvar a vida daquela pessoa", conta.

"As pessoas precisam buscar ajuda e não é com uma influenciadora, mas com uma psicóloga, uma psiquiatra. Eu não tenho esse papel, não consigo ser essa pessoa. Busco acolher, dizer que entendo a dor que ela está sentindo, e indicar os caminhos para ela encontrar profissionais que possam ajudá-la".