Mãe fala sobre a experiência de criar filho sem gênero
Há cinco anos, a norte-americana Kyl Myers, que vive na Austrália, decidiu que criaria seu filho sem usar a diferenciação binária de gênero — ou seja, sem designá-lo nem como menina, nem como menino.
Kyl e o marido, Brent, são adeptos da "educação criativa de gênero" (gender creative parenting). Eles criam Zoomer, 5, como "uma pessoa" ou "uma criança".
Em depoimento para o site australiano Mamamia, a mãe explicou suas razões para educar o filho dessa maneira e relatou como tem sido a experiência até agora.
Kyl Meyers é PhD em sociologia e autora de livros e palestras sobre o tema. Ela documenta a infância de Zoomer no Instagram e em sua produção acadêmica.
"Decidimos usar pronomes de gênero neutro para Zoomer até que ele pudesse escolher sozinho por qual pronome prefere ser tratado. Queremos que ele aprenda e explore todas as possibilidades de gênero sem expectativas estereotipadas ou restrições", diz.
Zoomer gosta de Lego, dinossauros e artesanato, escolhe os brinquedos e roupas sozinho e ultimamente tem preferido seu cabelo curto. Aos quatro anos, disse que gostava do pronome "ele".
"Acredito que gênero é algo que deve ser determinado pelo próprio indivíduo e que não há necessidade de ser designado no nascimento", afirma Kyl. "Quero que ele me diga quem ele é, e não o contrário".
Geração Alfa
Kyl, que se considera uma mulher queer, afirma que a geração Alfa, que contempla as crianças nascidas a partir de 2010, terá a maior fluidez de gênero da história.
"Sempre existiram pessoas de gêneros muito além do binarismo construído socialmente. Na última década, houve um aumento da conscientização sobre isso, da visibilidade e da afirmação do espectro de gênero", afirma.
"Essas crianças são os filhos dos Millenials, que tanto lutam por igualdade de gênero. Eu acredito que essa nova geração vai trazer a revolução e eu me sinto honrada em fazer parte disso", diz.
Segundo a autora, nossa sociedade cria meninos e meninas de maneiras diferentes, e essas diferenças repercutem durante toda a vida adulta.
"Os meninos são coagidos a esconder suas emoções desde muito cedo, virando homens que não sabem cuidar da própria saúde mental. Meninas são sexualizadas precocemente e ensinadas a confundir abuso com amor", exemplifica.
"Vejo como cada disparidade de gênero na vida adulta tem origem na infância e na socialização infantil baseada em gênero. Dessa forma, acredito que ao não divulgar o genital de Zoomer para todo mundo, as pessoas não vão agir conforme um script e oferecer só metade do mundo para ele."
"Essa maneira de criar me pareceu a melhor maneira de maximizar a autonomia de gênero e minimizar o tratamento machista ao meu filho", conclui.
Quando questionado por outra criança se é menino ou menina, Zoomer responde "sou uma pessoa". Segundo a mãe, as crianças costumam reagir normalmente e continuam brincando com ele.
"Diziam que ele sofreria bullying, que as crianças são maldosas. Criança só é maldosa se o adulto ensina. Cada vez mais, vejo crianças sendo educadas de maneiras libertadoras", afirma.
"Zoomer não é confuso sobre o próprio gênero como muita gente falava que seria. É uma criança consciente, confiante e extrovertida. Acho que Z. tem mais consciência de gênero do que os haters que me escrevem mensagens de ódio", provoca.
"Meu papel como mãe é narrar o mundo, romper estereótipos, deixar meu filho brincar, celebrar seus interesses e se expressar naturalmente", diz.
Haters
Por causa da educação libertadora, a família de Kyl é constantemente vítima de "haters", ameaças virtuais e até acusações de abuso infantil.
"Desde o nascimento do meu filho em 2016, milhares de estranhos querem opinar sobre a forma como eu o crio. Recebo mensagens de desconhecidos falando que meu filho devia ser tirado de mim", desabafa.
Mas, ainda assim, a luta vale a pena. "Me preparei para uma vida de batalhas e está valendo muito a pena. Não recebemos só ódio, mas também muitas mensagens de amor, apoio e entusiasmo", conclui.
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