Historiadoras falam de aulas que deram para Fiuk: "Está distorcendo"
Descontentes com o comportamento de Fiuk no BBB21, em que ele já interrompeu duas mulheres —Juliette e Carla Diaz—, e chorou lágrimas que andam dizendo serem falsas, internautas começaram a espalhar um post da historiadora Laís Roberta, que deu aula de feminismo para o cantor antes de ele entrar na casa, no fim de dezembro, e acusaram-na, entre outras coisas, de ter dado um roteiro para ele seguir no reality.
"Não podemos nos responsabilizar sobre como os alunos reproduzem o conhecimento passado", ela se defende, em conversa com Universa.
A assessoria de imprensa do cantor disse, em nota, que "todos nós estamos sujeitos a erros e não há mal nenhum em procurar conhecimento". A íntegra da nota segue no fim da matéria.
Na imagem compartilhada, pode-se ver que Fiuk tomou aula de body shaming, feminismo, construção de padrões de beleza e autonomia feminina. Na legenda, Laís explica: "Hoje dei minha primeira aula para o @fiuk e foi sensacional, que possamos abrir diversos diálogos e análises incômodos. Seguimos".
"Estão falando que nós passamos o 'script' pra ele, que nossas aulas eram em vão. Estão me chamando de 'ensinadora de branco' enquanto eu sou uma profissional da educação", relata ela.
"Queriam que eu desse um choque de realidade no Fiuk"
Laís não foi a única a dar aulas para Fiuk. Ela e a também historiadora Carol Sodré contam que foram procuradas pelo produtor do cantor para que ele tivesse aulas de História afrocentrada e antirracista.
"Eles queriam que eu desse um choque de realidade no Fiuk usando a História, porque ele, de fato, vive numa bolha. E a Laís foi contratada para falar sobre corpos e padrão de beleza", Carol descreve.
O objetivo da produção que as contratou, as duas apontam, era que Fiuk usasse seu privilégio para ser porta-voz de algo que fizesse sentido dentro do programa.
"Porque o homem branco, cis e hétero é mais escutado pelas pessoas. O que sai da boca dele é muito mais levado em conta do que sai da boca, por exemplo, da Camilla de Lucas, da Lumena e de outras mulheres que estão ali. Por isso achei que valeria a pena. Mas em nenhum momento nos chamaram para treinar o que ele iria falar no programa. Era para dar uma aula particular", observa Carol.
Laís lembra ainda que Fiuk é irmão de Cleo Pires, atriz e cantora que sofreu body shaming quando ganhou peso, e considerou importante que o artista não reproduzisse o que ela ouviu por muito tempo.
"Ele não poderia estar num lugar e reproduzir exatamente a mesma violência que a irmã sofreu. O print que viralizou foi a primeira de cinco aulas de uma hora e meia que tive com ele. Muitas pautas foram passadas", ela justifica.
Choro durante as aulas e distorção no programa
Foram nove aulas no total, com duração entre uma hora e uma hora meia, em que, por muitas vezes, as duas apontam, Fiuk chorou.
"Várias vezes ele ficou constrangido e com cara de choque. Ele foi pego revendo muita coisa que ele nem sabia que era privilégio. Ele chorava muito nas aulas, e chegou a dizer que não queria ser um Prior na casa. Mas não compete a mim falar se era forçado. Ele se mostrou bastante sensibilizado com os conteúdos. Acho que ele foi pego, no mínimo, de surpresa pela quantidade de informações que estava recebendo", conta Carol, citando o ex-BBB Felipe Prior, que teve atitudes machistas na casa.
Aula sobre família tradicional
Fãs do BBB comentaram nas redes que alguns gestos de Fiuk dentro do reality indicam que ele ou não aprendeu, ou esqueceu o que ouviu das profissionais. Numa conversa com alguns participantes, ele, que está sentado ao lado do cantor Projota, um homem negro, tenta explicar o que é a família tradicional.
O artista começa dizendo que um amigo lhe deu um livro em que continha a foto de um quadro que respondia bem essa questão. Sendo que o "amigo" é Carol Sodré, e ela não deu o livro, mas mostrou a pintura numa das aulas. Segue o diálogo:
"Ele [o tal amigo] me deu um livro para ler e fiquei bem chocado", começa Fiuk, que diz não lembrar o nome da obra.
"Uma pintura que representa a família tradicional. Bizarro. Vem primeiro o homem branco na frente, os dois filhinhos atrás, as mulheres da casa atrás, as duas brancas, e depois de um espaço, servos. Essa representação que a gente tem, tudo que a gente tem de referência do mundo, de bonito que as mulheres seguem, que homens seguem, são dos homens brancos europeus", ele conclui.
"Eu nunca indiquei livro pra ele"
O quadro em questão é do pintor francês Jean-Baptiste Debret (1768 - 1848), e ele não está no tal livro que Fiuk disse ter lido e que não lembra o nome.
"Eu nunca indiquei livro pra ele, até porque não daria tempo dele ler", explica Carol.
Ela diz que costuma falar sobre dois quadros do artista nas palestras sobre racismo ambiental. São eles "Um jantar brasileiro" e "Um funcionário a passeio com sua família". E a historiadora reproduziu o que já fala nessas palestras numa das aulas com Fiuk. Agora, muitos dos que conhecem seu trabalho estão atacando a profissional:
"Nós analisamos [esses quadros] para falar da construção do racismo no Brasil. Falamos de pigmentocracia e família tradicional brasileira. Ele [Fiuk] meio que misturou falas minhas e as da Laís e está distorcendo, e isso é o mais preocupante, porque na hora de apontar o dedo a corda sempre arrebenta para o lado mais fraco, e a gente está sendo exposta."
"Ele me interrompia o tempo todo"
Laís defende que as duas não deveriam ser culpadas pelas falas de Fiuk:
"Nós somos professoras e passamos um conteúdo de forma humanizada. Ele é um homem de 30 anos e responde por várias construções na vida dele. Não adianta nada ter cinco horas de aula com Fiuk e o que reproduzir na vida dele ser a personificação do que é. Não podemos nos responsabilizar sobre como os alunos reproduzem o conhecimento passado por nós."
O que também vem incomodando os consumidores de BBB é o fato de Fiuk interromper a fala das mulheres. Durante um debate sobre comida, ele não deixava a atriz Carla Diaz falar. Chateada, a artista até saiu de perto.
"Coincidentemente, fiquei incomodada porque nas aulas ele me interrompia o tempo todo. Não me deixava terminar uma frase. Só que fui contratada para fazer um trabalho", revela Carol.
Na avaliação de Laís, os homens de hoje têm ido a dois extremos: ou eles se posicionam como um grande machista e assumem essa identidade, ou vão para um lado totalmente desconstruído e ainda querem se apropriar dos nossos discursos.
"É o que o Fiuk acabou fazendo um pouco. Quis ser tão desconstruído que acabou dando aula de cultura eurocêntrica para o Projota. O homem que está em processo de desconstrução também acaba entrando nesse outro extremo, e quem está ligado no assunto fica desgastado. Além de não ajudarem, prestam um desserviço."
O outro lado
Em nota, a assessoria de imprensa do cantor informa que Fiuk vinha se preparando para alguns projetos profissionais, dentre eles um podcast e o BBB, e voltará com as orientações após sua participação no reality.
Explica ainda que foram poucos encontros, e que um dos objetivos foi ganhar mais aprendizado para abordar com seus convidados (do podcast) temas relevantes e também minimizar possíveis erros que poderia cometer sem a devida informação. Fiuk entrevistou artistas como As Baías, Adalberto Netto, Hanna Khalil, Marcela McGowan, entre outros. O podcast será lançado em breve.
"No mais, todos nós estamos sujeitos a erros e não há mal nenhum em procurar conhecimento, querer evoluir e buscar ser cada vez mais empático com assuntos importantes da nossa sociedade", finaliza a nota.
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