MC Ellu acusa DJ Marlboro de estupro; outras mulheres relatam assédio
Há uma semana, a funkeira MC Ellu registrou um boletim de ocorrência na 57ª DP de Nilopólis (RJ) contra o DJ Marlboro, a quem acusa de estupro e ameaças. Ela afirma que o crime aconteceu em 1988, quando ela tinha 17 anos. A artista, hoje com 50, conta que foi ameaçada na época e que continua sendo coagida por ele hoje, depois de formalizar a denúncia.
MC Ellu diz que pelo menos outras três mulheres a procuraram com relatos semelhantes envolvendo o mesmo DJ, que vão de assédio sexual a menores de idade, até abuso e estupro. Universa ouviu duas delas, que preferem não se identificar.
Em entrevista para Universa, MC Ellu lembra como o episódio marcou sua vida: por medo, deixou o Rio de Janeiro para viver com parentes em Belo Horizonte. O trauma acarretou anos de tratamento psicológico, uso de antidepressivos e uma tentativa de suicídio.
Há 33 anos, Ellu estava no início da carreira e se apresentava como sósia da cantora Janet Jackson quando fez um show no Clube Mourisco, no Rio de Janeiro. Depois da apresentação, ela conta que conheceu Marlboro, que lhe ofereceu uma carona. "Ele disse que ia me levar para casa, só que foi para um motel. Chegando lá, eu falei: 'Marlboro, eu sou virgem'. E ele: 'Não vai acontecer nada que você não queira'. Só que aconteceu sim, ele forçou uma barra e houve o ato", disse.
"Ele destruiu meus sonhos, até hoje tenho pesadelos"
"Esse foi um peso que eu carreguei por muitos anos. Tinha vergonha de contar para as pessoas o que tinha acontecido comigo. Quando meu filho cresceu [o menino nasceu de uma outra relação, quando Ellu tinha 24 anos], eu contei e ele só me deu apoio, me deu forças para buscar justiça. Liguei para o Marlboro, queria colocar uma pedra nessa história, aquilo estava me fazendo mal, e ele disse que não lembrava de nada.
Sempre fiz tratamento psicológico por conta da violência que sofri. É um trauma passar por um estupro. Agora falei: 'Chega, preciso contar essa história para que as meninas de hoje não caiam na conversa'.
Eu não me vendi. Primeiro ele me estuprou; depois, na hora de ir embora, quando eu comecei a chorar no carro, ele prometeu que ia me colocar em projetos da gravadora Polygram, para amenizar a situação, para me fazer ficar calada. Na época, falou: 'Não conta para ninguém, vai dar ruim para você'. Por medo, decidi ir morar com a minha avó em Belo Horizonte. Deus foi tão bom que eu consegui a duras penas gravar CD e DVD sem depender dele, nem de homem nenhum. Eu mesma fecho meus trabalhos.
Quero que ele pague pelo crime. Ele está tentando me desqualificar, dizendo que só estou fazendo isso para me promover. Você acha que isso vai me promover? Uma mulher negra, mãe solteira, contando que foi estuprada aos 17 anos. Ele destruiu meus sonhos.
Até hoje, acordo tendo pesadelos. Se eu não tivesse feito muito tratamento, como eu fiz, eu já teria me suicidado. Eu tentei suicídio uma vez, meu filho viu e me levou para o hospital. Aí eu caí em mim, decidi lutar. Ele não vai me prejudicar mais. Espero que a minha história sirva de exemplo para que outras mulheres não fiquem caladas, denunciem, e não deixem que um canalha atropele a vida delas, como aconteceu comigo"
Abuso sexual, assédio virtual, vítima menor de idade
Universa ouviu também outras duas mulheres que acusam Malboro, que preferem não se identificar. A primeira, que vamos chamar de Laura*, conta que foi convidada para sair com o DJ mesmo depois de informá-lo que tinha 15 anos. A segunda, que chamaremos de Camila*, afirma que recebeu um convite para fazer uma orgia na casa dele. As duas relatam que não conheciam o artista e os diálogos aconteceram pela internet.
Uma terceira mulher relatou ter sofrido abuso sexual por parte de Marlboro, mas, por medo de ser identificada, preferiu não dar detalhes à reportagem. Ela afirma que o DJ "é um homem muito perigoso".
Ontem, o DJ Rennan da Penha escreveu, no Twitter, que Marlboro teria "mexido" com sua esposa, Lorena Gallore, em 2019, também pela internet. Universa não conseguiu contato com Lorena até a publicação da reportagem.
Laura* conta que fazia a cobertura de eventos de funk para o site da emissora TV Cidade — fotografava, entrevistava famosos, sempre autorizada pelo pai. "Teria uma festa, em 2005, e me passaram alguns contatos para que eu conseguisse marcar uma entrevista. Um desses contatos era o MSN do DJ Marlboro, que ia tocar. Eu me apresentei, disse minha idade e perguntei se poderíamos fazer uma entrevista. Ele disse que sim, mas que eu teria que ficar no camarote durante o evento e sair com ele depois da entrevista", lembra.
"Por sorte meu pai é muito cuidadoso e sempre me deu abertura para conversar, então contei a ele. Na mesma hora ele pediu que eu cancelasse a entrevista e não falasse mais com o Marlboro". Ela continua: "Se eu fosse uma menina sem apoio da família, não sei o que teria acontecido".
Laura* afirma que "nenhuma mulher deve duvidar da outra" e espera que a denúncia de MC Ellu seja esclarecida. Ela acredita que ainda surgirão outras histórias semelhantes envolvendo o DJ.
Camila* passou por uma experiência de assédio semelhante poucos anos depois, em 2009, com a diferença que já era maior de idade. Durante uma visita a uma emissora de rádio, ela soube que Marlboro estava gravando seu programa e pediu para conhecê-lo, mas chegando lá foi tratada com indiferença pelo artista.
"Uma semana depois, chamei ele no Orkut, comentei que tinha visto ele na rádio e que tinha ficado chateada, porque era fã do trabalho dele. Aí ele pediu pra gente continuar o assunto no MSN, e me passou o endereço. Na época, MSN era como se fosse o WhatsApp", recorda.
Lá, ele perguntou se eu tinha amigas e se eu topava uma 'brincadeira' na casa dele, em Mangaratiba (RJ). A gente nunca tinha conversado e ele me chamou para fazer uma orgia. Eu me senti muito ofendida, foi constrangedor, me senti um objeto. E falei: 'Você está me confundindo com outras mulheres'. Cheguei a dizer que ele tomasse cuidado, porque outra mulher poderia denunciá-lo e prejudicá-lo na mídia, mas ele riu, desdenhando.
Quando leu a história de MC Ellu, na semana passada, Camila* decidiu fazer a denúncia do assédio ao 180. "Fiz para ajudar a Ellu, para dar ênfase à denúncia dela".
Tanto MC Ellu quanto Camila* e Laura* disseram acreditar que mais mulheres virão à tona com relatos semelhantes, de crimes sexuais envolvendo o DJ Marlboro.
O que diz a lei
Segundo a advogada Bruna Andrade, especialista em direitos da mulher e da população LGBTQ+, mesmo que Ellu tenha feito B.O. o crime já prescreveu e Malboro não seria processado. Hoje, o crime de estupro de vulneráveis prescreve em 20 anos. Existe um dispositivo do Código Penal que diz que o começo da contagem do prazo para a prescrição começa quando a vítima completa 18 anos. "Mas mesmo considerando o início da contagem em 1989, o suposto crime já está prescrito há bastante tempo. Por isso, o B.O. registrado por Ellu não tem nenhum valor, o máximo que ela pode conseguir é um processo contra ela por calúnia".
Existe um projeto de lei tramitando no Congresso Nacional que tem o objetivo de transformar os crimes de estupro de vulneráveis (menores de idade) em imprescritível. Porém o caso de Ellu também não se encaixaria. "Mesmo se aprovado esse projeto de lei, não se aplica a casos passados. Somente em casos da publicação da lei para frente", diz Bruna.
Outro lado
Universa procurou o DJ Marlboro por e-mail e pelo WhatsApp de sua equipe, mas não teve resposta. O espaço continua aberto caso ele queira se manifestar.
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.