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"Tatiane é mais que uma vítima de feminicídio: ela era minha melhor amiga"

Tatiane Spitzner (à esq.) com a prima, Bruna: "É uma dor que nunca sara" - Arquivo pessoal
Tatiane Spitzner (à esq.) com a prima, Bruna: "É uma dor que nunca sara" Imagem: Arquivo pessoal

Camila Brandalise

De Universa

09/02/2021 04h00

Nesta quarta-feira (10), depois de dois adiamentos, será levado a júri popular o professor Luis Felipe Manvailer, 32 anos, acusado de matar a advogada Tatiane Spitzner, 29, com quem era casado. O crime, que aconteceu em 22 julho de 2018, chocou o país - imagens da câmera do elevador do prédio onde o casal morava revelaram Tatiane sendo brutalmente agredida pelo marido, momentos antes de cair da varanda, no 4º andar.

Manvailer será julgado por homicídio qualificado (feminicídio) e fraude processual. O crime aconteceu Guarapuava (PR), a 256 km de Curitiba.

Por causa da pandemia, a sessão será restrita a familiares e equipes jurídicas. Em uma das cadeiras da plateia estará Bruna Spitzner, 27, prima e uma das melhores amigas de Tatiane. Neste depoimento comovente à Universa, ela narra a luta da família por justiça, a revolta com a tragédia e o peso da saudade.

"Tati queria viajar o mundo, era cheia de planos"

"Os últimos dias têm sido muito pesados. Estamos exaustos de tudo que temos visto, das artimanhas que a defesa tem adotado para desqualificar a Tati. Dizem que ela tinha depressão, que teria se suicidado.

Falam que ela era depressiva, mas, na verdade, ela estava sofrendo pressão psicológica. O marido a colocava como frágil e burra. Isso ela nunca foi, sabemos da força que a Tati tinha. Foi ela quem me deu a mão para sair de um relacionamento abusivo.

Eu era vítima de agressões verbais e ofensas de um ex. Desabafava muito com a Tati, contava o que estava acontecendo... Estava muito abalada para tomar uma decisão.

Tati me chamava de 'Bruni', ela tinha apelido para todos na família. Dizia: 'Bruni, você tem o seu emprego, não precisa passar por esse tipo de abuso psicológico'. Foi ela também, como advogada, que fez meu divórcio. Mas a Tati não falava sobre os abusos que ela mesma sofria.

Ela era muito forte, não se via no lugar da vítima. Acho que, para a mulher que está dentro de um ciclo de violência, fica mais difícil aceitar que está passando por isso.

Minha prima fazia questão de reunir a família quando podia, de juntar todo mundo. Gostava de combinar os encontros no Alagado, uma região aqui da cidade onde tem um rio. Ela estava organizando uma viagem em família para alguma praia. Da primeira vez, fomos para Punta Cana, na República Dominicana, em 2012.

Ela queria viajar o mundo, tinha muitos planos. Também queria comprar uma casa, ver seu escritório de advocacia crescer. Era apaixonada pela carreira. Eu dizia que o estilo dela era o de 'advogada chique'.

Eu dizia que o estilo dela era o de 'advogada chique'. Tati era muito vaidosa, gostava de se arrumar, ir ao salão, usar batom vermelho. A gente emprestava vestidos uma para a outra, se maquiava juntas para sair. Nos víamos pelo menos uma vez por semana para jantar.

Outro sonho da Tati era ter um lugar para cuidar dos cachorros abandonados que encontrava na rua. Amava animais, prestava até serviço como voluntária no canil de Guarapuava, resgatando cães.

Quando ela morreu, nós, primas, nos apoiamos. Nós cinco tínhamos um grupo no Whatsapp chamado 'Primuxas'. A gente era praticamente irmã. Falávamos da vida, pedíamos conselhos, ríamos juntas. Tati sempre nos chamava para fazer caminhadas com ela.

A gente tenta preencher o vazio com as boas lembranças, mas é muito difícil. Continuamos nos encontrando, agora em quatro primas, mas o lugar dela está sempre ali. É uma dor que nunca sara."