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Novos caminhos do prazer: por que elas desistiram de ver pornô tradicional?

"A pornografia é algo viciante que advoga contra as mulheres", diz Mariana Stock terapeuta orgástica e fundadora do espaço Prazerela - arquivo pessoal
"A pornografia é algo viciante que advoga contra as mulheres", diz Mariana Stock terapeuta orgástica e fundadora do espaço Prazerela Imagem: arquivo pessoal

Tina Borba

Colaboração para Universa

26/03/2021 04h00

Cada vez mais mulheres estão tendo uma postura crítica em relação aos filmes pornôs tradicionais: afinal, são muitas cenas em que a mulher é objetificada, levando a uma perpetuação da cultura do estupro e a uma representação equivocada do sexo.

Ok, esses filmes não nos representam. Mas e aí, quais são as alternativas de estímulo para o tesão quando você não quer consumir mais a chamada "pornografia tradicional"?

Universa conversou com leitoras sobre o tema. Os relatos de quem não usa mais o pornô tradicional como estímulo para a masturbação, por exemplo, indicam um maior uso de fotos e ilustrações sensuais, da imaginação, da leitura de contos eróticos e de estímulos sonoros.

Já quem disse que ainda apela para vídeos de sexo explícito, relata preocupação e cuidado na escolha dos vídeos. "Não assisto sempre, mas, quando vejo, escolho um vídeo que eu me sinta mais confortável. Reconheço que a maioria coloca a mulher num lugar que eu não me sinto confortável nem de assistir", diz Josi Skieresinski, jornalista e empreendedora.

Também é como se sente Diessica Flores, designer de interiores, que se diz incomodada em consumir de uma indústria que incita a cultura do estupro. "Tem toda uma indústria que estimula isso, e saber que muitas daquelas mulheres foram fazer aquilo por não terem uma alternativa... eu não queria ser uma das pessoas que incentivam isso. Até procuro outros tipos de pornô, de estúdios que se preocupam com isso. Não dá pra dizer que é um cenário perfeito, mas quando eu consumo tento procurar algo que não seja dessa cultura grotesca", fala Diessica.

O que fazer se você não quer consumir pornografia?

Mariana Stock, fundadora do espaço Prazerela e terapeuta orgástica, classifica a pornografia como um recurso facilmente comercializável e questiona a maneira como a mulher é normalmente representada. Ela acredita que o prazer está no corpo inteiro e vai muito além de estímulos visuais. "90% da pornografia mainstream é um entretenimento às custas de estupro. O corpo feminino se tornou esse simulacro de estupros, e todo mundo usa isso pra se excitar", explica.

Mariana é dona de um espaço que se dedica à ampliação do repertório de prazer das mulheres por meio de cursos, reflexões e práticas. Desde a criação desse espaço, ela já ajudou mais de 5000 pessoas. Mulheres que têm geralmente entre 20 e 60 anos e que buscam autoconhecimento e um maior desenvolvimento da própria potência sexual.

Segundo a terapeuta, pela sexualidade ainda ser um tabu, nós optamos por um estímulo que nos "sequestra do nosso corpo", nos leva a imaginar estar em outro lugar onde não estamos, e passamos a sentir somente com a mente.

"Somos tão reprimidas que é um jeito de sair do corpo, de não sentir o próprio corpo. Quando a gente vai ampliando a consciência corporal, percebe que o orgasmo não precisa vir só do genital", esclarece Mariana.

"Eu acho que pra quem busca o autoconhecimento e a potência sexual, a pornografia é sem sentido. Além de estimular o machismo e ser viciante, o orgasmo do pornô é uma descarguinha, um espirro. Mas pra quem usa isso da mesma forma que come um sanduiche, tudo bem, quem sou eu pra moralizar e dizer que isso é ruim".

Luana Lumertz, proprietária da Egalité Sex Shop e criadora de conteúdo concorda que é preciso olhar para o próprio corpo e descobrir outras formas de estimulá-lo.

?Tudo usado com cautela e das fontes mais adequadas pode trazer resultados positivos?, afirma Luana Lumertz - Arquivo Pessoal - Arquivo Pessoal
"Tudo usado com cautela e das fontes mais adequadas pode trazer resultados positivos", afirma Luana Lumertz
Imagem: Arquivo Pessoal

"A gente está dentro de um sistema capitalista opressor. Não acho que a resposta é necessariamente parar de consumir pornografia. O fundamental é pensar como se consome e o que se consome. Eu sempre recomendo que elas testem várias coisas. Tem o estímulo auditivo por exemplo. Ouvir e ler contos eróticos, como o Tela Preta, também é muito excitante. A arte erótica te desperta tesão e desejo".

Estímulos sonoros também são uma boa opção

A plataforma Tela Preta, citada pela Luana, oferece áudios de contos eróticos narrados por onze vozes diferentes, nas mais variadas categorias.

Ela foi lançada em meio à pandemia, em abril passado, e cerca de três mil pessoas já tiveram contato com os mais de 160 áudios disponíveis.

Universa conversou com Fábio Chap e Laís Conter, dois dos quatro sócios da iniciativa que são bem diretos quanto ao objetivo do negócio. "A gente não tem vergonha. O objetivo dos nossos áudios é molhar a calcinha e deixar de pau duro", afirma Laís.

Laís Conter, é uma das criadoras da plataforma Tela Preta que oferece áudios de contos eróticos - Arquivo Pessoal - Arquivo Pessoal
Laís Conter é uma das criadoras da plataforma Tela Preta que oferece áudios de contos eróticos
Imagem: Arquivo Pessoal

Na plataforma, há a preocupação de não descrever os corpos para que ninguém se sinta excluído/excluída e para estimular a imaginação. Aliás, esse é um dos diferenciais. "É bacana pra pessoa imaginar e se colocar naquela cena. Esse e o principal diferencial, sair da pornografia comum que entrega tudo mastigadinho. Com o áudio, tu precisa trabalhar a imaginação, tu acabas trabalhando outros sentidos", explica.

Ela relata que sempre preferiu a imaginação e a memória como companheiras dos momentos de prazer. Então o uso da pornografia nunca foi uma questão. Já o Fábio relata estar em um momento de transição pessoal. "A gente sente que é uma mudança gradual. No meu caso, eu tenho 34 anos dos quais 23 consumindo pornografia tradicional. É muito tempo da minha vida consumindo pornô visual. Isso atrapalha muito o homem, que se acostuma a bater uma e gozar em dois minutos. É uma transição, e a gente fica feliz de passar por ela.".

Ele comenta ainda que o retorno vem sendo muito positivo. Dentre os muitos relatos recebidos, um foi especial. "A gente se emocionou com uma usuária que contou que passou por um processo depressivo, ficou por muito tempo sem tesão e, quando começou a ouvir a Tela Preta, foi recuperando gradualmente a libido que fazia anos que ela não tinha. Tem sido uma revolução, algo que a gente não esperava", afirma.

É desafiador buscar opções para o pornô, mas vale a pena

Fran Bortolotto foi uma das pessoas que disseram não usar mais a pornografia na masturbação. "É desafiador sair do pornô, mas se você está em busca de prazer, mais energia e um sexo mais proveitoso para você e outras pessoas, vale a pena", comenta Fran.

?A gente acaba ficando muito visual, e o visual é só um dos vários estímulos do corpo?, diz Fran Bortolotto - Arquivo Pessoal - Arquivo Pessoal
"A gente acaba ficando muito visual, e o visual é só um dos vários estímulos do corpo", diz Fran Bortolotto
Imagem: Arquivo Pessoal

Feminista, Fran começou a se questionar sobre o uso da pornografia há uns 10 anos, quando começou a estudar mais sobre o movimento, energia e tantra. "A pornografia estimula o machismo. Eu até já usei, mas eu nunca consegui me excitar completamente porque chegava um certo momento que eu percebia que aquilo não estava bom pra ela (a mulher no vídeo). Era muito esgaçamento, não tinha enredo, era só 'meteção'", pontua.

Atualmente, Fran ministra aulas virtuais de yoga no seu perfil no Instagram e faz atendimentos em ginecologia natural. Ela compartilhou um ritual que pode ser útil para quem vem tentando fugir do pornô sem sucesso. Porém, lembre-se que cada corpo é diferente do outro. Tudo bem se não funcionar para você, mas vale tentar:

- Tire um tempo para cuidar de si;

- Tome um banho demorado, descubra cada cantinho do seu corpo e use o chuveirinho (se tiver);

- Prepare um drink que você goste, acenda uma vela, coloque uma música gostosa e vá para a cama;

- Com o auxílio de um vibrador, ou com as mãos mesmo, vá tocando suas orelhas, seios, barriga, coxas, outras partes do corpo que não as genitais, aproveite o toque e relaxe;

- Em um dado momento você escorrega para o clitóris e seja feliz.