Resistência e identidade: por que elas preferem ser chamadas de travestis
"Quando uma travesti é assassinada, agredida ou sai no noticiário policial acusada de roubo, por exemplo, é sempre travesti. Quando está fora de um contexto violento, seja atuando numa novela ou em cima de um palco — ou, ainda mais raro, em um cargo alto numa empresa — é chamada de mulher trans."
Quem diz isso é Lázara dos Anjos, professora de vogue ou voguing, um estilo de dança baseado nas poses de modelos, de Belo Horizonte (MG). Ela se apresenta como travesti e diz que prefere usar este termo por motivos políticos, para afirmar sua identidade.
Lázara não está sozinha: assim como ela, quem também faz questão de usar o termo travesti é a vereadora Érika Hilton (PSOL-SP), a mais votada do Brasil nas últimas eleições e primeira mulher trans eleita para a Câmara de São Paulo.
A Universa, ela explica a escolha pelo termo:
Ao me apresentar como travesti, especialmente no Parlamento, quero demarcar a luta histórica que as travestis travaram durante muito tempo. A palavra traz consigo resistência, luta e ação, é um marcador social da nossa trajetória".
"A diferença está em como os outros nos enxergam"
As duas concordam que não há diferença entre uma mulher trans e uma travesti, a não ser o termo que cada uma prefere usar para se apresentar. Ainda há quem use "travesti" para diferenciar uma mulher trans que não passou por uma cirurgia de readequação sexual, mas, segundo elas, essa é uma forma preconceituosa de usar o termo e a distinção não se aplica.
"É uma questão de identificação. Algumas vão usar travesti, outras mulheres, trans. A diferença está em como as pessoas cisgênero nos enxergam", diz Lázara. Ela conta que, em determinados ambientes, quando se apresenta como travesti, o comportamento das pessoas muda.
Quando eu estou em algum lugar com pessoas cis, seja uma festa ou em evento de trabalho, alguém se refere a mim como mulher trans e eu digo que sim, que sou travesti, rola um choque. O olhar muda porque essas pessoas não esperam uma travesti que fala bem, é educada, não é violenta."
Lázara explica que, para ela, se dizer travesti "é uma forma de mostrar que podemos ser exatamente o contrário do que as pessoas esperam", ou seja, mostrar que, como travesti, não está restrita a uma realidade de violência.
Além disso, diz a mineira, se apresentar desta forma gera identificação em meninas de 14 ou 15 anos que não têm referência de travestis em outros lugares que não a prostituição. "Quero mostrar para meninas parecidas comigo, que ainda estão perdidas, sem referências, que está tudo bem ser travesti e que a realidade mostrada na TV não é a única opção que elas têm", fala.
Transvestigênere: "Uma nomenclatura de nós para nós"
O termo "transvestigênere", que une em uma única palavra as identificações trans, travesti e transgênero, foi cunhado recentemente por Érika Hilton e pela ativista Indianara Siqueira.
Hilton diz que criar essa expressão foi necessário porque as palavras "travesti" e "transexual" são carregadas de estereótipos: "São termos colonizadores, nomes escolhidos por pessoas cis para descrever nossos corpos e torná-los abjetos".
Além disso, é uma forma mais abrangente de se referir a identidades que não correspondem a pessoas cis: "Quando cunhamos transvestigênere, além de ser uma nomenclatura de nós, trans, para nós mesmas, estamos incluindo todas as pessoas que não são cis — travestis, mulheres trans, homens trans, não bináries, genderfluid etc".
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