Quem é Celina Leão: deputada defende compra de vacina da covid por empresas
Nova coordenadora da Secretaria da Mulher da Câmara, a deputada federal Celina Leão (PP-DF), de Goiânia (GO), conta que decidiu entrar para a política após observar a mãe, Maria Célia Leão, atuando pelos direitos da mulher, abrigar vítimas de violência doméstica em sua casa e participar da criação da Casa das Mulheres em Goiás. "Quando você se envolve em causas, se torna uma política para ampliar o seu campo de batalha", diz ela a Universa.
Celina foi a relatora do texto-base do projeto de lei que permite à iniciativa privada comprar vacinas contra a covid-19 para a imunização gratuita de seus empregados, desde que a mesma quantidade usada seja doada ao SUS (Sistema Único de Saúde). Para alguns de seus colegas, como Marcelo Freixo (PSOL-RJ), a proposta, que agora será analisada pelo Senado, é um "verdadeiro fura-fila".
"Acredito que esse PL vai agilizar a vacinação e abrir outras possibilidades de vacinação, colocando o SUS como maior beneficiário. A gente não vai privilegiar o fura-fila", afirma.
O que preocupa a parlamentar, na verdade, é a instalação da CPI da Covid, nesta terça-feira (27), que irá apurar ações e omissões do governo federal na pandemia, além de repasses de verbas federais a estados e municípios. Mais até do que as críticas que recebeu por ter nomeado como sua secretária parlamentar a segunda mulher do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), Ana Cristina Valle. A ex-mulher de Bolsonaro e outros 17 familiares do presidente são alvos do Ministério Público do Rio de Janeiro nas investigações sobre "rachadinha" nos gabinetes de Flávio e Carlos Bolsonaro, filhos do mandatário.
Em entrevista a Universa, Celina defende a nomeação de Ana Cristina: "Ela é uma mulher como qualquer outra, está lá trabalhando, é uma advogada competente, e ser investigada não significa ser culpada por algo".
UNIVERSA: Como a senhora enxerga a instalação da CPI da Covid?
Celina Leão: Uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) não tem critérios jurídicos. A oposição vai querer holofote para desestabilizar o governo, mas minha preocupação é com esse momento do Brasil, em ter mais equilíbrio e responsabilidade; e talvez essa CPI possa trazer instabilidade para o governo, que está muito mais preocupado em se defender do que fazer com que a situação da saúde avance. Me preocupa que a maior prejudicada com essa CPI seja a população.
O TCU (Tribunal de Contas da União) considerou que houve ineficácia e abuso de poder na atuação do Ministério da Saúde no combate à covid-19. Como vê a atuação do governo Bolsonaro na pandemia?
Acho que o governo se comunicou muito mal em todos os momentos da pandemia, porque havia uma necessidade de dar uma orientação clara à população, mas a pandemia foi polarizada, virou alvo de politicagem, e ela não tem que ser vista como ideologia, tem que ser vista sob fatos científicos. Fechar uma cidade não significa que você faz oposição a A ou B. Você faz lockdown porque tem necessidade. Mas politicaram muito. Esse foi o erro do governo, e acho que isso é sentido na avaliação do próprio governo. O próprio presidente tem colocado que a vacinação é importante. Acho que três ministros da Saúde trocados foi um momento de muita instabilidade quando se precisou de mais estabilidade.
A senhora foi relatora do projeto que permite a compra da vacina contra a covid pelo setor privado, mas temos visto denúncias de pessoas furando fila para se imunizar. Esse projeto não deixaria os menos favorecidos sem vacina?
Acredito que o projeto foi bem objetivo, primeiro porque é para vacinar trabalhador. E ao vacinar trabalhador a empresa tem que doar a mesma quantidade de vacina para o SUS. Além disso, ela não pode comprar de laboratórios que venderam para o SUS. Isso significa que a empresa vai ter que comprar outras vacinas aprovadas fora do Brasil e seguir o plano nacional de vacinação. Acredito que isso vai agilizar a vacinação e abrir outras possibilidades de imunização, colocando SUS como maior beneficiário. A gente não vai privilegiar o fura-fila.
A senhora foi criticada por contratar Ana Cristina Valle, ex-mulher do presidente Jair Bolsonaro, como sua assessora parlamentar. E ela está sendo investigada pelo Ministério Público do Rio pelo caso das "rachadinhas". Como se deu a contratação dela?
Ela é uma mulher como qualquer outra, está lá trabalhando, é uma advogada competente, e ser investigada não significa ser culpada por algo.
A senhora é relatora de um projeto de lei na Câmara que visa o aumento da pena mínima do crime de feminicídio. Acredita que isso diminuirá a violência de gênero no Brasil?
O que estamos vivendo no Brasil, com um número de feminicídio que não baixa, há uma necessidade de ter rigor maior na lei. Só que isso somente não garante a diminuição de feminicídio no Brasil. Precisamos ter política pública coordenada e organizada entre os estados e municípios. Para se ter noção, não temos hoje no Brasil uma política padronizada de atendimento a mulheres. Queremos criar mais um crime, o de feminicídio, para que a gente diminua a subnotificação — hoje, o femincídio é um qualificador dentro do homicídio. E queremos aumentar a pena mínima de 12 para 14 anos de prisão e acabar com a possibilidade do condenado ir para o regime semiaberto [atualmente, o condenado por esse delito tem a possibilidade de apelar em liberdade se a pena for inferior a 15 anos de reclusão].
Quais são seus objetivos assumindo a coordenadoria da Secretaria da Mulher da Câmara? E o que significa estar nesse posto?
Esse é um espaço muito democrático e plural, mas alguns temas são muito caros a toda bancada [de deputadas], como a saúde da mulher, a violência de gênero e emprego e renda. A gente quer compartilhar mais o mandato e criar coordenações dentro da bancada. Por exemplo: temos 80 projetos a serem analisados dentro do tema mulher. Antes de levá-los para o plenário, quero que passem por um grupo de discussão, separados por temas, e assim destacar todas as mulheres. Há algumas semanas montei um grupo com 40 mulheres para debater alienação parental. É uma bancada muito unida, e quando se trata do direito e defesas das mulheres, a gente que ampliar um pouco mais.
A senhora já foi vítima de ataques machistas, sofreu violência política de gênero?
Como toda política, sim. Sofri muito mais no começo do mandato, quando me tratavam como menina. Mas após quatro meses eu já era um leão e me firmei como mulher decidida. Passei por dois mandatos de oposição, tive brigas homéricas, de partir para cima, e os colegas amenizarem a situação. Sobrevivi praticamente sozinha. Se você deixa acontecer, isso se torna rotineiro. Nossas diferenças com os homens são apenas físicas. As mulheres precisam se impor.
E a violência política não parte só dos homens. Muitas vezes sofremos violência de outras mulheres que acham que podem nos 'coisificar', nos apelidam, usam pejorativos que jamais usariam com os homens. Precisamos avançar na sororidade. As mulheres crescem com essa carga muito machista. Elas precisam ter um olhar mais generoso para outras mulheres. Isso é tão real que temos só 15% de mulheres no parlamento — e somos 51% da população. Ou seja: mulher não vota em mulher
Como aumentar o número de mulheres na política?
Alguns avanços, mesmo que tímidos, têm acontecido como a garantia de 30% dos recursos dos partidos para candidaturas de mulheres. Isso deu um efeito na ponta que foi o dobro de mulheres no parlamento federal. Hoje temos uma bancada de 79 mulheres e isso não foi de um dia para a noite. Entendo que o partido precisa capacitar as mulheres não só no momento da eleição, para montar a cota, mas qualificar e preparar mulheres para uma campanha, para que elas sejam vitoriosas. E uma mulher no parlamento tinha que ter um fundo eleitoral maior, dobrado. Elas deveriam ter um tipo de estímulo. Esse tipo de ambiente tem que ser apoiado.
Por que a senhora entrou para a política?
Porque eu sempre gostei da política. Minha mãe militava pelas causas das mulheres em Goiás, participou da briga para ter 5% das mulheres em diretórios de partidos na época de Ulysses Guimarães. Nossa casa era acolhimento para mulheres vítimas de violência. Ela participou da criação da Casa das Mulheres em Goiás. Eu sempre participei e gostei disso tudo. E quando você se envolve em causas, se torna uma política para ampliar o seu campo de batalha.
Algumas mulheres não gostam de se associar ao termo feminista porque seria associado à esquerda. Como a senhora se define?
Sou filha de uma feminista. O problema é que as pessoas ficam perdidas em questões ideológicas. A mulher feminista é a que entende os seus direitos. Isso ficou muito marcado, porque em determinado momento as mulheres tachadas como feministas precisavam gritar mesmo, avançar o sinal vermelho para que eu tivesse acesso à política que tenho hoje.
Desdenhar o trabalho de milhares de feministas que deram sua vida para que estivéssemos aqui é renegar o passado. Não significa que todas as mulheres precisem ter o mesmo ponto de vista
Fomos votar há poucos anos, em 1934. Todas as nossas conquistas são recentes. No começo desse mandato, o presidente de um grande partido falou que o lugar da mulher não é na política. Como pode?
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