"Mulheres Pós 2020" debate como a pandemia afeta a educação no Brasil
A longa duração pandemia no Brasil pode ter como resultado o desperdício de tempo precioso para crianças e jovens brasileiros. A começar pela falta de acesso consistente à educação, que, se não for revertida, deve impactar sobretudo o futuro das meninas. Para essa geração, o horizonte também corre o risco de ser comprometido se a sustentabilidade não se consolidar como prioridade após a crise global. O segundo dia de "Mulheres Pós 2020", evento virtual que Universa transmitiu nesta quarta-feira (28), discutiu caminhos para lidar com caos na educação e como empresas podem colaborar para a sobrevivência do planeta.
A combinação entre empobrecimento da população e a falta de conectividade que impede a frequência de crianças e adolescentes às aulas na pandemia tem como resultado esperado o aumento da evasão escolar, ainda que as aulas presenciais retornem.
"Uma menina fora da escola está vulnerável a estupro, à gravidez precoce, ao casamento forçado, à exploração sexual. A médio prazo, uma menina que não estuda significa a perpetuação da submissão feminina", afirmou a jornalista Ana Paula Padrão, apresentadora do evento. Para Stefania Giannini, diretora-geral da Unesco para Educação, entrevistada por Joice Berth, a situação é preocupante em nível mundial.
Abandono da educação prejudica mais as mulheres
As convidadas de painel sobre o tema concordaram que, também na educação, os efeitos da pandemia são piores para as mulheres, que ocupam a maior parte dos postos de professor. Além disso, se aprofundam as desigualdades regionais na educação no Brasil. "Estamos no caminho de perder uma geração, mas não significa que isso não pode ser detido. Há estados e municípios se saindo melhor, mas não por conta de soluções tecnológicas, mas por terem criado espaços de colaboração", avaliou Priscila Cruz, presidente da organização Todos pela Educação.
Embora o acesso à internet seja fundamental nesse contexto, os problemas não se restringem à carência dele. "A sociedade brasileira não se responsabiliza pela educação, que acaba sendo dever apenas da escola. Isso recai no professor, que está definhando e muito abalado. Precisamos mudar a percepção de que esse profissional é apenas um técnico que reproduz conhecimento", afirmou a socióloga Lourdes Atié. Para ela, a pandemia mostrou que o melhor caminho é simplificar os modelos educativos, evitando modismos.
Os desafios da educação atingiram também o ensino superior. Nas universidades públicas, que contam com políticas afirmativas para ingresso e, portanto, alunos em diferentes níveis de vulnerabilidade social, o desafio foi não perder as conquistas em inclusão. A engenheira química Luanda Moraes é reitora da Universidade Estadual da Zona Oeste do Rio de Janeiro. "Ficamos sem aulas por alguns meses e, nesse meio tempo, buscamos oportunizar bolsa emergencial para quem mais precisava. Internet e tablets foram distribuídos só neste ano. A dificuldade é não saber se atingimos a todos e garantimos situação igualitária", disse.
Como empresas podem influenciar mudanças sociais
Nos últimos anos, o mundo corporativo foi inundado pela urgência de prioridades resumidas pela sigla ESG (sustentabilidade ambiental, social e de governança, em inglês). No momento em que a população perde renda e a pobreza aumenta, o pilar social se torna o foco para as empresas que miram nesses valores.
A preocupação precisa se estender para diferentes indústrias e setores. "Enquanto companhia listada em bolsa, tudo o que fazemos é público. Isso move outras empresas. Como somos uma indústria de alimentos, dizemos que vamos do campo à mesa, portanto nossas escolhas influenciam toda a cadeia. É uma responsabilidade", afirmou Grazielle Parenti, vice-presidente global de relações institucionais da BRF, em painel sobre o tema.
Para muitas empresas, o momento foi de realizar ações de retorno à comunidade. "As mulheres de menor renda foram muito impactadas. Por isso, uma das nossas prioridades de doação foi direcionada a micro e pequenas empresas criadas por elas nas periferias. Nossos funcionários fizeram mentorias de negócios com elas", assinalou Mariana Oiticica, cohead de ESG do BTG Pactual, sobre a iniciativa em parceria com o fundo Dona de Mim, criado pelo Grupo Mulheres do Brasil.
O movimento de focar em mulheres se estende a políticas internas de médio e longo prazo das grandes empresas. Na maior parte delas, ainda não há igualdade de gênero em cargos de liderança. A meta da BRF é que elas ocupem ao menos 30% dessas posições até 2025; atualmente, são 22%. "Para contratações, na lista final é necessário ter mulheres e atrair é um dever dos líderes", comentou Grazielle.
Enquanto no mercado financeiro, a barreira é atrair as jovens para crescer nas empresas. "Abrimos frentes para ter mais candidatas nos processos seletivos, buscando nas universidades e dirigindo treinamentos a elas", contou Mariana, do BTG. Ainda que em setores ocupados predominantemente por homens, a barreira não é vista como intransponível. "Entendemos que, mesmo com força de trabalho industrial, é possível mudarmos o perfil de gênero da empresa para ter divisão em 50%", avaliou Andrea Quintana, gerente de marketing e inovação da Irani.
A sustentabilidade não pode ser abandonada
Ao menos nas relações de consumo, a coletividade foi fortalecida na pandemia. É o que interpreta Cintia Gonçalves, fundadora da Wiz&Watcher. "Até por como se dá a transmissão do vírus, ficou claro o quanto nossas atitudes interferem nos outros. Esse olhar para o coletivo se reflete na escolha das marcas, em que se quer entender como ela impacta a sociedade e o planeta", disse no terceiro painel.
Esse movimento de mudar hábitos tomando decisões mais sustentáveis se aprofunda há alguns anos, mas, com diante de outras necessidades, poderia ser deixado de lado. "A sustentabilidade fica distante quando se está querendo sobreviver. Mas, enquanto empresa, se paralisássemos nossas metas nesse sentido, a situação estaria muito pior após a pandemia. Temos papel de influenciar para que consumidores atuem junto", defendeu Erica Migales, diretora de marketing e trade marketing da Danone. Em 2020, a empresa mudou embalagens e atingiu metas de economia circular para mitigar o impacto do uso de plástico.
Além dos efeitos ambientais, pensar em consumo sustentável passa também por observar as cadeias produtivas e o tipo de resultado que elas geram para as comunidades. Na pandemia, a Riachuelo decidiu reforçar as relações com fornecedores do sertão do Rio Grande do Norte, integrantes do projeto Pró-Sertão, segundo contou a diretora de marketing da empresa, Marcella Kanner.
"Sinto que a moda pode ser muito inclusiva. Já somos compradores dessas oficinas de costura, mas entendemos que na pandemia precisávamos aumentar esse foco. Fazemos os cortes de tecido na capital e a costura é feita no interior", disse Marcella. Assim, grandes empresas seriam capazes de tomar decisões não apenas para reduzir efeitos negativos da produção, mas gerar ganhos.
A programação de Mulheres Pós2020 terá continuidade na noite desta quinta-feira, a partir de 19h, com destaque para os temas de carreira, empreendedorismo e sustentabilidade. Com transmissão ao vivo no Youtube e nas redes sociais de Universa.
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.