Elas criaram marca de beleza sustentável que cresceu 370% na pandemia
Quem ouve a dupla de empresárias Luciana Navarro e Patrícia Camargo falando em sintonia entende como flui a energia dos negócios. Unidas pelo acaso e por motivações distintas, mas ainda assim complementares, lançaram em 2018 uma marca de cosméticos sustentáveis. A Care Natural Beauty conta com itens de maquiagem e skincare formulados com ativos orgânicos e naturais, extraídos e manipulados de forma responsável. Eles se encaixam na categoria de clean beauty, ou beleza limpa, que não faz uso de ingredientes suspeitos nas formulações.
A procura por sustentabilidade nas marcas de cosméticos cresce, inclusive no Brasil. Além de surfar esta onda, a marca ainda conta com boa comunicação e foco no ambiente digital, elementos que, somados a duas rodadas de investimentos, garantiram bons frutos mesmo em um ano tão difícil como 2020. "O crescimento foi de 370%, se comparado a 2019. Em 2021, queremos triplicar os números", afirma Patrícia.
Quando as vidas se cruzam
A paulistana Luciana Navarro trabalhava várias horas por dia em uma empresa de live marketing, ritmo que precisou diminuir com a chegada da filha Valentina. Como muitas mães, ela se viu diante de um impasse. "A vida que eu levava entrou brigava com a maternidade que eu gostaria de vivenciar. Por um período, você não consegue se sentir completa. No trabalho, você se sente em débito com o filho. Com o filho, você se sente em débito com o trabalho", conta.
Parou por cerca de um ano, enquanto os funcionários tocavam a rotina do negócio, e engravidou novamente quando estava prestes a retornar. Na segunda vez, entretanto, teve uma gestação molar. Nesta condição, depois que o óvulo é fecundado, ocorre um erro na reprodução celular e é formado um tumor em vez de um feto.
"Felizmente, no meu caso, era um tumor benigno. Entretanto, isso não me livrou de encarar uma quimioterapia", relembra. No processo de tratamento, se viu diante de várias proibições em termos de cosméticos, uma vez que o corpo estava mais reativo e sujeito às irritações. "Não queria abrir mão do autocuidado, porque maquiar todos os dias me fazia sentir pintada para a guerra. Olhava no espelho, arrumada, e pensava: 'estou pronta para isso'. Vamos em frente", relata.
Durante esses três meses, parou completamente e reavaliou tudo. No período, também entendeu o ciclo naquela empresa já havia terminado. "Então decidi tirar um tempo sabático para descansar da vida louca que levei até então, mas meus planos foram atropelados pela minha sócia", brinca.
Eram as ideias da advogada Patrícia Camargo, compartilhadas em um almoço de final de ano. As duas já se conheciam por intermédio dos maridos e, papo vai, papo vem, a ideia do empreendimento entrou para a mesa.
Trabalhando no departamento jurídico de uma multinacional de cosméticos, Patrícia andava incomodada com o mergulho profundo que havia dado na indústria da beleza. Começou a ler pesquisas sobre sustentabilidade, ao passo que se informava sobre alergias e outras reações causadas por toxinas presentes nos itens da penteadeira. A inquietação se transformou em desejo de empreender na área de clean beauty que, em meados de 2017, ainda engatinhava no Brasil.
Quando Luciana tomou conhecimento do projeto, topou na hora. Lembrou das questões que teve no tratamento e as peças se juntaram. "Pensando no sabático, quis ligar no dia seguinte e desfazer o acordo. Entretanto, acordei no meio da noite e comecei a escrever o manifesto da marca. Nome, valores, ideais. Brinco que foi um 'download'. Hoje, esse papel está emoldurado em nosso escritório", relata.
A partir do acordo da dupla, foi dada a largada para uma escalada de desafios até entregarem ao mercado os produtos que sonhavam: livres de crueldade animal, com ingredientes certificados, vindos de cadeia produtiva com responsabilidade social, nada de ativos duvidosos e, finalmente, com altíssima performance.
Primeiros passos na beleza limpa
"Começamos a estudar muito. Viajamos para vários lugares do mundo para entender quem fazia beleza limpa e como fazia. Eram várias perguntas: quais ativos existem? Quem tem essa tecnologia? Quem pode fazer isso no Brasil? Então encontramos três fábricas com produção no Brasil, mas subsidiárias internacionais, que se encaixavam na nossa ideia. Montamos um time de dermatologistas, maquiadores e farmacêuticos para pensar na concepção, testar os produtos. A gente não queria ter um produto que não é usado porque não pigmenta", explica Patrícia.
A marca nasceu no final de 2018 com investimento inicial de 800 mil reais em capital próprio. "Quebramos barreira por barreia com humor. Focamos em bons produtos e ótima comunicação para chegar ao mercado. Todo o dinheiro foi para isso. Por muito tempo, nós fizemos tudo: Instagram, site... A gente vendia os itens por mensagem nas redes sociais e corria para os Correios todos os dias", lembra.
Em janeiro de 2019, receberam uma ligação da gigante Sephora para convidá-las a competir contra 12 mil empresas da América Latina em um programa mundial de aceleração. "Ganhamos e fomos aceleradas. Viajamos para o Vale do Silício duas vezes, fizemos apresentações para investidores, tivemos os nossos produtos testados por consumidores norte-americanos. Na época, o portfólio ainda estava com uma embalagem bem simples, porque não tínhamos dinheiro para ir além, e esse foi o único ponto crítico citado pelas pessoas", relata.
O caos e a esperança no futuro
Dois meses depois, em março, observaram um salto de patamar em razão da aceleração. Precisaram se reestruturar rapidamente, com funcionárias e novos planos. "Entendemos que estávamos no nécessaire das consumidoras com outras gigantes", diz Patrícia. Em outubro, já haviam superado a meta de lucro em 25%.
Quase um ano depois, pouco antes do início da pandemia, veio a primeira rodada de investimento-anjo. "A gente se reinventou muito rápido, porque já nascemos na internet e contando com o site como principal fonte de venda. Ficamos voltadas para o digital. Já tínhamos uma comunidade engajada, que mantemos como amigas. Nossa taxa de recompra varia entre 40 e 60%, o que é altíssimo", diz.
Seguindo a estratégia de comunicação próxima da consumidora e alinhada com os valores de sustentabilidade, conseguiram fechar um ano tão difícil muito além do azul. "A Care registrou crescimento de 370% em 2020, se comparado ao ano de 2019", afirma Patrícia.
Já em 2021, a ideia é triplicar o faturamento. Para isso, a segunda rodada de investimento recebida segue para uma nova categoria de produtos. Querem ser reconhecidas como uma marca limpa, brasileira e de alta performance, além de otimizar a experiência online dos consumidores — incluindo um site repaginado com funcionalidades específicas para a compra de produtos de beleza. Assim que aglomerar for possível, também planejam um espaço físico para expandir o contato com clientes da marca.
Para o futuro, pensam em alcançar o mercado internacional. Também esperam, cada vez mais, fomentar as cadeias produtivas no Brasil para que consigam obter mais ingredientes de manejo sustentável com responsabilidade social — iniciativas já apoiadas a partir da escolha de fornecedores, e que devem aumentar.
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